quinta-feira, 25 de agosto de 2016

RESSACA NO BLOCO DE ESQUERDA!




O Bloco de Esquerda deveria perceber quanto a terapia neoliberal tem sido aplicada a Angola, depois do choque neoliberal da "somalização" e quais os impactos e os vínculos que se distendem num quadro dessa natureza!...

Desse modo, entendendo-o, o BE teria a oportunidade de melhor compreender os esforços de Angola para encontrar caminhos de resposta, em função das suas próprias trincheiras de inteligência e num momento em que a inteligência económica portuguesa é das mais ambíguas da União Europeia, tendo em conta o papel cada vez maIs vulnerável e marginal de Portugal nela e na NATO!...

Embalado no seu próprio "cabritismo" ``a frondosa árvore do BILDERBERG, via Balsemão e espaço de pronunciamento na SIC, o Bloco de Esquerda em relação a Angola continua efetivamente “bloqueado”!

Pelos vistos o “cabritismo” do Bloco de Esquerda, tem o laço dum tal Gene Sharp, cujas filosofias afinal o Bloco também professa, quiçá inspirado pela frondosa árvore!...

Será uma tal teimosa cultura “de esquerda”, ou o "bloqueado" está a tentar ser em relação a Angola um verdadeiro "submarino ideológico" (a justo propósito de submarinos)?

O MPLA convidou para o seu VIIº Congresso todos os principais partidos portugueses com assento no Parlamento Português, incluindo o BE... que perdeu a oportunidade de assim colocar os constrangimentos que tinha em relação ao MPLA e a Angola...

Admite-se assim que a ressaca não esteja a ser boa conselheira!
  
Foto: O Presidente José Eduardo dos Santos recebe o empresário Paulo Portas.

A consultar: 

Portugal. ABAFARAM A LISTA DE AVENÇAS DO GES A POLÍTICOS E JORNALISTAS?



Houve, como continua certamente a haver, quem esteja condicionado por interesses no exercício das suas funções, quem tenha fugido às obrigações fiscais e quem conte com a candura da sociedade portuguesa ou com a ineficiência do sistema judicial, mas permitir o abafamento do caso das avenças por via da voragem noticiosa que, sem critério, dita o que conta e o que não conta, é demais. Uma vergonha!

António Galamba – jormal i, opinião

Em breve decorrerão quatro meses (quatro!) desde que um semanário do consórcio de órgãos de comunicação social associados às revelações dos Papéis do Panamá – a maior investigação jornalística de sempre! – anunciou urbi et orbi que havia políticos e jornalistas avençados pagos pelo saco azul do Grupo Espírito Santo, a ES Enterprises. E quatro meses depois (quatro!), a higiénica divulgação da lista de políticos, funcionários públicos, gestores, empresários e jornalistas constantes da folha de pagamentos através de um paraíso fiscal não aconteceu. 

O que terá feito esboroar toda a gigantesca encenação mediática montada em torno das revelações bombásticas dos Papéis do Panamá que tanto prometiam? A falta de zelo e de amor à profissão dos jornalistas envolvidos na investigação? O poder dos interesses em presença perante a possibilidade da divulgação dos nomes de quem estava condicionado pelo Grupo Espírito Santo? O embuste entre a documentação prometida e a que foi disponibilizada? A verdade é que quatro meses depois (quatro!), o assunto morreu, nada acontece e quase ninguém se indigna.

Houve, como continua certamente a haver, quem esteja condicionado por interesses no exercício das suas funções, quem tenha fugido às obrigações fiscais e quem conte com a candura da sociedade portuguesa ou com a ineficiência do sistema judicial, mas permitir o abafamento do caso das avenças por via da voragem noticiosa que, sem critério, dita o que conta e o que não conta, é demais. Uma vergonha!

A anunciada ponta do iceberg, que tanto prometia, gelou os ânimos da investigação jornalística, esmoreceu a ambição de mobilizar as sociedades e os Estados para a regulação dos paraísos fiscais e desembocou num marasmo impróprio das sociedades de informação modernas, de uma cidadania ativa e de um Estado de direito em que o cumprimento das obrigações fiscais é uma componente importante para o modelo de concretização das funções do Estado.

Abafaram a lista das avenças do GES a políticos e a jornalistas, razão para os cidadãos exigirem a sua divulgação integral. Não é voyeurismo, é uma questão de higiene social, antes de poder ser uma questão fiscal e judicial. Não é coscuvilhice, é contribuir para que não se consolide a ideia de que não são todos iguais, porque não é assim.

Enquanto persistir este défice de exigência, de transparência e de separação entre o exercício de funções públicas ou o dever de informar e os interesses instalados ou em instalação vão persistir situações vergonhosas, sejam ou não divulgadas. Quem tanto sofreu com a austeridade nos quatro anos de governos PSD/CDS, quem continua a não ser tratado com o devido respeito por uma máquina fiscal e por serviços do Estado investidos no desespero da arrecadação de receita e quem cumpre as suas obrigações não pode deixar de se indignar perante tudo isto.

E por falar em estados de alma, ainda que menos sérios quando confrontados com a realidade das coisas: Portugal tem uma solução governativa em que o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português (também o PEV) são uma espécie de calçadeira do governo PS e, no entanto, a coordenadora do BE, Catarina Martins, veio afirmar sobre a criação da designada geringonça que “todos os dias me arrependo. Faz parte”. Tem muita piada este esforço de demarcação em vésperas da negociação do Orçamento do Estado para 2017. É que quando o Bloco antevê medidas positivas do governo em estado de euforia não se denota nenhum tipo de arrependimento, é puro oportunismo, por vezes eivado de populismo. Nesta disputa pelo anúncio do “bife do lombo”, alguém apresentará os ossos duros de roer. O PCP não ficou atrás e anunciou que votará “contra medidas de empobrecimento no Orçamento do Estado para 2017”. A uns e a outros, este é o tempo para colocarem em cima da mesa as reivindicações que fazem no plano local, nas autarquias, nas alegadas comissões de utentes e nas moções e petições que apenas sublinham a sua hipocrisia política. É que não é sério apoiar o governo em Lisboa, no parlamento, à babugem do “bife do lombo”, e depois tentar construir a ideia local de que são os grandes defensores daquilo que não defenderam quando estavam a discutir o poder. Este é o momento: moções do comité central debitadas para as células, para apresentação nas assembleias de freguesia e nas assembleias municipais, uni-vos!

É que isso de querer só o “bife do lombo” era coisa dos donos disto tudo e já ninguém acredita ser possível um registo assim.

Notas finais

Areia nos pés – Com o investimento que é feito na prática desportiva, só mesmo a excecionalidade dos nossos atletas pode conduzir a resultados excecionais. Para colher é preciso semear, também no desporto. Aos atletas do projeto olímpico, obrigado pelos sacrifícios, pelo esforço e pela participação.

