terça-feira, 7 de março de 2017

MUNDO SÓ DE ALGUNS E PESADELO DE QUASE TODOS


Expresso Curto à tarde que saiu da “máquina” logo pela manhã, tirado por Cristina Figueiredo, lá do burgo do tio Bildberg Balsemão, que é uma seita que se reúne para se governarem uns quantos que têm por missão desgovernar a maioria. Democráticos, dizem-se eles. Pois. Então está bem.

Que o mundo gira num giro incessante. Coisa beatliana e rebuscada pela jornalista que nos tirou este curto (que é comprido). Pois. O mundo gira mas não está nada giro. Está todo contaminado por uma espécie a que chamam Um Por Cento. Com um nome tão feioso não podemos dali esperar coisas boas. Aliás, até parece nome de caneiro. Os tipos reinem-se e passado uns tempos há merda por todo o lado – menos no lado dos tipos porque aí é só ouro e mel. Tudo do melhor à conta dos que são empurrados para o pior. A lenga-lenga já está assim para durar há séculos. Democratas. Dizem-se eles. Pois.

Sobre o que está para trás estamos conversados. Nada de novo. Só aqui consta porque há cabeças-duras que ainda não equacionaram que assim é, nem vêem carneiro quando se miram ao espelho. Assim, lendo, ou ficam escamados mas passam a equacionar a “coisa” secretamente, ou equacionam num vaipe e passam a mudar de atitudes malignas, estúpidas. Pois. A esperança é sempre a última a morrer.

A morrer está esta abertura para o Curto tardio de hoje (quase sempre). Pronto. Finou-se. É cadáver. Passem já à cafeína servida pela jornalista de serviço, de sua graça Cristina. Pois.

Lembramos que se não viram façam força para ver o tal “Assalto ao Castelo”, têm tudo servido já mais em baixo. Assim é mais fácil para depois fazerem o desenho na parede. Até pode ser que entendam quanto não valem neste mundo que gira mas que não é nada giro. Mundo de uns e pesadelo de quase todos. Vá ler. (MM / PG)

O mundo gira, gira, gira. Mas não sai do mesmo sítio

Cristina Figueiredo - Expresso

Se os dias tivessem banda sonora o de hoje começava com “The fool on the hill”, dos Beatles, mais exatamente com a espiral quase no fim que nos transporta auditivamente para um mundo a girar, a girar, a girar, sem parar, sem sair do mesmo sítio. Assim é Portugal por estes dias. A magnífica reportagem de Pedro Coelho, da SIC, “Assalto ao Castelo” (três episódios que pode rever aquiaqui, e aqui), veio ressucitar a polémica (que já se julgava morta e enterrada) sobre as responsabilidades do Banco de Portugal na previsão (e porventura prevenção) do colapso do BES. Carlos Costa, o governador, é que não gostou do que viu e, no dia seguinte à transmissão da última parte da reportagem (não se sabe se antes ou depois de ter ido ao Palácio de Belém falar com o Presidente da República), telefonou à presidente da comissão parlamentar de Orçamento e Finanças a oferecer-se para ir à Assembleia da República "repor a verdade dos factos e prestar os esclarecimentos" que, segundo ele, “as reportagens deliberadamente ignoraram”. O primeiro-ministro, sorridente, acha que é uma pretensão “saudável” e “excelente”. Até esta hora a audição ainda não estava marcada.


Mas não é só o passado recente que atormenta o governador. O presente também não está grande coisa. Continua o seu braço de ferro com o Governo, a propósito da lista de nomes para a administração da instutuição,com o Público a dar conta que o BdP já só tem cinco administradores em funções, depois do vice-governador, José Ramalho, ter pedido para sair já e não ficar à espera do seu substituto.


Com todas as atenções de novo no governador do BdP - a avaliar pela opinião do Expresso Diário de ontem, com Carlos Costa a ser o tema principal da análise de Nicolau Santos (“As sete falhas do governador”), Henrique Monteiro (“O assalto ao (Costa do) Castelo”) e Daniel Oliveira (“Costa tem de se demitir”) - não é 100% certo que ainda sobre alguma para prestar ao assunto que, ainda há apenas dois ou três dias, ocupava páginas inteiras de notícias e opiniões: os milhões de euros transferidos para offshores entre 2011 e 2014. A diretora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, Helena Borges, é ouvida hoje às 15h00) na Comissão Parlamentar de Finanças, encerrando a série de audições, encetada na semana passada, a responsáveis da AT sobre a falta de controlo dessas transferências. A Comissão vai ainda discutir e votar o requerimento do PS para chamar também, com caráter de urgência, os ex- ministros das Finanças, Maria Luís Albuquerque e Vítor Gaspar. A agenda dos deputados desta comissão está ficar apertada.

