Especialistas
divergem sobre a disposição do presidente de combater esse antigo mal russo. Uns
dizem que se trata apenas de luta interna de poder. Para outros, combate à
corrupção atende interesses pessoais de Putin.
Um dos temas mais
aguardados no discurso anual do presidente Vladimir Putin à nação, nesta
quarta-feira (12/12), é o combate à corrupção. O presidente russo chegou a
declarar guerra a esse antigo mal, assegurando que não se trata de uma
campanha, mas de uma luta para erradicar a corrupção.
O primeiro-ministro
Dmitri Medvedev disse que esse seria "o início de um trabalho árduo"
e assegurou que a recente abertura de várias investigações sobre casos de
corrupção não é por acaso.
Ações anticorrupção
contra oficiais do alto escalão do governo ocupam há semanas as manchetes da
imprensa russa. O caso mais conhecido é o do ex-ministro da Defesa Anatoly
Serdyukov, que deixou o cargo em novembro último acusado de utilizar uma
empresa do ministério para lavagem de dinheiro, num valor que chegaria a 3 bilhões
de rublos (cerca de 200 milhões de reais).
Também no
Ministério da Agricultura e na agência espacial russa Roskosmos existem
suspeitas de que bilhões de rublos tenham sidos desviados.
O grande mal do
país
Esse problema não
chega a ser uma novidade na Rússia. O suborno é prática usual para evitar
diversas punições previstas na lei, como por exemplo, multas de trânsito.
Ano após ano, a
Transparência Internacional (TI) denuncia a falta de controle sobre a corrupção
em órgãos do governo, escolas e hospitais. No ranking da TI, o país está entre
os mais corruptos do mundo, ocupando a 133ª colocação.
Para uma parte
significativa da população, a corrupção é o pior dos males que afligem o país. Numa
pesquisa encomendada pela DW em outubro de 2011, 62% dos entrevistados
apontaram as práticas corruptas como o maior dos problemas nacionais.
Agora parece que
finalmente as coisas começam a mudar. Quase todos os dias aparecem notícias
sobre novos casos de corrupção. Segundo o jornal Iswestija, em 2013 haverá o
lançamento de um banco de dados nacional com o registro de todos os casos em
que haja suspeitas de práticas corruptas. Um novo partido foi fundado no início
de dezembro com o nome O Povo Contra a Corrupção (em tradução literal).
Dúvidas sobre os
planos de Putin
Mas ainda existem
dúvidas sobre um possível sucesso do presidente nessa empreitada. "Como é
possível eliminar a corrupção na Rússia se não existem tribunais independentes
e a lei não prevalece?", questionou Lilia Shevzova, especialista do Centro
Carnegie de Moscou, em entrevista a DW em 2011.
Na ocasião, Putin
havia apresentado a plataforma eleitoral para o seu terceiro mandato como
presidente, prometendo reduzir significativamente os níveis de corrupção até
2018.
Agora o presidente
parece finalmente se engajar numa luta que ele havia tentado evitar nos últimos
12 anos, o que talvez seja o motivo da descrença de boa parte da população. Uma
pesquisa do Centro Levada, de Moscou, confirmou recentemente que, de cada dois
cidadãos, um não acredita que Putin alcance esse objetivo.
Ivan Ninenko, do
escritório russo da Transparência Internacional, disse que os atuais escândalos
de corrupção são o resultado de disputas de poder no Kremlin. Ele defende que
um golpe verdadeiro contra as práticas corruptas só será possível se oficiais
de alto escalão do governo forem parar nos banco dos réus, o que ainda não
aconteceu.
Ação contra a
oposição?
Já outros
especialistas acreditam que o presidente realmente leve essa luta a sério. "Ficou
claro que a corrupção se tornou um obstáculo para a implementação de políticas
governamentais", afirmou à DW o presidente do Comitê Nacional
Anticorrupção, Kirill Kabanov. "O governo tenta reduzir os protestos da
população através de políticas sociais, mas descobriu que as verbas para essas
iniciativas estão sendo desviadas", afirmou o especialista.
Existe também a
suspeita de que os planos de Putin teriam como objetivo retirar da oposição um
de seus mais fortes argumentos contra o governo. Em dezembro de 2011, milhares
de pessoas foram às ruas de Moscou para protestar contra a vitória do partido
Rússia Unida nas eleições, apelidado de "partido de corruptos e
ladrões".
O termo foi
inventado pelo advogado Alexei Navalny, cujo blog denuncia repetidamente as
práticas corruptas na Rússia. Navalny foi eleito recentemente presidente do
Conselho de Coordenação da Oposição. Os desafetos de Putin planejam para este
sábado um protesto de grandes proporções em Moscou, onde certamente não
faltarão faixas e gritos contra a corrupção.
Autor: Roman
Goncharenko (rc) - Revisão: Alexandre Schossler
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