Areia nas virilhas – Entre um líder do PSD imobilizado pelos fantasmas da governação passada, incapaz de fazer um restart, e uma líder do CDS mobilizada para fazer a diferença em relação ao ex-parceiro de governação com produções mediáticas apostadas mais na forma do que no conteúdo, vai assim a oposição: “poucochinha”.

Areia na engrenagem – A gestão do dossiê da CGD vai entrar para os anais da história como uma das maiores trapalhadas, num cocktail de ingenuidade, incompetência e falta de noção de que não estamos sozinhos. Parece que estará a chegar ao fim a novela, com baixas e danos de credibilidade.

Areia fina – O bravo esforço desenvolvido pelas mulheres e pelos homens do dispositivo de combate aos incêndios florestais.

Escreve à quinta-feira

“TODOS TRATAM O POVO PORTUGUÊS COMO SE FOSSE ESTÚPIDO” – Paulo de Morais



Paulo de Morais discorda da recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e critica políticos das várias alas partidárias.

Paulo de Morais considera que é uma “mentira” que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) precise de um reforço de capital de cinco mil milhões de euros. O candidato às últimas eleições presidenciais estranha, ainda, a falta de explicações sobre a necessidade de recapitalização. E tece críticas em vários sentidos.

“Os políticos querem convencer-nos de que a CGD precisa de um reforço de capital de quase cinco mil milhões de euros - da Esquerda do Bloco e PCP, à Direita do CDS, passando pelo primeiro-ministro socialista e também pelo líder do PSD”, escreveu na sua página no Facebook.

“Mas recusam-se a explicar porquê”, atira, convicto de que “o Governo não quer (ou não pode!) esclarecer qual o motivo dessa entrada de dinheiro público (do povo) na Caixa”.

“Nem os famosos jornalistas de economia os questionam”, lamenta ainda, acrescentando que “todos tratam o povo português como se fosse tão estúpido que não precisa de ser esclarecido. Ou até pior: não precisa de ser esclarecido, mas está disposto a pagar (alegremente) milhares de milhões de euros sem saber para quê”.

Goreti Pera – Notícias ao Minuto

PAZ NA COLÔMBIA APÓS 50 ANOS DE CONFLITO!




Na sequência de conversações que duraram mais de 4 anos, tendo como intermediários Cuba e a Noruega e acompanhantes a Venezuela e o Chile, os resultados conseguidos põem fim à mais antiga guerrilha do hemisfério ocidental, com a integração no processo democrático colombiano como partido político das FARC-EP (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, Exército do Povo) e um conjunto de medidas que visam salvaguardar os direitos das classes mais desfavorecidas.

O Acordo definitivo será resultado por seu turno dum Referendo Nacional com vista a que todo o povo colombiano possa decidir.

As conversações foram feitas sobretudo num ambiente latino-americano que certamente trará imensos ensinamentos para toda a América Latina, projetando também a Noruega, um dos países que ocupa os primeiros lugares em termos de Desenvolvimento Humano conforme aos Índices anualmente publicados pelos organismos da ONU, como um fator de paz a ter em conta ao nível global.

Na Colômbia abrem-se espaços de integração e participação como nunca antes ocorreu e o aprofundamento da democracia será muito importante para se fazer face a outros fenómenos com implicações nacionais, entre eles as formas e os métodos de combate ao tráfico de drogas sobretudo no que diz respeito à componente nacional.

Os angolanos só podem regozijar-se pelos avanços progressistas alcançados na Colômbia, um país na América do Sul com imensos potenciais e recursos, que é também sensível nos relacionamentos regionais, onde os espaços de participação se abrem ao todo nacional.

Com a paz na Colômbia, reforçam-se os processos democráticos e de integração latino-americana, incentivando outros a procurar o mesmo tipo de soluções históricas onde quer que ocorram contradições radicais ou em vias de radicalização, levando sempre em conta a necessidade de implementar direitos iguais para as classes mais vulneráveis da sociedade e de forma esclarecida enfrentar os problemas próprios dos desequilíbrios humanos, do subdesenvolvimento e do respeito que os habitantes devem ter para com a Mãe Terra.

Este processo de democratização leva em conta as condutas de domínio da hegemonia unipolar, reduzindo os impactos nocivos do capitalismo neoliberal nas sociedades dos países do sul, por que não impedem a capacidade crítica em relação ao comportamento do império quando a globalização é irreversível para todos os habitantes e para a vida nesta minúscula casa comum! 

Fotos:
- Acordo entre o governo colombiano e as FARC-EP;
- Representante governamental colombiano nas conversações de Havana;
- Representante das FARC-EP nas conversações de Havana.

A consultar:
- Anuncian Comunicado conjunto para la terminación del conflito Gobierno e FARC-EP – http://www.granma.cu/mundo/2016-08-24/anuncian-comunicado-conjunto-para-la-terminacion-del-conflicto-gobierno-y-farc-ep

EM BUSCA DA INTERNET PERDIDA



Tim Berners-Lee, o criador da web, quer uma rede livre das megaempresas que controlam, capturam e vendem nossos dados vitais. Conheça o Solid, seu projeto de decentralização e autonomia radicais

David Weinberger*, no Digital Trends – Outras Palavras - Tradução: Gabriela Leite

Quando a World Wide Web decolou pela primeira vez, na metade dos anos 90, o sonho não era apenas grande, era distribuidor: todas as pessoas teriam sua própria homepage, todos iriam publicar seus pensamentos — isso não era chamado de “blog” até 1999 — e iriam ter posse de seus próprios dados, afinal ninguém estava oferecendo possuí-los por nós. A web consistia em nós, unidos por links, sem qualquer centro.

Como os tempos mudaram. Agora, um punhado de empresas dominam vastas áreas da atividade da web — o Facebook para rede social, o Google para pesquisa, o eBay para leilões — e literalmente possuem os dados que seus usuários entregam e criam. Isso dá a essas empresas um poder sem precedentes sobre nós, e lhes dá tamanha vantagem competitiva que é muito ingênuo pensar que seria possível lançar uma iniciativa capaz de vencê-los em seu próprio jogo. O fato de que o Facebook já tem os dados de 1,7 bilhões de perfis de usuários e — mais importante que isso — a história das interações de seus usuários, significa que você provavelmente não vai conseguir atrair muitos investidores experientes. Além disso, é lá onde já estão todos os seus amigos. A dependência do fornecedor é real.

Isso inspirou um esforço para re-descentralizar a web. Duas das tentativas mais importantes — alguns contariam o blockchain como uma terceira — são arquiteturalmente muito promissoras. A questão é: até que parte a arquitetura será suficiente?