Atirado para o fundo da gaveta desde que estalou a polémica à volta dos offshores está o dossiê CGD. E assim deve ficar até à posse da nova comissão ao caso (marcada para dia 14), que se vai debruçar apenas sobre as condições da contratação e as circunstâncias da demissão do anterior presidente do conselho de administração do banco público. E aí, o mais provável, é que tudo volte ao princípio:com os sms de Mário Centeno e António Domingues de novo a fazerem títulos, Carlos Costa a aproveitar as tréguas para ganhar fôlego para o próximo round, e a investigação ao erro-informático-da-Autoridade-Tributária-que-pode-ter-dedo-humano no caso dos offshores provisoriamente em stand by. “And the eyes in his head see the world spinning round”. O mundo gira, gira, gira sem parar. Mas não sai do mesmo sítio.

TRUMPOLITICS

Sempre que o meu telemóvel recebe uma notificação do New York Times ou do Washington Post (e recebe várias diariamente, embora ambos os jornais sejam bastante criteriosos no envio dos alertas), a pergunta surge, automática: o que é que ele fez agora? “Ele” é, claro, Donald Trump, “o indivíduo menos qualificado, temperal ou intelectualmente, que já ocupou a Casa Branca” - e não sou eu que o digo mas o prestigiado Paul Krugman num artigo de opinião publicado ontem no New York Times (que não versa apenas o chefe de Estado, mas todo o Partido Republicano) que vale a pena ler. Só para abrir o apetite: o economista começa por se referir a um artigo da revista Politico onde é citada uma fonte a quem o Presidente desabafou “estar cansado que toda a gente pense que a sua presidência está ‘lixada’” (a tradução é minha, admito que possa haver outro verbo mais adequado a exprimir exatamente o que Krugman quer dizer). Conselho do prémio Nobel para Trump combater o que por cá se chamaria um “erro de percepção”: “A melhor maneira de combater a ideia de que se está a ‘lixar’ as coisas é, you know, parar de as ‘lixar’”. Não estou muito certa que o conselho vá ser seguido.

Só nas últimas horas o que anda Trump a lix.., perdão, a fazer?

Além de a sua administração estar a esforçar-se para provar que são verdadeiras as acusações (já negadas pelo diretor do FBI) de que Barack Obama teria ordenado escutas a Donald Trump, o Presidente fez uma nova versão do decreto anti-imigração - rejeitado em fevereiro pelos tribunais. Desta vez aplica-se a cidadãos de ‘apenas’ seis países islâmicos. O Iraque fica de fora da proibição. Claro que permanecem todas a dúvidas sobre a legalidade da nova proposta.

Entretanto, parece que é para levar a sério a intenção de separar mães e filhos que tentem atravessar ilegalmente a fronteira do México para os EUA. Segundo o secretário de Trump para a Segurança Interna, John Kelly, a ideia é precisamente essa. Para "travar mais movimentos desta rede terrivelmente perigosa", explicou.

O porta-voz dos republicanos no congresso norte-americano, Paul Ryan, revelou ontem o aguardado projeto de assistência médica que se pretenda substitua o Obamacare. A proposta dos republicanos prevê a substituição os subsídios federais por uma nova forma de créditos fiscais individuais. As primeiras leituras confirmam o que se esperava: a ser aprovado é o desmantelamento da mais importante reforma social nos EUA nas últimas décadas. Pode ler sobre o assunto, aquiaqui aqui.

Percebe-se que haja norte-americanos com vontade de emigrar. E que alguns, como o músico (natural do Ohio) Mark Kozelek, aka Sun Kil Moon, até cantem, como conta a Mariana Lima Cunha, num artigo publicado no Expresso Diário de ontem: “Se temos de viver com um Presidente que é um enorme idiota, então acredita em mim, querida, vou comprar uma casa no Porto”.

O jornal online Eco faz um resumo de como as políticas deTrump e os sensíveis mercados não parecem estar a dar-se bem.

OUTRAS NOTÍCIAS POR CÁ 

O ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, enfrenta uma ameaça séria por parte dos profissionais do setor. Os dois sindicatos médicos uniram-se à Ordem e convocarm um plenário para sexta-feira de onde poderá sair uma ação conjunta de protesto contra o esquema de pagamento de horas extraordinárias definido na semana passada pelo diploma da execução orçamental.

Às 9h30 é retomado, no Juízo Central Criminal, em Lisboa, o julgamento do processo "vistos gold", que tem por arguidos, além de Miguel Macedo, antigo ministro da Administração Interna, o ex-presidente do Instituto de Registos e Notariado (IRN) António Figueiredo, o ex-diretor nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Manuel Jarmela Palos, a ex-secretária-geral do Ministério da Justiça Maria Antónia Anes, três empresários chineses e um angolano, bem como o empresário da indústria farmacêutica Paulo Lallanda de Castro e dois funcionários do IRN. Em causa estão acusações de corrupção ativa e passiva, recebimento indevido de vantagem, prevaricação, peculato de uso, abuso de poder e tráfico de influência.

