sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

ANGOLA: CAMINHOS DO FUTURO (1)



 Rui Peralta, Luanda

Hoje, nos tempos que percorremos, existe um sentimento generalizado de irrealidade, quer acerca da Politica, quer sobre matéria económica. Muito do que assumimos, de forma axiomática, já não cabe na nossa realidade. O mundo que nos rodeia dá-nos a impressão que se dissolveu e que a realidade é disforme, desconexa, surreal.

Algumas velhas palavras-de-ordem teimam em persistir mas já não são um guia para a acção ou uma força-motriz. Esses “slogans” são tudo o que fica quando tudo o resto já foi. No mundo que nos rodeia, a inovação, o surto empreendedor, as revoluções da bioengenharia e da informação, as novas tecnologias e a internacionalização da economia, representaram o fim de uma longa tendência global em direcção a uma cultura da segurança social e do bem-estar que são ainda nossos valores (e que são valores globais, válidos em todo o mundo). É bom não esquecer (e saber) que a segurança social é uma invenção do surto empreendedor do século XIX e foi criada porque existia um risco muito elevado de insucesso social, originador de desemprego, pobreza e fome. E descontentamento, claro. Mas foi em pleno surto empreendedor que os primeiros esboços de uma política de bem-estar social foram aplicados.

Segurança do emprego, emprego para uma vida, emprego, são categorias analíticas que já não se encontram configuradas na actual vida económico-social. As oportunidades de carreira requerem cada vez mais e maiores competências, pois o centro de gravidade deslocou-se e hoje o conhecimento é um instrumento de trabalho, de qualquer trabalho. Então as oportunidades de carreira requerem diplomas universitários? Algumas, nem todas. A maioria não, o que existe é muito desemprego em gente com “canudo”, o que prova que, afinal, os diplomas universitários não são um caminho certo e infalível que garante oportunidades de carreira ou, quanto muito, um simples emprego. Mas uma coisa é certa: as oportunidades de carreira exigem competências, saber-fazer, saber-aprender, saber-falar, saber-escrever, saber-pensar. No mínimo.

Assim sendo a educação tornou-se um mecanismo de mobilidade social e assume um lugar central nas novas dinâmicas do desenvolvimento. O problema é que nenhuma instituição educativa (pública ou privada) tenta equipar os alunos com as capacidades necessárias que lhes permitam assumir os riscos e as turbulências dos actuais mercados de trabalho e olhar com firmeza para os novos desafios que afligem a vida económico-social de todos os angolanos. Das nossas universidades continuam a sair cidadãos que não estão capacitados para apresentar ideias, oralmente e/ou por escrito, nem tampouco estão capacitados para trabalhar com outros cidadãos, ou capacidade para moldar a sua carreira e orientar o seu trabalho pessoal.

Numa economia-mundo onde o design de um produto é concebido num país, os componentes desse produto são fabricados noutros países e a montagem final encontra-se num terceiro país (muitas das vezes estes países encontram-se em diferentes continentes) as contas (e as politicas macroeconómicas) têm de ser diferentes. 90% das transacções financeiras da economia-mundo actual não têm qualquer função económica em termos de produção. A economia monetária internacional actual já não é uma máscara, um véu da realidade. É a própria realidade á qual os bens e serviços estão subordinados.

Neste contexto, a reciprocidade (e não o proteccionismo ou o seu oposto, o livre-cambismo) é a única relação comercial que evitará a estagnação e o papel periférico e que permitirá que cada país desfruta do mesmo acesso ao mercado de outro país. E a reciprocidade implica mecanismos de integração, permitindo às economias mais pequenas obterem a entrada em mercados maiores, gerando produção e vendas suficiente para se sustentarem a si próprias. Efectivamente existem quatro “economias” dentro da economia, quatro variáveis interdependentes: a economia da nação, a economia da região, a economia mundial de fluxos monetários, crédito e investimento e a economia da empresa transnacional que encara o mundo como um mercado único. Neste contexto dinâmico dos fluxos monetários os Estados reagem, mais do que iniciam ou controlam, a acontecimentos que ocorrem nos mercados de capitais globais. Os factores tradicionais de produção – a terra e a mão-de-obra – já não asseguram vantagens competitivas às nações (embora sejam imprescindíveis ás suas dinâmicas económicas internas, á sua soberania económica e ao desenvolvimento dos seus níveis de consumo e das estruturas do mercado interno).

A gestão tornou-se o grande factor de produção, tornou-se decisiva. Maximizar a quota de mercado (e não maximizar o lucro) tornou-se indispensável para qualquer economia soberana. O longo-prazo bem planeado, o médio-prazo bem estruturado e o curto-prazo optimizado são factores de garantia da soberania económica nacional. A capacidade do indivíduo e dos grupos têm de ser autonomizadas. Ao governo compete estabelecer os procedimentos que regem essa autonomia.

As novas realidades viraram as velhas teorias e práticas "de pernas para o ar". Qualquer nova síntese económica do futuro tem de integrar a macroeconomia monetária e autonomizar a forma como as empresas produzem e os indivíduos consomem, além de analisar minuciosamente as dinâmicas do empreendimento, da inovação e da criatividade. A nova realidade significa que já não é possível controlar as “condições atmosféricas” económicas, ou seja, a recessão, os ciclos de expansão, das taxas de poupança e do consumo, mas apenas controlar “o clima” ou seja, optimizar, desburocratizar, evitar degenerações e populismos. Há que educar a população activa para funcionar nos novos moldes da economia-mundo.

No fundo, camaradas, temos de aplicar a medicina preventiva, em vez de promover tentativas cegas com tratamentos a curto-prazo. Esse é o desafio primordial para Angola e o seu trilho numa Nova Era de prosperidade e bem-estar social.

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