A primeira iniciativa inovadora vem de Tim Berners-Lee, a pessoa que inventou a web e a deu de presente para nós, sem patentes, copyrights ou marcas registradas. O novo projeto de Berners-Lee, a caminho através de seu laboratório no MIT, chama-se Solid (“social linked data”, ou “dados sociais interligados”, em tradução livre), um jeito de fazer as pessoas terem os direitos sobre seus próprios dados, ao mesmo tempo em que os disponibilizam para os aplicativos que quiserem utilizar.

Com o Solid, você armazena seus dados em “pods” (“personal online data stores”, ou “repertórios de dados pessoais online”, em tradução livre) que ficam hospedados onde você quiser. Mas o Solid não é apenas um sistema de armazenamento: ele permite que outros aplicativos requeiram os dados. Se o Solid autentifica o app e — importante — se você der permissão para acessar os dados, o Solid os entrega.

Por exemplo, você pode manter suas informações pessoais em um dos muitos pods: o tipo de dados que você põe em seu perfil no Facebook; uma lista de seus amigos, família e colegas; suas informações bancárias; mapas pelos lugares por onde você viajou; algumas informações de saúde. Desta maneira, se alguém construir um novo aplicativo de rede social — talvez para competir de frente com o Facebook, ou, mais provavelmente, oferecer serviços especializados a pessoas com interesses em comum — você pode fazer parte dele, dando a ela permissão para acessar as informações apropriadas em seu pod. Seus dados armazenados permaneceriam sendo seus, de todas as maneiras: completamente sob seu controle, estocados onde você preferir, e utilizáveis apenas pelos aplicativos aos quais você der permissão.

O Solid é projetado de cima abaixo para permitir a descoberta e compartilhamento de informações. Por isso o “linked data” (“dados interligados”) no lid, no nome do projeto. Linked Data é outra invenção de Berners-Lee, uma maneira de se referir a dados cuja interligação é facilitada por meio de repositórios. Embora Linked Data seja um concieito difícil de dominar, o Solid pode tornar a informação na internet mais inteligente. Por exemplo, se você quiser, pode dar informação para um site de viagens ou para um grupo de ação sobre mudança climática, para acessar a informação em seus pods sobre seus dados demográficos e as viagens que fez. Esse grupo poderia tabular suas informações em conjunto com os dados de pods de outras pessoas, para conseguir um quadro atualizado dos locais para onde se está viajando, como isso afeta as economias locais, a emissão de carbono, e talvez até atitudes de nações em relação a estrangeiros.

O Solid faz tudo isso sem ter que centralizar a informação em mãos nas quais confiamos — nem deveríamos confiar.

Inter Planetary File System (IPFS, ou “sistema de arquivos interplanetário”, em tradução livre) tem uma abordagem diferente. Começa pela convicção de que mesmo a existência de páginas da web armazenadas num único servidor é algo que implica muita centralização. Por que não, ao invés disso, seguir o caminho do BitTorrent e permitir que múltiplos computadores forneçam partes de uma página, todos ao mesmo tempo? Desta maneira, se um servidor cair, não levará com eles todas as suas páginas. O IPFS faria a web mais flexível, e menos sujeita à censura.

Para utilizar o IPFS a tal ponto, você pode instalar extensões noChrome e no Firefox, ou recorrer à abordagem mais techie, usando linhas de comando. O IFPS espera, no entanto, que seus padrões sejam aceitos pelo W3C e pelo IETF, os grupos que decidem o que conta como parte oficial da web e da internet. Isso ajudaria a motivar os browsers a construir, com suporte nativo, de acordo com o novo protocolo.

O Solid, de Berners Lee, e o IPFS irão re-descentralizar a web? Tudo se resume a exigir: as pessoas vão se importar o suficiente para aceitar medidas que pareçam ser um temporário passo atrás? Por exemplo, é improvável que novos aplicativos de redes sociais basiados no Solid sejam lançado com toda a sofisticação do Facebook. Por outro lado, para os serviços de redes sociais projetados para tipos particulares de pessoas — cientistas, pesquisadores, artistas colaborativos — talvez seja mais fácil começar assim. E parece bem plausível que organizações que se importam com a preservação a longo prazo de seus materiais na web percebam que o IPFS é bastante atraente. O mesmo poderá ocorrer com as pessoas que compartilham conteúdos que demoram tempo demais para carregar na web normal.

Portanto, há alguma esperança. No curto prazo, os novos projetos não precisam disputar com os atuais hubs gigantes. Basta oferecer algumas alternativas a eles. No fim das contas, a grande questão é: as forças que transformaram a web numa série de hubs centralizados recuarão, diante da possível pressão de arquiteturas que permitem re-descentralizar a rede? A resposta, imagino, é não. A não ser que nós, usuários da web, o exijamos…

* Outras Palavras agradece ao leitor Guilherme Moro, que sugeriu a tradução deste texto

FASCISMO AMERICANO, AS RAÍZES DE UMA NAÇÃO SOB DEUS



Realizadas as Convenções dos Partidos Republicano e Democrata, somente restam na corrida para a Casa Branca dois candidatos importantes: Hillary Clinton e Donald Trump, qual deles o mais reacionário e perigoso para a humanidade.

Neste artigo, publicado em Setembro do ano passado na Revista Vermelho, António Santos comenta a influencia que o pensamento fascista do III Reich teve na formação da ideologia predominante nos Estados Unidos.

Não perdeu atualidade.

António Santos*, em Diário Liberdade

Ao avesso do tradicional ramerrão eleitoral da direita portuguesa que, de quatro em quatro anos, prega um discurso tacticamente moderado nos mais empedernidos candidatos conservadores, a antecipação do escrutínio presidencial estado-unidense dá azo a uma invulgar competição de reaccionarismo entre os dirigentes do Partido Republicano.

Ao passo que para o PS, PSD ou mesmo CDS-PP, um acesso de frontalidade equivaleria a cometer harakiri político, nos EUA, os homens que se perfilam para a nomeação republicana assumem as mais virulentas declarações de guerra ao progresso como um trunfo mediático.

Arca de Noé da Direita Americana

O senador do Texas, Ted Cruz, inaugurou a campanha às primárias republicanas com um desafio aos outros candidatos: «Todos vão dizer que “Eu sou o homem mais conservador que alguma vez viveu”, mas falar é fácil. Digam-me antes o que defenderam e pelo que lutaram», rematou.

Estava lançado o mote para uma bizarra corrida de pureza ideológica em que o pódio pertence aos titulares das melhores credenciais religiosas, aos currículos estaduais que abonarem a favor da destruição das funções sociais do Estado e aos paladinos do racismo, homofobia e da xenofobia: uma verdadeira arca de Noé.