Às 14:30 a ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, presta contas ao Parlamento. É uma audição ordinária, mas que conta - a pedido do PSD - com a inclusão de um ponto autónomo inicial sobre o desaparecimento de cerca de 50 armas do depósito da Direção Nacional da PSP (requerimento do grupo parlamentar do PSD);

Também o ministro do Ensino Superior vai à Assembleia da República. Manuel Heitor, que ainda ontem apelou às empresas de bebidas alcólicas que deixem de patrocinar as festas académicas, deverá voltar ao tema das praxes.

A RTP cumpre hoje 60 anos. A efeméride foi assinalada ontem, ao final da tarde, com o lançamento da página na internet dos Arquivos da RTP, que contém programas exibidos e informação (acessíveis através de uma simples pesquisa) sob os mais diversos formatos (imagens, audios, fotos, textos). Numa fase inicial estarão disponíveis ‘apenas’ 6500 itens, mas a ideia é ter rapidamente disponível online todo o acervo de conteúdos audiovisuais da estação pública, desde os anos 30 do século passado até à atualidade. E se não viu em real time ainda vai a tempo de recuperar nas gravações automáticas o documentário que passou ontem à noite, no canal 1, sobre “Seis décadas de televisão”. O Diário de Notícias faz um retrato de Portugal em 1957.

Vivemos tempos... esquisitos, para usar um adjetivo assético que dê liberdade ao leitor para julgar como bem entender a notícia de que uma palestra de Jaime Nogueira Pinto, convidado para falar sobre o Brexit, Trump e Le Pen na Universidade Nova, foi cancelada devido a ameaças de violência. Agora que já terá feito o seu juízo, caro leitor, permita-me que lhe deixe o meu: julgava a nossa democracia bem apetrechada contra a superioridade moral (facilmente confundível com censura) que se vem vendo noutros países. Ingenuidade minha: afinal, corremos exatamente os mesmos perigos.

O Tribunal da Relação de Lisboa ordenou a recolha dos exemplares à venda do livro de José António Saraiva, “Eu e os políticos”, na sequência de uma providência cautelar apresentada pela jornalista Fernanda Câncio,que considera que dois parágrafos da obra são “uma invasão da sua vida privada” e constituem “um ilícito civil e criminal”.

E OUTRAS NOTÍCIAS LÁ FORA

Em França, as presidenciais continuam a dar que falar, após a desistência de Alain Juppé. François Fillon é que não desiste. E Marine Le Pen - poderá mesmo ter de ir a tribunal, acusada por desvios de verbas do Parlamento Europeu, após este lhe ter levantado a imunidade parlamentar em que a eurodeputada se refugiava até aqui - continua à frente nas sondagens, beneficiando da crise na direita francesa. A sua eleição seria, perspetiva Teresa de Sousa, “um míssil no porta-aviões” que é a França para o conjunto da Europa.

E foi de Europa que se falou ontem em Versailles, onde o ainda Presidente francês François Hollande recebeu os líderes dos maiores países da União Europeia (sem Reino Unido), para prepararem a cimeira que vai assinalar os 60 anos do Tratado de Roma, a 25 de março. França, Alemanha, Itália e França querem - ninguém se surpreende - uma Europa a várias velocidades.

A chanceler alemã Angela Merkel considerou “injustificáveis” as declarações do presidente turco Erdogan acerca do nazismo, num ambiente de crescente tensão diplomática entre os dois países. Erdogan falou depois de terem sido canceladas manifestações de apoio (em território alemão) ao seu governo: “Pensava que o nazismo tinha acabado na Alemanha. Afinal, parece que continua. É evidente que continua”, disse.

O El Pais faz meia manchete (a outra meia é com o novo decreto de Trump para a imigração) com "o método do Podemos para intimidar a imprensa", dando conta da onda de insultos a jornalistas por "hordas de trolls" nas redes sociais por parte do partido de Pablo Iglesias que mereceram denúncia e repúdio (ontem, em comunicado) da Associação de Imprensa Madrilena. PP, PSOE e Ciudadanos solidrizaram-se. Os djirigentes do Podemos rejeitam as acusações.

Ainda a morte de Kim Jong-nam, o meio irmão do líder da Coreia do Norte. A Malásia, em retaliação por a Coreia do Norte ter proibido os cidadãos malaios de deixarem o país, também proibiu todos os cidadãos norte-coreanos de deixarem a Malásia. O primeiro-ministro malaio acusa a Coreia de Norte de estar a violar a lei internacional e a fazer reféns os seus cidadãos.

