Eduardo Oliveira
Silva – i online, opinião, às 03:00 horas
É fundamental saber
o que pensa o Presidente da República
Depois de ter visto
a gigantesca manifestação inorgânica e transversal, depois de ter observado a
demonstração enquadrada pelo PCP/CGTP, depois de ter reunido e ouvido o
Conselho de Estado, depois de ter conversado em privado com o governo, depois de
ter recebido os parceiros sociais, depois de ter inclusivamente acolhido em
Belém os chefes militares, depois de ter pleno conhecimento da acrescida e
pesadíssima austeridade a que os portugueses ficaram sujeitos na sequência do
falhanço do processo de ajustamento, depois de ter verificado a dimensão do
assalto aos bolsos da cidadania que o governo decretou, é essencial que o
Presidente Cavaco Silva se dirija ao país neste 5 de Outubro em linguagem clara
e perceptível.
Passando por cima
do facto tristemente elucidativo de o Presidente não discursar da varanda da
Câmara de Lisboa por questões de segurança, Cavaco tem a estrita obrigação
ética de falar de forma clara e corajosa, até porque há não muito tempo ele
próprio sublinhou que a carga fiscal estava a atingir o limite. Então o que
dirá agora?
Sendo economista,
ainda por cima, é fundamental perceber que leitura retira o Presidente deste
assalto fiscal que asfixia empresas e famílias, impossibilitando-as
definitivamente de fazerem frente aos seus encargos e dívidas, porque é nisso
que vai resultar o arrastão tributário.
Como o governo
ignorou essa consequência, talvez tenha de ser o Presidente a explicar a
matéria, para evitar o que agora parece inevitável: vamos a caminho da Grécia
e, se ficarmos fora do euro, podemos acabar pior porque não temos o mesmo
potencial turístico.
Ao contrário de
Sampaio, cuja verdadeira intenção chegava a nunca se perceber, Cavaco tem um
discurso que só se torna claro e óbvio passado algum tempo. Não tem a
capacidade premonitória de Mário Soares nem assume as rupturas drásticas que
Eanes proclamava, é certo. Mas agora é tempo de o ouvir falar claro sobre se
concorda ou discorda da rota estabelecida e quais as eventuais alternativas que
aponta. Em rigor, o chefe de Estado não pode ignorar que há uma enorme mentira
colada a estas medidas porque elas não substituem a TSU. Elas são as que
estavam previstas para além da TSU, que os portugueses vetaram saindo à rua em
massa. A prova é que pela boca do próprio ministro das Finanças se ficou a
saber que a ideia subsiste.
Se é certo que há
uma parlamentarização do regime, porque só na Assembleia se pode exercer
verdadeiramente o direito à crítica e à oposição política, como foi o caso
ontem com as moções de censura do PCP e do BE, não é menos certo que há
momentos em que o chefe de Estado (mesmo considerando as condicionantes
externas que o limitam a ele e até ao governo) deve usar o seu peso, pessoal,
institucional e político, para intervir, dando cobertura ou rompendo. Hoje é um
desses momentos-chave em que não se admitem meios-termos. Ou apoia ou discorda.
Falar claro é obrigação. A bem da democracia que não propriamente da República,
porque hoje em dia as monarquias não têm menos consistência nesse aspecto
concreto e tem de se reconhecer que na maioria delas se vive bem melhor que nas
repúblicas, sobretudo as do Sul da Europa.
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Nota PG: Este artigo de opinião foi escrito e publicado antes dos vergonhosos incidentes na comemoração dos 102 anos da Implantação da República. E agora qual será a opinião do articulista e dos portugueses perante um PR que cobardemente foge às questões primordiais e urgentes que devem ser abordadas e resolvidas em prol dos mais elevados interesses nacionais?
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