Entre os 15 principais candidatos à nomeação, cinco, John Kasich, Ben Carson, Rick Perry, Rick Santorum e Mike Huckabee, garantem ter sido escolhidos por deus; Já Jeb Bush (irmão de George W.) prometeu «pôr um ponto final» no Medicare, o único programa de saúde pública que disponibiliza serviços mínimos à população mais carenciada; por seu turno, Ted Cruz não tem pejo em denunciar uma «guerra contra a masculinidade» e promete proibir o aborto, mesmo nos caso de violação ou perigo de vida para as mulheres; Não ficando atrás, Scott Walker, que promete encerrar o Departamento de Educação (equivalente ao ministério), perguntava-se, em jeito de campanha: «Se fui capaz de acabar com cem mil sindicalistas no Wisconsin, o que é que acham que sou capaz de fazer a nível internacional?».

Malgrado o sestro, asinino e boçal, de que se fazem acompanhar estas declarações, o reaccionarismo republicano não é, de todo, uma reacção psicossomática, mas sim o bilhete de entrada na liça política. Prova disto é Donald Trump, a quem as sondagens elevaram ao primeiro lugar entre os republicanos depois de ter dito que os «mexicanos são violadores e criminosos», para prometer expulsar todos os imigrantes ilegais.

O fantasma de João Calvino

Na verdade, o reaccionarismo norte-americano insere-se numa longa tradição de «política de pretexto», em que o capitalismo cria um quadro cultural e psicológico favorável ao seu desenvolvimento, uma ideologia nacionalista que reclama obediência e ameaça com uma gradação moral maniqueísta e implacável. Neste processo, que não é contínuo, os antagonismos económicos são acompanhados, na vida social, pela desconexão entre o futuro e o progresso e entre a realidade e a moralidade.

Os ardentes fundamentalistas religiosos que, ao longo do século XVII, colonizaram o que viria a ser os Estados Unidos produziram, para consumo interno, uma narrativa moral que pretendia unificar a sociedade e justificar o status quo. De acordo com o calvinismo, a mais influente das seitas protestantes entre os «peregrinos» originais, o destino dos homens está, à partida, traçado por deus. Deste modo os homens e as mulheres já estão condenados, à nascença, ao paraíso ou ao inferno, pelo que nenhuma acção pode alterar o rumo pré-destinado, nem mesmo a exploração, o genocídio ou a crueldade: começa a nascer o pretexto para «uma nação escolhida por deus». Esta relação dialéctica entre a moralidade e a economia foi o alvo certeiro da obra de Max Weber, A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, mas, ao contrário do que é insinuado pelo autor, não só não foi a ética que pariu o capitalismo, como a forragem espiritual do capitalismo foi, historicamente, um pretexto.

O mercado de Wall Street

A infra-estrutura económica do capitalismo norte-americano, assente sob o trabalho forçado de quatro milhões de escravos africanos, gerou, ao longo do séc. XIX, contradições que acabariam por conduzir à guerra civil de 1861-1865. Longe de ser uma batalha ética pela libertação dos escravos, nas origens do conflito estiveram discrepâncias económicas entre a indústria do Norte e o modo de produção esclavagista no Sul.

Sangrenta para os trabalhadores, a guerra civil criou importantes fracturas entre as classes dominantes que se mantêm até aos nossos dias. Não é curiosidade histórica que Wall Sreet, centro nevrálgico da banca, tenha começado por ser um mercado de escravos. Com efeito, durante a guerra, a alta finança do Norte nunca deixou de apoiar a Confederação, mas soube lucrar com o seu ocaso. JP Morgan Chase ou Lehman Brother foram, de resto, os principais investidores das plantações de escravos mas adaptaram-se com ligeireza à nova «liberdade». Não pôr todos os ovos no mesmo cesto é, como ser verificará mais tarde, o adágio eterno da facção mais radical do capital estado-unidense.

A inspiração de Hitler

Para suturar as profundas feridas da guerra civil e controlar a maré de progressos sociais e lutas de classe que floresceram espontaneamente durante a era da Reconstrução, a aristocracia do Sul e os capitalistas do Norte pactuaram um conceito de nação dogmático e moralista. A partir da última década do séc. XIX, «ser americano» começa a implicar a adesão a uma ideologia nacionalista, a subscrição de uma moral cristã e capitalista, o reconhecimento da natureza divina da nação, bem como a obediência cega às leis e aos símbolos nacionais. A nova narrativa moral sobre o nacionalismo foi o pretexto ideal para uma escalada de perseguição dos sindicatos que se formavam sob a influência do socialismo e que desembocou, em 1886, na revolta de Haymarket, cuja violenta repressão daria mais tarde origem ao 1.º de Maio, Dia Internacional do Trabalhador.

Surge assim, em 1892, a obrigação de repetir diariamente o juramento de bandeira em todas as escolas públicas. Originalmente, as crianças faziam a saudação romana enquanto repetiam: «Juro obediência à bandeira dos EUA e à república que ela representa, uma nação, sob deus, indivisível, com liberdade e justiça para todos». Depois, gritavam em uníssono: «Um país! Uma Língua! Uma Bandeira!».

É também durante esta época que, nos EUA, nascem os primeiros programas de eugenia do mundo, destinados a exterminar os indivíduos «geneticamente inferiores». Em resposta às ideias marxistas que chegavam da Europa, magnatas como Andrew Carnegie e John Rockefeller investiram milhões na promoção do pretexto de que a pobreza e o crime eram o corolário de «genes inferiores». Em 1907 os Estados de Washington, Connecticut, Califórnia, Virgínia, Nevada, Iowa, Nova Jersey, Nova Iorque e Indiana operavam programas para a esterilização forçada de pobres, nativos americanos, doentes mentais e presidiários. Foi nos EUA que a Alemanha nazi bebeu a inspiração para o seu próprio programa eugenia e, desde o primeiro Congresso Internacional de Eugenia, em 1911, cientistas alemães tornaram-se alunos assíduos dos centros americanos de esterilização em massa.

A primeira ameaça vermelha

A Revolução Bolchevique de 1917, porventura o acontecimento mais relevante da História humana, é interpretado pela burguesia norte-americana como uma ameaça indirecta ao ethos nacionalista do pós-guerra civil e ao próprio poderio da sua classe. A Revolução de Outubro mostrara que os trabalhadores podiam viver melhor gerindo, eles mesmos, a sociedade, sem necessidade de exploradores, racismo, deuses ou discriminação sexual.

Após uma tentativa frustrada de sufocar, via invasão militar, a jovem revolução, o capital estado-unidense lançou uma campanha doméstica de histeria anti-comunista para evitar que a fagulha de Petrogrado incendiasse as planícies americanas. Entre 1917 e 1920, milhares de sindicalistas, comunistas e anarquistas da International Workers of the World foram assassinados, deportados ou, simplesmente, desapareceram.