The Economist discorda de Bill Gates que, em entrevista recente, propôs pôr os robots a pagarem impostos que seriam usados para qualificar trabalhadores e expandir o emprego em setores como a Saúde ou a Educação. A revista contrargumenta, por exemplo, que um imposto que reduza o uso de máquinas no sistema de saúde e, portanto, mantenha os custos médicos a aumentar rapidamente poderia prejudicar tantos trabalhadores quantos ajudaria. A discussão só agora começou.

Uma ameaça de que temos consciência há muito, perigosamente à beira de se tornar real: pode já ser demasiado tarde para estancar o degelo do Ártico.

AS MANCHETES DOS DIÁRIOS DE HOJE

"Árbitros 35 agressões desde o início da época", Jornal de Notícias
"Venda do Novo Banco à Lone Star já só espera pela decisão do BCE", Público
"Bolsas de estudo vão passar a durar três anos", Diário de Notícias
"Antiga dirigente histórica do PCP acredita que Nossa Senhora de Fátima irá converter a Rússia", jornal i

"Função pública não recebe retroativos", Jornal de Negócios

O QUE ANDO A LER E A OUVIR


Veio-me parar às mãos, no meio de arrumações, e reli de um fôlego “The importance of being earnest” - em português, com substancial perda de informação na tradução, “A importância de se chamar Ernesto”-, de Oscar Wilde. O matrimónio, tema central desta peça de teatro, um dos textos mais populares de Wilde, é pretexto para uma mordaz crítica aos costumes (i.e., à hipocrisia reinante) da alta sociedade londrina de finais do século XIX. Apesar do contexto histórico, e como acontece com todos os clássicos, continua atual. Não resisto a partilhar este excerto (dedicado aos deputados da Comissão Parlamentar de Inquérito à CGD, temporariamente com algum tempo livre para leituras ociosas), onde fica provado que certas discussões são quase tão velhas como a sé de Braga (bem anteriores, portanto, à época dos emails e SMS):

Jack: It is very impolite to read a private cigarette case.
Algernon: Oh! It is ridiculous to have rules about what one should read and what one shouldn't. Most modern culture depends on reading what one shouldn't read.

Por dever de ofício, mas com inesperado prazer, acabei de ler “Políticos.pt - guia prático das remunerações de altos cargos políticos”, de José Magalhães, à venda a partir de dia 10. Uma obra corajosa, sobre a qual já escrevi na última edição do Expresso, que põe um dedo numa ferida aberta - os vencimentos dos políticos em Portugal -, sugerindo que se encare o problema de frente, se acabe com a “favela legislativa confusa e opaca” que rege o setor e, enfim, se remunere “decentemente” quem, de facto, trabalha, acabando entretanto com “mordomias injustificáveis”. Sob pena de, se se continuar a escamotear o problema, a política - enquanto atividade profissional exclusiva - só ser opção “para ricos, loucos ou santos”. Uma boa leitura para ajudar ao nunca acabado (se calhar porque nunca iniciado a sério) debate sobre as razões porque há um fosso crescente entre eleitores e eleitos.

No espaço de uma semana assisti a três magníficos concertos, com o nada despiciendo pormenor em comum de se tratar de músicos portugueses: Os quatro e meia, uma promissora banda de Coimbra que só agora está a ultimar o primeiro álbum (com estreia aprazada para maio), seis músicos orgulhosos das suas raízes tradicionais (com uma pitada q.b. de tuna académica) e muito divertidos em palco; o já consagrado António Zambujo a cantar Chico Buarque (acompanhado de Marcello Gonçalves na viola de sete cordas) - confesso que estranhei a primeira vez que ouvi o álbum (composto, na quase totalidade, por canções que há muito nos habituámos a escutar na inconfundível voz de Chico), mas depois “entranhei” e ao vivo, então, é de encher a alma; por último, Salvador Sobral (acompanhado pelo grande Júlio Resende ao piano), que, numa injustiça que (estou em crer) o tempo se encarregará brevemente de corrigir, a maioria só conhecerá por ter vencido o último festival da canção (anteontem) interpretando um tema da sua igualmente talentosa irmã Luísa Sobral. Só me ocorre dizer: que boa música se está a fazer em Portugal!

E termino, que este Expresso, para Curto, já vai demasiado longo. Se fosse o bem-humorado Algernon, um dos “Ernestos” de Wilde, teria esperança e faria votos que este venha a ser “a fine day”. Já o pessimista Lane (o criado de Algernon) diria: “It never is, sir”. Para saber quem tem razão em ser como é, o melhor é ir seguindo a atualidade no site do Expresso e, às 18h, no Expresso Diário.

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