Pedro Marques Lopes
– Diário de Notícias, opinião
Vemos um à esquerda
e outro à direita. Para tempos como os que passamos, um D. Sebastião era pouco.
Arranjámos dois: António Costa e Rui Rio.
É provável que
tanto um como o outro não gostem do que estão a fazer deles e que até convivam
mal com este peso que lhes estão a atirar para os ombros. Mas que o clima está
criado está, e não parece que tivesse sido artificialmente.
Não tenho
rigorosamente dúvidas nenhumas de que o eleitorado tradicional do PS preferia
ter António Costa como secretário-geral e que, se os votantes habituais no PSD
pudessem escolher, Rui Rio seria provavelmente o eleito. Embora tenha mais
dúvidas sobre a possível vitória do ex-presidente da Câmara do Porto.
Porém, há quem
garanta que nem um nem outro ganharia eleições dentro do respectivo partido.
Muito provavelmente os que o afirmam estão certos.
Não é novidade para
ninguém: as máquinas partidárias tornaram--se centros de emprego, sem ideologia
e com lógicas de funcionamento de mera sobrevivência interna e de obtenção do
poder pelo poder. Já ninguém ignora os pagamentos de quotas em massa, as
entradas inexplicáveis de novos militantes, os sindicatos de voto.
Parece claro que os
partidos, sobretudo o PS e o PSD, são os maiores exemplos da crise de representatividade
- problema que não se esgota, longe disso, nos partidos. Ou seja, só
marginalmente representam os seus eleitores ou, pelo menos, seguem lógicas
muitas vezes opostas a quem neles vota.
Estando tudo isto
longe de ser novidade, convinha, antes de lhes assinar a certidão de óbito,
perceber se os partidos ainda têm capacidade de se regenerar. Nem que seja,
para de uma vez por todas, ficar claro que o que se propala está certo. É que
quem os critica e afirma que já morreram esquece que Manuela Ferreira Leite
ganhou a Passos Coelho e que Seguro não teve concorrente à altura - e esses,
teoricamente, são os candidatos das máquinas. Alguém pode garantir que António
Costa não ganharia a Seguro ou que Rio não bateria Passos? Ninguém o pode
afirmar preto no branco. Aliás, ainda esta semana o socialista Manuel Pizarro
ganhou a concelhia do Porto precisamente contra a chamada máquina partidária.
Com todos os seus
defeitos, e que se têm avolumado com o tempo, é também aos partidos que devemos
a democracia e as transformações notáveis na nossa comunidade. O constante
discurso contra eles é muitas vezes merecido, mas outras tantas não medido.
Afinal o que se quer? Acabar com eles? Substituí-los por que tipo de
organizações? Mudá-los de que forma? Convém sempre lembrar que é muito por
culpa nossa, pela forma como entendemos a nossa vida em comunidade, como também
fomos pondo uma barreira entre nós e eles, que deixámos que os partidos
chegassem ao estado em que estão.
É sobretudo
fundamental que não comece a singrar o discurso dos homens providenciais. E que
esses homens não se deixem embalar com canções de movimentos de patriotas que
os queiram levar ao poder contra os partidos e o "sistema". Costa e
Rio são democratas com provas mais que dadas e seriam os primeiros a denunciar
essas vozes. Mas que estão reunidas as condições para que apareçam salvadores
da pátria, lá isso estão.
Não sei se António
Costa ou Rui Rio querem ser líderes dos partidos de que são militantes. Sei que
são homens de partido. Sei que conhecem os deles como ninguém. E sei que são
pessoas que percebem onde nos conduz o discurso contra os partidos e onde a
degradação da imagem do PS e do PSD nos pode levar. Quem, melhor que eles, pode
denunciar o seu mau funcionamento? Quem, melhor que eles, pode agir,
judicialmente que seja, contra as irregularidades?
Agora, há algo que
não podem fazer: querendo ser líderes, não concorrerem às lideranças dos seus
partidos. E, sobretudo, não podem admitir que alguém diga que eles não
concorrem porque sabem que perdem. É ofensivo. É dizer que já desistiram dos
partidos, é dizer que a sua militância é um embuste, é dizer que estes senhores
desistiram de acreditar numa democracia com partidos.
Numa democracia, a
derrota e a vitória são a face da mesma moeda. Fundamental é lutar. Mostrar o
caminho que se quer percorrer. Deixar claro a toda a gente que há alternativa.
Se Rio e Costa não
tiverem a coragem de arriscar perder nos seus partidos, teremos pelo menos a
certeza de que também não dariam bons líderes. Outros surgirão.
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