Também para os afro-americanos, a Revolução de Outubro foi uma janela de esperança. A escravatura fora substituída por um novo sistema de opressão racista, mais adequado às novas condições económicas e através do encarceramento massivo, da discriminação salarial e da segregação, os antigos escravos continuavam a ser brutalmente oprimidos. No entanto, como fez notar o presidente Woodrow Wilson, «negros americanos a regressar do estrangeiro seria o melhor meio para conduzir o bolchevismo para a América».

Para responder às organizações de classe operária que os negros formavam por todo o país, o capital respondeu com três instrumentos. Por um lado, foram levados a cabo dezenas de massacres que culminaram com o Verão Vermelho de 1919, que registou matanças de negros em 34 cidades. Por outro, acelerou-se o processo de gestação de um nacionalismo cada vez mais intolerante, moralista, dogmático e agressivo, que se impôs na educação pública, nos meios de comunicação social e através da propaganda. Finalmente, foi criada uma poderosa organização fascista de massas, o Ku Klux Klan.

O KKK, que em 1924 atingiu quatro milhões e meio de membros, representava a materialização do pretexto nacionalista. Sem surpresas, só uma organização fascista, altamente violenta e ao serviço das classes dominantes do Sul, poderia garantir a obediência a uma moralidade cada vez menos ética.

A violência exercida pelo KKK e quejandos sobre negros, sindicalistas e comunistas permitiu ao patronato manter baixos níveis salariais e reduzir para metade, em apenas cinco anos, ao longo dos anos 20, a percentagem de trabalhadores sindicalizados nos EUA.

A cultura do fascismo

Nos anos 30, apesar de um significativo passo atrás na economia com o New Deal de Franklin Roosevelt, o reaccionarismo norte-americano continua a ganhar expressão com o chamado «americanismo», a primeira tentativa de organizar a ideologia moral do nacionalismo americano.

O americanismo, promovido por homens como Henry Ford, defendia a preservação da cultura e valores americanos de influências estrangeiras e procurava equiparar o comunismo com o judaísmo. Ford, que se dedicava à publicação de literatura anti-semita desde os anos 20, é um exemplo claro da aproximação cultural da ideologia nacional americana ao fascismo.

Nos anos 30, receoso de sindicatos nas suas fábricas, Ford começou a conceder aos trabalhadores a possibilidade de trabalhar cinco dias por semana e oito horas por dia, desde que vivessem vidas «de acordo com a moral nacional» e com a religião.

O famoso Departamento de Sociologia de Ford levava a cabo buscas domiciliárias na casa dos operários para garantir que viviam «vidas regradas» de acordo com a moral do patrão. A Liga de Protecção Americana, que chegou aos 250 mil membros nos anos 30, garantia a vigilância e delação dos costumes dos trabalhadores, expondo não só os «imorais» como os «traidores» e, claro, os «comunistas».

Nazis e americanos, uma história de amor

Ao longo dos anos 30, as pontes económicas e culturais entre a Alemanha Nazi e os Estados Unidos da América não pararam de se desenvolver, ao ritmo dos negócios de empresas como a General Motors, a IBM ou a Coca-Cola. Na verdade, o fascismo tornou-se extremamente popular na América da década de 30: em 1934, o Departamento de Estado classificava a vitória do Partido Fascista, por 99,8%, no «referendo» de 1934 como uma «demonstração da popularidade incontestável do fascismo» e, em 1937, elogiava o mesmo regime por ter «substituído o caos pela ordem, a anarquia pela disciplina e a bancarrota pela solvência».

O embaixador dos EUA na Alemanha Nazi, William Dodd, escrevia, em 1937, que «uma clique de industriais dos EUA está determinada em substituir a nossa democracia por um Estado fascista. No meu posto em Berlim pude verificar como algumas das famílias que mandam no nosso país são próximas do regime nazi. […] Certos industriais americanos tiveram muito a ver com a chegada dos regimes fascistas ao poder na Alemanha e em Itália. Ajudaram o fascismo a chegar ao poder e agora estão a ajudá-lo a manter-se lá».

As famílias de que Dodd falava eram, nem mais nem menos que os Hearst, os Kennedy, os Lindbergh, os Rockefeller, os DuPont e os Bush. Entre as empresas, distinguem-se nomes como a Coca-Cola, a General Electric e a Exxon, entre muitas outras. Como prova o crescimento em quase 50% dos investimentos norte-americanos na Alemanha até ao começo II Guerra Mundial, ao contrário do desinvestimento verificado no resto da Europa, o capital estado-unidense repetiu a receita da guerra civil: financiar os amigos sem se comprometer politicamente. Mesmo durante a guerra, as relações comerciais e financeiras mantiveram-se clandestinamente, em alguns casos com requintes de malvadez, como é o caso da IBM de Thomas Watson, pessoalmente galardoado por Hitler por ter produzido e emprestado à Alemanha máquinas, feitas à medida, para contar e seriar as vítimas do holocausto. O patrão da IBM que expressou «a mais alta estima por Hitler, o seu país e o seu povo», esperava que as máquinas fossem devolvidas «quando os alemães acabassem».

A casa de Hitler nas montanhas

No entanto, para a construção do reaccionarismo americano, o fundamental foi a acção da Hearst Publications, o maior grupo de imprensa do mundo. Se, hoje em dia, o grupo Hearst detém 300 revistas, 50 jornais e 31 canais de televisão, nos anos 30 era ainda mais poderoso, controlando dois terços de todo o mercado editorial dos EUA. O seu dono, William Hearst, um reconhecido nazi, não foi só o fundador do conceito de imprensa sensacionalista, como foi também o inventor de alguns dos mitos anti-comunistas mais antigos.

Em 1937 a Revista Fortune, propriedade de Hearst, escrevia: «O bom jornalista deve reconhecer no fascismo as boas virtudes da raça. Entre elas, a disciplina, o dever, a coragem, a glória, o sacrifício».

Já na Reader’s Digest, também de Hearst, lia-se: «A forma como Hitler conquistou os corações dos alemães é tão completa que mesmo que os camisas castanhas desaparecessem continuaria a ser o homem mais poderoso da Alemanha: Hitler é reconhecido por toda a intelligentsia política como um homem extraordinário, um profeta. […] Não encontrei um único alemão que sonhasse com a possibilidade de uma guerra. A verdade é que a mente dos nazis está concentrada em problemas internos e não vai querer ser incomodada com assuntos estrangeiros durante muito tempo».

Entretanto, em 1938, a Better Holmes and Gardens, do mesmo dono, dava ao prelo: «Hitler é um homem de bom gosto e a sua casa na montanha mostra como é simpático, humilde e acessível».

