quinta-feira, 22 de agosto de 2013

ELEIÇÕES ALEMÃS 2013: A ILHA DAS PESSOAS FELIZES

 


Frankfurter Allgemeine Zeitung, Frankfurt - Presseurop
 
A um mês das eleições, os alemães estão bem e não parecem preocupados com os problemas dos seus vizinhos. Entusiasmada com as sondagens, é neste clima de satisfação e despreocupação que Angela Merkel desenvolve uma campanha que procura, acima de tudo, não abalar os seus compatriotas, ironiza o “Frankfurter Allgemeine Zeitung”.
 
 
Quem olhasse para a Alemanha a partir do céu teria a sensação de ver uma ilha, apesar da sua localização continental. Uma bela ilha onde é bom viver, apesar de estar situada no meio de um mar encapelado. Nas ilhas vizinhas, a vida não corre tão bem – são mais planas do que a ilha Alemanha. As ondas rebentam nas suas costas e várias dessas ilhas estão prestes a ser submersas. Os habitantes da ilha Alemanha veem isso perfeitamente, ou leem nos jornais, mas parecem-lhes tão distantes que os moradores da ilha onde tudo corre bem não temem pela sua bela qualidade de vida.
 
É perigoso: de um momento para o outro, a boa vida da ilha Alemanha pode acabar. Ninguém poderá então dizer que não lhe foram apontados sinais de alerta ou avisos. Há doze anos, numa ilha vizinha, a oeste, ocorreu um ataque terrível, que provocou cerca de 3000 mortos. Os habitantes da ilha Alemanha compreenderam a gravidade do sucedido. Logo a seguir, produziu-se um evento semelhante numa ilha a sudoeste e noutra a norte. Novamente, os ilhéus alemães perceberam a gravidade da situação. Também no seu território, tinham sido preparados ataques. Foram detetados a tempo e abortados. O assunto foi rapidamente esquecido.
 
Alguns anos mais tarde, um novo acontecimento terrível ocorreu na grande ilha a oeste. Um banco que ilhéus alemães de apelido Lehmann lá haviam fundado há muito tempo entrou em falência, arrastando consigo muitos milhares de milhões [de dólares]. Muitas pessoas perderam o dinheiro com que contavam financiar a sua velhice. Outros bancos foram contaminados. Também na ilha Alemanha, um banco não se aguentou.
 
Insulares entraram em pânico
 
Num espaço de tempo muito curto, os nossos insulares acostumados à bonança entraram em pânico. O que iria acontecer ao seu dinheiro? O sentimento de ansiedade aumentou quando as ilhas vizinhas do Sul sentiram sérias dificuldades económicas, uma atrás da outra. Foram desbloqueados fundos alemães para ajudá-los. Os dirigentes da ilha Alemanha disseram às pessoas que esse dinheiro não era perdido, que o recuperariam na totalidade e que até iriam ganhar juros com isso. Um pequeno grupo de contestatários veio à praça pública e protestou um pouco contra esta política, mas rapidamente se reduziu à sua insignificância. Os habitantes da ilha Alemanha afastaram rapidamente o caso do seu espírito. A maioria considerava que a situação se iria acalmar, enquanto intermináveis montanhas de milhares de milhões [de euros] invisíveis se erguiam para o céu.
 
Outros acontecimentos horríveis, guerras civis e insistentes banhos de sangue, continuaram a não perturbar verdadeiramente o povo da ilha Alemanha. O facto de, a Sul, já estar rodeada por uma região do mundo destroçada nas suas fundações não lhes levantava problemas. A vida era demasiado bela na ilha Alemanha. A época em que cinco pessoas em cada 80 estavam desempregadas já tinha acabado há muito tempo. Agora, eram apenas três em 80 a viver nessa situação lamentável.
 
Ninguém queria ver que muitas pessoas mal conseguiam viver com o produto do seu trabalho e recebiam em segredo um rendimento adicional da administração insular. O facto de muitas crianças crescerem em situação de precariedade e de as próprias autoridades da ilha as retirarem aos pais, com medo de que não pudessem zelar pelas suas necessidades, não comovia ninguém.
 
Distribuídas fotografias da chanceler
 
De quatro em quatro anos, os habitantes da ilha tinham a possibilidade de eleger um novo chefe. A Alemanha é uma ilha moderna. Há oito anos que esse chefe é uma mulher. Porque não existe uma palavra para designar um chefe tribal do sexo feminino, chamam-lhe “chanceler federal”. E ela é danada de apegada ao seu cargo, como repete constantemente aos seus súbditos. Dentro de algumas semanas, vai haver nova eleição e a chanceler quer a todo custo manter a liderança.
 
Mesmo antes do escrutínio, os ilhéus são constantemente solicitados a dizer o que pensam dela. Embora governe há muito tempo, muitos dos entrevistados das sondagens ainda a consideram eficaz. É muito apreciada, afirma o partido ao qual a chanceler pertence. Para que as pessoas percebam como a sua chefe é fantástica, são distribuídas fotografias da chanceler e exibidas por toda a parte. Sozinha. Com textos onde se pode ler tudo o que ela fez pela ilha. E fica-se a saber que o marido reclama quando ela não põe suficiente Streusel [migalhas de massa doce] no Streuselkuchen [bolo levedado]. É a única queixa que a chanceler tolera.
 
Angela Merkel não é impopular. Também não é adorada. As pessoas não se prostram aos seus pés, como se fosse a filha de um barão da Francónia. Também não estão divididos entre, de um lado, os seus admiradores e, do outro, os críticos. Estão simplesmente satisfeitos por saber que alguém, no centro de comando, faz o que a maioria quer e que, quanto ao resto, deixa os súbditos em paz. Mais Streusel, Angela!
 
Foto: Na praia Friedrichskoog, no noroeste da Alemanha. AFP
 

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