Carlos Ademar –
Jornal Tornado, editorial
Também
a morte deste homem passou muito ao lado das televisões e jornais, sempre tão
ávidos de sangue. Não é por nada, mas parece que está em causa um banco e
quando assim é, tudo pára, até o ardente e permanente desejo de chocar os
espectadores ou leitores.
Não
há acidente de que resultem feridos ou mortos que não faça as delícias destes
vampiros; não há acidentes com crianças que não façam crescer os caninos destes
sanguinários; não há morte ocasional ou propositada que não faça despertar
estas hienas da informação.
Mas
este caso é diferente. Podem estar em causa os altos interesses de um banco,
logo, o conluio nacional dos meios de informação está estabelecido e aqui o
sangue, que tem a mesma cor e o mesmo cheiro, já não interessa.
Caraças,
fosse um bebé que caísse de um 6º andar, um alcoólico atropelado, um homem
assassinado num bar e teríamos os estagiários de todos os vampirescos órgãos de
informação a correr para os locais a fazer directos e nestes, as perguntas mais
disparatadas que alguém pode ouvir, só para ocupar a antena porque o share está
a subir e há que o manter o maior número de minutos que for possível.
Mas
quando pode estar em causa um banco e a sua gestão na morte a tiro de um
funcionário na própria sede desse banco, aí é preciso travar a fundo. Os
estagiários têm mais que fazer e se não têm que inventem. Não se pode alimentar
o ódio que o povo já sente por este sistema, em que os homens são cifrões
enquanto rendem ou fusíveis quando é hora de os substituir por outros a
ganharem metade.
Afinal,
a essas hienas sanguinolentas nem todo o sangue interessa. O que é produzido
pelo acaso, pelo descuido, pelo crime, por vontade própria, desde que choque e
cheire, sem pôr certos interesses em causa, tudo bem e há que investir; quando
o mesmo sangue é derramado em instalações de um banco devido ao tratamento
maquinal a que são submetidos os trabalhadores bem como às chantagens e
pressões que limitam os horizontes de quem as sofre, ao ponto de não verem
outra solução senão a morte, este sangue não interessa.
Chamam-lhe
assédio moral… puta que os pariu. Chantagem pura de quem tudo pode contra quem
não tem quem o defenda.
O
sistema reage porque está montado em cartel de interesses de todos quantos
cuidam da informação a que podemos ter acesso. O verdadeiro serviço de censura
dos tempos modernos, que tal como a de outros tempos servia e defendia um
sistema.
Só
que então podíamos responsabilizar a ditadura, e agora? A culpa é de quem? Não
sei, mas de uma coisa tenho a certeza, os interesses de quem manda nas hienas
informativas coincidem com os dos donos do banco onde se deu a tragédia que é
preciso silenciar.
Grita
o chefe de redacção para a redacção depois de pousar o auscultador do telefone:
«Um homem matou-se com um tiro na cabeça no gabinete de um chefão do BPI. Este
foi dos que não aguentou, azar o dele e não é notícia.»
E
não foi.
- Notícia
relacionada com o suicídio: Funcionário do BPI suicida-se em edifício do banco em Lisboa
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