A História provou que o III Reich financiava directamente a máquina de propaganda de Hearst, mas nem todas mentiras nazis morreram com Hitler. Uma delas, criada pelo Ministério Alemão da Propaganda em 1934 vive até aos nossos dias: o «holodomor», a ideia que os bolcheviques empurraram deliberadamente a Ucrânia para a fome. Foram os tablóides de Hearst, a pedido dos nazis e com fontes nazis que criaram esse mito.

A segunda ameaça vermelha

A declaração de guerra aos nazis foi um processo complexo e extremamente contraditório. Tal e qual como na guerra civil, a entrada dos EUA na II Guerra Mundial resultou da pugna pelo poder político entre diferentes sectores do grande capital monopolista. Como sintetizou o Secretário de Guerra, Henry Stimson, «se vais entrar numa guerra ou preparar-te para uma guerra num país capitalista, tens de deixar que as empresas façam dinheiro com a guerra ou não vai funcionar». Nesta esteira, é sintomático que todas as empresas atrás referidas tenham sido indemnizadas pelos EUA por todos os estragos provocados às suas propriedades na Alemanha, incluindo em bases militares nazis. Merece ainda destaque a contratação, em massa, de cientistas e oficiais nazis pelos EUA, após a guerra para liderar missões científicas ou como «caçadores de comunistas» dispersos pelo mundo.

Anti-comunismo sem comunistas

Terminada a Guerra, começa a maior caça às bruxas de todos os tempos nos EUA: a segunda ameaça vermelha. Entre 1947 e 1957, o chamado Macartismo, em referência ao senador Joseph McCarthy, embutiu na cultura da direita americana os últimos elementos anti-comunistas, ultra-conservadores, racistas e radicalmente nacionalistas.

O violento anti-comunismo dos anos 50 é singular porque dispensa a existência de uma verdadeira ameaça comunista, ideologia que, nessa década, representava, nos EUA, uma minoria com pouca influência política. Sobressai, mais uma vez, a ideologia americanista como um pretexto para alavancar objectivos económicos de classe.

Da mesma forma que, na década de 50, bastava aos afro-americanos o fantasma do comunismo para precipitar os direitos civis, também aos capitalistas bastava esse espectro para desencadear a repressão. Com efeito, a segunda vaga anti-comunista, não teve como principal alvo dirigentes comunistas, sindicalistas, operários e camponeses, mas principalmente os agentes culturais, os intelectuais, os estudantes e os artistas.

América Anti-intelectual

O McCartismo marcou de forma indelével o significado de «ser americano» porque intrelaçou de forma inexpugnável as ideias de comunismo, traição e intelectualidade. Se, até 1920, o comunista era um imigrante europeu, barbudo e selvagem, agora, nos anos 50, o comunista era representado na propaganda como um professor culto e sofisticado que, através de perigosos argumentos, consegue lavar o cérebro de americanos leais à nação.

O resultado da política de perseguição de académicos, escritores e intelectuais que, mesmo sem serem comunistas, questionavam e ousavam pensar instituiu uma alergia geracional à cultura que se mantém nos nossos dias, a par de um anti-intelectualismo que perdura na política como atestado de patriotismo.

Actividades anti-americanas

O Comité das Actividades Anti-Americanas, HUAC nas siglas em inglês, cuja vida de terror se prolongou entre os anos 30 e os anos 70, foi a pedra-de-toque na instalação de um ambiente de permanente ansiedade anti-comunista: a acusação de 324 trabalhadores do espectáculo, adicionados à infame Lista Negra, e a condenação de dez profissionais do cinema foram o suficiente para obrigar Hollywood inteira a entrar numa competição indigna para mostrar quem era mais anti-comunista, mais conservador, mais nacionalista, ou, numa palavra, mais americano.

Durante os anos cinquenta, o nacionalismo americano tornou-se também sinónimo de militarismo, sexismo, homofobia e apoio incondicional ao conceito de «tropas».

O sonho americano

O actual reaccionarismo da direita estado-unidense é o produto cultural de dois séculos de desenvolvimento de capitalismo. Ao contrário da maioria dos Estados capitalistas desenvolvidos, os EUA nunca abandonaram uma noção de nação que incorpora elementos fascistas. Na verdade, ao longo destes 200 anos, a definição da ideologia americana, ou americanista, foi crescendo, até se transformar, hoje em dia, numa fina película super-estrutural muito semelhante ao fascismo, que filtra a percepção da realidade vivida por milhões de estado-unidenses.

Mais do que mero ersatz da histeria anti-comunista dos anos cinquenta, o nacionalismo estado-unidense mantém-se como um instrumento de luta de classes ao serviço do grande capital e um elemento unificador nacional que se estende da extrema-direita do Partido Republicano ao centro do Partido Democrata.

Na actualidade, a ideologia americanista é um pretexto para justificar o belicismo, a tortura, a espionagem e a repressão policial. Por outro lado, permite manter a opressão económica e social dos afro-americanos, fechar alternativas políticas ao capitalismo bicéfalo e, ao mesmo tempo, convencer os trabalhadores de que no «sonho americano», ao contrário de todos os outros países, é possível enriquecer trabalhando arduamente. Nesta perspectiva individualista, os trabalhadores que não enriquecem devem-se culpar unicamente a si próprios, aos seus genes, à sua inteligência, à sua falta de fé, ou à sua força de vontade, mas nunca ao seu patrão.

Publicado na Revista Vermelho em Setembro de 2015

*António Santos - Nasceu em Lisboa e é Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Nova de Lisboa. Escreve regularmente para várias publicações em Portugal, no Estado espanhol e nos EUA.

Terremoto age sobre construções precárias e deixa centenas de mortes na Itália




Um terremoto de intensidade e duração normais para a região, mas que deixa já 247 de pessoas mortas e um número indeterminado de desaparecidas devido à péssima qualidade as construções e nula adaptação às condições geológicas.

O forte terremoto que abalou o centro da Itália na madrugada da quarta-feira deixou pelo menos 247 mortes, segundo informou Proteção Civil. A zona destruída, entre Lácio e Umbria, é muito turística, e as autoridades italianas não quiseram fornecer dados oficiais sobre pessoas desaparecidas. Contodo, falam em "dezenas", mas sabe-se que só em Pescara já são mais de 100.

As tarefas de resgate continuam e o número de mortes aumentará com total certeza.

As vilas mais afetadas pelo sismo de 6.2 graus são Amatrice, Norcia e Accumoli. O Presidente do primeiro desses municípios, Sergio Pirozzi, explicou: "Amatrice já não existe (...) abalaram edifícios, isto é um drama autêntico. (...) Ouvem-se vozes entre as ruínas, a situação é dramática." 70% das construções abalaram, e unicamente em Amatrice houve mais de 190 mortes.

