João Lemos Esteves –
Expresso, opinião, em Blogues
1. "Oh minha
senhora, já me fez essa pergunta quatro vezes!". Foi a frase que marcou a
entrevista de Pedro Passos Coelho à TVI - foi curioso notar que o
Primeiro-Ministro começou a abordar Judite de Sousa como "senhora
doutora" e acabou por se exasperar com a jornalista no final da
entrevista. Significa isto que Judite de Sousa cumpriu com talento e
profissionalismo a sua missão: interrogar, com objetividade e clarividência, o
(formalmente) chefe de Governo. Ai, coitadinho do Passos! Já teve de fugir à pergunta
três vezes e a diabólica da Judite ainda insistiu mais uma vez...ai, que pena
que nós temos de Passos Coelho: é que fugir às perguntas dá mesmo muito
trabalho! Por amor de Deus: se nós portugueses protestássemos cada vez que
Passos Coelho nos dificulta - ou, em português claro, percetível para todos,
sem margens para dúvidas, nos "lixa" - a vida, então andaríamos
sempre irritados com o nosso Excelentíssimo senhor Primeiro-Ministro!
2. Dito isto,
passemos à análise da entrevista. Para além da "minha senhora, já fez essa
pergunta quatro vezes" , dita em tom irritado por Passos Coelho, do debate
não ficou absolutamente nada! Passos Coelho esteve basicamente a falar, a
falar, a falar - sem dizer quase nada de original ou de novo. Basicamente,
Passos Coelho esteve a exercitar a sua especialidade que é o discurso vazio,
inconsequente e negro para os portugueses - no fundo, a arte do "encher
chouriços", como diz o Senhor Manuel do café ali do fundo da rua, que
(tenho a certeza!) sabe mais e tem mais consciência da crise em que vivemos do
que Pedro Passos Coelho.
2.1. Não obstante,
da entrevista à TVI, podemos retirar as seguintes conclusões, em jeito mais de
confirmação do que propriamente de novidade:
Passos Coelho não
vai fazer nenhum esforço para dialogar com o Partido Socialista. Daí que a
palavra "refundação" tenha saído, muito subtilmente, muito
ligeiramente, do seu léxico político. Note-se que Passos Coelho pretendia
reduzir a despesa até Fevereiro - data-limite em que tem de apresentar medidas
à troika - convidando, em termos muito abstratos, o PS a colaborar com o
Governo. Na entrevista, Passos Coelho já afirmou algo diverso: as medidas que
serão apresentadas em Fevereiro serão meramente conjunturais, servirão para
resolver problemas do imediato. Esta mudança de discurso denota duas coisas: o
Governo não se quer comprometer com nada definitivo com os portugueses para já,
esperando que o clima social registe uma acalmia significativa; por outro lado,
Passos Coelho vai avançar sozinho sem o PS, sem dar, ao mesmo tempo, azo à
política de vitimização de António José Seguro.
Quanto ao Orçamento
de Estado para o próximo ano, Passos Coelho não se comprometeu com o êxito da
sua execução (aliás, se há expressão que pode caraterizar a entrevista de
quarta-feira é a de entrevista de descomprometimento). Confrontado com as
previsões das instâncias internacionais que desmentem as do Governo,
basicamente, Passos Coelho, muito incomodado, começou a preparar o discurso de
justificação do falhanço do Governo. Tratou-se, acima de tudo, de um tubo de
ensaio justificativo de novo insucesso orçamental, a preparar já terreno para
aquele que será o discurso recorrente do Governo em 2013;
Por outro lado,
Passos Coelho disse mais do que aquilo que queria dizer. O Primeiro-Ministro
foi para a entrevista com Judite de Sousa e José Alberto Carvalho preparado
para não sair dos limites estritos de um guião preparado pelos seus assessores
que era simplesmente isto: o Governo está a fazer tudo aquilo que pode. Nem
mais, nem menos - e tinha que preencher uma hora só com esta mensagem. Ora, não
se percebe por que razão alguém tão preocupado com a sua imagem, com a sua
comunicação, como é Passos Coelho, tenha proposto à TVI realizar esta
entrevista: é que uma mensagem tão curta como era a que Passos Coelho queria
transmitir aos portugueses não justificava uma entrevista. Porém, quando Passos
Coelho começou a ficar incomodado, começou a trair-se a si próprio: pense-se no
exemplo dos impostos. Foi uma verdadeira gaffe: Passos Coelho afirmou que o
atual nível da carga fiscal é insustentável, mas é para manter por uns bons
anos. Com isto, e sem ter consciência, Passos Coelho qualificou a sua política:
insustentável. Algo insustentável, tanto quanto sei, é algo que não se pode
sustentar: se não se pode sustentar, como poderá ter êxito? Mais: Passos Coelho
já não tem margem nenhuma para aumentar impostos - fechou completamente a porta
à subida de impostos. Esta é a única semi-novidade do discurso: Passos mantém
impostos - mas não os vai subir. Ele não queria dizer,mas disse.
Por último, temos a
questão da saúde da coligação PSD/CDS. A resposta de Passos Coelho foi
verdadeiramente reveladora (e assustadora!). Afirmou que a coligação resistirá
por obrigação e por convicção. Tudo isto é "politiquês" - traduzindo
para português corrente significa que sim, a coligação está por um fio. Dedicaremos
um texto autónomo sobre esta matéria, dada a sua relevância para o futuro
político português.
Nota Passos Coelho:
8 valores
Judite Sousa: 13
valores
José Alberto
Carvalho: 12 valores
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