As fatais consequências do sismo, contodo, não foram devidas a uma duração ou intensidade excepcionais, segundo as e os especialistas, porquanto o movimento registado entra dentro da normalidade na região central italiana. Em vez disso, temos que ir ao capitalismo e ao lucro como prioridade para encontrar como um terremoto normal para essa região europeia pode causar centenares de mortes. Raúl Madariaga, sismólogo entrevistado hoje pela comunicação social e investigador da área geográfica atingida esta madrugada desde 1979, explicou hoje que lá "costuma haver muitos mortos (...) porque no centro da Itália encontramos edifícios muito velhos e de péssima qualidade. São construções que nunca foram pensadas para resistir terremotos".

Em vez de agir sobre essa realidade através de intervenções urbanísticas sobre os prédios em perigo - apesar das frequentes tragedias, a última em L'Aquila em 2009, com mais de 300 pessoas mortas -, o capital, como é sabido, escolhe quem sobrevive e quem morre através de processos como a gentrificação.

O Primeiro Ministro italiano, Matteo Renzi garantiu ontem "que não deixaremos qualquer família sozinha, e qualquer município à sua sorte". No entanto, a última vez que a zona sofreu um fenómeno parecido, em 2009 em L'Aquila, o estado burguês italiano - com Silvio Berlusconi à cabeça - fez exatamento o contrário.

Diário Liberdade - com informações de Vilaweb e mais

O EURO E AS MENTIRAS



Jacques Sapir

Este texto é retirado do livro, L'Euro contre la France, l'Euro contre l'Europe, que será publicado em meados de setembro nas edições CERF.

É preciso voltar às origens do Euro. O Euro foi apresentado como uma grande promessa que se transformou numa grande mentira. O discurso a favor do Euro fundamentava-se alegadamente em bases científicas. Vamos então verificar o que na realidade ele é.

Os falsos profetas

Tal como os reis magos dos Evangelhos, as três principais contribuições, as de Robert Mundell, R. McKinnon e Peter Kennen, vieram trazer a 'boa nova” da União Monetária. Os seus trabalhos tiveram uma influência considerável sobre outros economistas convencendo-os que a flexibilidade da taxa de câmbio passava a ser supérflua. Os estudos recentes mostram claramente o oposto.

A teoria das zonas monetárias ótimas foi enunciada pelo economista Robert Mundell em 1961 [1] . Ele pretendia estabelecer razões teóricas para a existência de áreas onde seria vantajoso ter uma moeda única. Allan Robert McKinnon trouxe os fundamentos a este edifício [2] , explicando que quanto mais importante for a abertura de uma economia ao exterior, mais se reduz a importância da taxa de câmbio. Peter Kennen [3] , mostrava que, se a economia de um país era diversificada, essa diversificação reduzia amplitude do que os economistas chamam "choques exógenos" permitindo que esse país estivesse ligado a outros por uma taxa de câmbio fixa. Destes trabalhos, poderia então deduzir-se que um país tem interesse ligar-se a outros através de uma moeda única desde que capital e trabalho fossem perfeitamente flexíveis (o que mostrava Mundell), que o país estivesse bastante aberto ao comércio internacional (McKinnon) e que a sua economia fosse amplamente diversificaram (Kennen).

Outros economistas pretenderam demonstrar que os países tirariam vantagens económicas significativas de uma moeda única, que supostamente faria crescer a produção, como pretendia demonstrar Andrew K. Rose [4] Os seus trabalhos deram origem a uma literatura extremamente favorável a uniões monetárias, descrevendo as moedas nacionais como "barreiras" para o comércio [5] A integração monetária conduziria a um aumento acentuado da produção e do potencial de trocas comerciais internacionais [6] . Assim a União Monetária Europeia iria criar condições para o sucesso de uma "zona monetária ótima” [7] num movimento que parecia dever ser endógeno [8] . Donde as famosas e imprudentes declarações de diversos políticos, alegando que o Euro iria conduzir, pela sua própria existência, a um forte crescimento. Assim, Jacques Delors e Romano Prodi, disseram que o Euro faria aumentar o crescimento europeu em mais 1% a 1,5% ao ano durante vários anos [9] . Foram muito maus profetas.

As armas da crítica 

Outras pesquisas, baseadas em dados mais completos e mais rigorosos, reduziram drasticamente os efeitos positivos da união monetária [10] . Os trabalhos de Rose e parceiros foram fortemente criticados devido ao método econométrico utilizado [11] . Uma crítica fundamental era que estes modelos não levavam em conta a resiliência do comércio internacional [12] . Harry Kelejian retomou as estimativas dos efeitos da união monetária sobre o comércio dos Estados-membros [13] . Os resultados são devastadores. O impacto econômico da união económica e monetária no crescimento de comércio é estimado entre 4,7% e 6,3%, ou seja muito longe das estimativas mais pessimistas de trabalhos anteriores que colocavam estes efeitos em 20%, e isto sem mesmo mencionar as primeiras análises de Rose que os situavam entre 200% e 300%. Em dez anos, o efeito foi reduzido de 10 para 1 (de 200% para 20%) [14]e, em seguida, uma nova redução trouxe esses efeitos para uma média de 5% (um fator de 4 para 1) [15] . Os efeitos positivos de uma união monetária foram, portanto, amplamente exagerados, obviamente por razões políticas. Os mais extravagantes anúncios sobre os efeitos positivos da união económica e monetária foram feitos precisamente no momento da introdução do Euro. A mentira era efetivamente enorme.

A importância da taxa de câmbio

No entanto, os mesmos argumentos são agora usados para difundir a ideia de que uma dissolução do Euro seria uma catástrofe, porque utilizam para fins de propaganda, os mesmos números, mas desta vez de forma inversa para "prever" um colapso do comércio internacional dos países em causa e, portanto, uma queda do PIB no caso de uma saída do Euro. Ora, se o efeito sobre o comércio internacional, produzido por uma zona monetária é baixo, é necessário deduzir-se que inversamente o efeito dos preços (o chamado "custo competitividade") é muito mais importante do que diz o discurso dominante [16] . O que volta a dar toda a importância às desvalorizações para restabelecer a competitividade de certos países.

O impacto da taxa de câmbio sobre os saldos comerciais era conhecido. A velocidade da 'recuperação' na Rússia em 1999 e 2000 em particular, como resultado de uma desvalorização maciça, foi um dos principais argumentos neste sentido. Os economistas do FMI realizaram um estudo bastante sistemático em mais de 50 países [17] não encontrando nenhum sinal da tão citada famosa "desconexão" entre os fluxos de comércio internacional e taxas de câmbio. O estudo mostra que, em média, para uma depreciação da taxa de câmbio de 10%, podemos obter um ganho de 1,5% do PIB. A internacionalização das "cadeias de valor" tem certamente um efeito moderador sobre estes ganhos [18] , mas o desenvolvimento destes é progressivo e não pode de nenhuma maneira contrariar os efeitos positivos de uma forte depreciação da taxa de câmbio [19] , o que é reforçado por um estudo recente do FMI[20] .

O Euro foi portanto vendido às populações (e aos eleitores) com base em repetidas mentiras, mentiras revestidas de um discurso que se pretendia científico, mas que de forma alguma o era. Os economistas, que apoiam o Euro raciocinam como se estivessem necessariamente reunidas as condições para a materialização dos potenciais benefícios que proclamavam e como se as vantagens potenciais do Euro devessem sempre superar as desvantagens. É aí que se situa a sua responsabilidade. Nisso eles foram portadores de uma 'boa nova', que demonstrou ser, para os povos, um verdadeiro pesadelo.

Notas 
[1] Mundell R., (1961), " A theory of optimum currency areas ", The American Economic Review , vol. 51, n°5, 1961, pp. 657-665. 
[2] McKinnon R.I., (1963), " Optimum Currency Area ", The American Economic Review , Vol. 53, No. 4 (Sep., 1963), pp. 717-725
[3] Kenen, P.B. (1969). "The Theory of Optimum Currency Areas: An Eclectic View" Mundell R.A. et A.K. Swoboda (edits) Monetary Problems of the International Economy , Chicago, Ill., Chicago University Press.
[4] Rose, A.K. (2000), " One money, one market: the effect of common currencies on trade ", Economic Policy Vol. 30, pp.7-45 et Rose, Andrew K., (2001), "Currency unions and trade: the effect is large," Economic Policy Vol. 33, 449-461.
[5] Rose, A.K., Wincoop, E. van (2001), " National money as a barrier to international trade: the real case for currency union ", American Economic Review , Vol. 91, n°2/2001, pp. 386-390.
[6] De Grauwe, P. (2003), Economics of Monetary Union, New York: Oxford University Press. Frankel, J.A., Rose A.K. (2002), " An estimate of the effect of currency unions on trade and output ", Quarterly Journal of Economics , Vol. 108, n°441, pp. 1009-25.
[7] Consultar sobre este assunto Master 2 , Laurentjoye T., (2013), La théorie des zones monétaires optimales à l'épreuve de la crise de la zone euro , Formation " Économie des Institutions ", EHESS, Paris, septembre 2013.
[8] Frankel, J.A., Rose A.K. (1998), " The endogeneity of the optimum currency area criteria ", Economic Journal, Vol.108, 449, pp.1009-1025. De Grauwe, P., Mongelli, F.P. (2005), "Endogeneities of optimum currency areas. What brings countries sharing a single currency closer together? ", Working Paper Series, 468, European Central Bank, Francfort.
[9] Sapir J. (2012), Faut-il sortir de l'Euro? , Le Seuil, Paris.
[10] Bun, M., Klaasen, F. (2007), "The euro effect on trade is not as large as commonly thought", Oxford bulletin of economics and statistics , Vol. 69: 473-496. Berger, H., Nitsch, V. (2008), " Zooming out: the trade effect of the euro in historical perspective ", Journal of International money and finance , Vol. 27 (8): 1244-1260.
[11] Persson T. (2001), " Currency Unions and Trade : How Large is the Treatment Effect ? " in Economic Policy , n°33, pp. 435-448 ; Nitsch V. (2002), " Honey I Shrunk the Currency Union Effect on Trade ", World Economy , Vol. 25, n° 4, pp. 457-474.
[12] Greenaway, D., Kneller, R. (2007), " Firm hetrogeneity, exporting and foreign direct investment ", Economic Journal , 117, pp.134-161.
[13] Kelejian, H. & al. (2011), " In the neighbourhood : the trade effects of the euro in a spatial framework ", Bank of Greece Working Papers , 136
[14] Do trabalho incial de A.K. Rose datanto de 2000 mas realizado entre 1997 e 1999 " One money, one market: the effect of common currencies on trade ",Economic Policy 30, op.cit., au travail de R. Glick et A.K. Rose, datant de 2002, " Does a Currency Union Affects Trade ? The Time Series Evidence ", op. cit..
[15] Bun, M., Klaasen, F. (2007), " The euro effect on trade is not as large as commonly thought", Oxford bulletin of economics and statistics , op.cit., estiment l'effet " positif " de l'UEM à 3%, o que o coloca largamente no interval de erros deste género de estimativas
[16] É além disso o sentido de uma nota redigida por P. Artus, " C'est la compétitivité-coût qui devient la variable essentielle ", Flash-Économie , Natixis, n°596, 30 août 2013.
[17] Leigh, D, W Lian, M Poplawski-Ribeiro et V Tsyrennikov (2015), "Exchange rates and trade flows: disconnected?", Chapitre 3 in World Economic Outlook, IMF, Octobre 2015.
[18] Ahmed, S, M Appendino, and M Ruta, "Depreciations without Exports? Global Value Chains and the Exchange Rate Elasticity of Exports," World Bank Policy Research Working Paper 7390, World Bank, Washington DC, 2015.
[19] Ver Johnson, R C, and G Noguera, "Fragmentation and Trade in Value Added over Four Decades." NBER Working Paper n°18186, Harvard, NBER, 2012 et Duval, R, K Cheng, K. Hwa Oh, R. Saraf, and D. Seneviratne, "Trade Integration and Business Cycle Synchronization: A Reappraisal with Focus on Asia," IMF Working Paper n° 14/52, International Monetary Fund, Washington DC, 2014.
[20] IMF/FMI, 2016 External Sector Report, Wahington D.C., 27 julho de 2016, www.imf.org/external/pp/ppindex.aspx . 


O original encontra-se em russeurope.hypotheses.org/5157

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

A INCAPACIDADE DOS PODERES PÚBLICOS PORTUGUESES



A incapacidade dos poderes públicos em Portugal é terrífica. Todos os anos há o mesmo drama dos incêndios florestais, mas eles nada fazem para preveni-los. Não cabe aos bombeiros fazerem prevenção – eles existem para apagar fogos, não para fazer prevenção. 

A responsabilidade primária pela prevenção cabe ao Ministério da Agricultura, que dorme. 

Não é indispensável ter um cadastro rural actualizado para limpar o lixo que se acumula nas florestas. Se os seus proprietários são absenteístas, os poderes públicos devem intervir e providenciar a limpeza. 

Victor Louro, técnico do MA, já demonstrou que isso era possível, em coordenação com a GNR e as autarquias. 

Há medidas factíveis para resolver esse problema grave. Já em 2005 resistir.info mostrou como isso poderia ser feito (ver Como evitar incêndios florestais e produzir energia ). 

Mas os lastimáveis governos portugueses só cuidam da pequena política, tanto faz serem do PSD ou do PS.

Resistir.info

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