quinta-feira, 23 de junho de 2022

Angola | O VENCEDOR LEVA TUDO MENOS VIGARISTAS – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Políticos vigaristas são aqueles que apostam as fichas todas na falta de memória do eleitorado, para melhor poderem enganar apoiantes e votantes. Políticos honestos são os que nunca se cansam de proclamar que a memória do Povo Angolano tem futuro. Sem memória, nem o presente conseguimos compreender. Sempre que somos convocados a votar não podemos esquecer como tudo começou. Até 1991, tínhamos uma democracia popular e o socialismo. Depois partimos para a democracia representativa e a economia de mercado (capitalismo). Uma mudança pacífica, chancelada pelos eleitores nas primeiras eleições multipartidárias, que o MPLA venceu com maioria absoluta. 

O partido vencedor bateu a concorrência, quando a propaganda hostil garantia que seria esmagado pela UNITA e pelo partido que congregava os golpistas de 27 de Maio de 1977 e uns restos da Revolta Activa, o PRD, enfeitado com a figura do padre Joaquim Pinto de Andrade. Se os propagandistas tivessem memória, sabiam que os padres na política são autênticos desastres. E os povos de todo o mundo odeiam traidores e assassinos. Como ficará comprovado no dia 24 de Agosto. 

O candidato número um do MPLA, Marcolino Moco, foi indigitado primeiro-ministro e de imediato anunciou que ia fazer Governo com membros de todos os partidos que elegeram deputados. Se hoje um político recalcitrante no falhanço e na derrota, disser que o vendedor de eleições passadas leva tudo (the winner takes all) é vigarista e está a mentir. Coloca as fichas todas, até a da honra, na falta de memória das massas. Nesse primeiro Governo ficaram reservadas pastas ministeriais e secretarias de Estado à UNITA, o maior partido da Oposição. Mas Jonas Savimbi não deixou e mobilizou os seus sicários para a guerra.

O partido dos golpistas de 27 de Maio de 1977 e uns restos da Revolta Activa, o Partido da Renovação Democrática (PRD) elegeu apenas um deputado. Mesmo assim, indicou um secretário de Estado para o Governo de unidade nacional. Ninguém ficou de fora. Ninguém foi ao tapete. Todos ganharam ainda que o MPLA tenha ganho mais do que os outros todos juntos. A UNITA lançou então o grito da fraude. Mas naquelas eleições o jogo foi arbitrado pela ONU e pela Troika de Observadores, constituída por Portugal, Rússia e EUA. Os jogadores não podiam interferir no trabalho dos árbitros. A UNITA violou gravemente as regras e interferiu.

Os pequenos partidos, com excepção do PLD, foram ao Huambo, ajoelharam aos pés de Jonas Savimbi, beijaram-lhe a mão e fizeram coro com a UNITA: Fraude, fraude, fraude. Os golpistas do 27 de Maio der 1977 e restos da Revolta Activa, representados por Justino Pinto de Andrade, foram os que mais se destacaram na gritaria e no rastejar aos pés de Jonas Savimbi. Depois receberam uma lição de mau comportamento do sul-africano Sean Cleary, oficial dos serviços secretos do regime de apartheid e nessa época o conselheiro especial do líder da UNITA.

Nunca é demais lembrar esses históricos resultados eleitorais: MPLA 129 eleitos, UNITA 70, Partido Renovador Social 6,  FNLA 5, Partido Liberal Democrático (PLD) 3, Partido Renovador Democrático (PRD), Partido da Aliança Juventude Operários e Camponeses de Angola (PAJOCA), Partido Democrático para o Progresso / Aliança Nacional Angolana (PDP-ANA), Partido Nacional Democrático de Angola (PNDA), Fórum Democrático Angolano (FDA), Partido Social Democrata (PSD) e Coligação Angola Democrática (AD) elegeriam um deputado cada. O Partido Angolano Independente (PAI), o Partido Democrático Liberal Angolano (PDLA), o Partido Social Democrático Angolano (PSDA), o Partido Reformador Angolano (PRA), a Convenção Nacional Democrática de Angola (CNDA) e o Partido Democrático Angolano (PDA) não elegeram deputados. Mesmo assim, o vigarista do PAI foi nomeado embaixador!

O Governo tomou posse e a rebelião de Savimbi destruía, matava quem lhe aparecia pela frente, ocupava militarmente várias províncias. Começou então um longo período de negociações com vista à paz e que culminaram com o Governo de Unidade e Reconciliação Nacional. Ele já existia, mas nesta versão recebeu ministros, secretários de Estado, embaixadores, governadores e administradores da UNITA. Savimbi ficava como vice-presidente da República. Preferiu continuar a destruir e a matar angolanas e angolanos. Em 2008, os partidos da Oposição exigiram eleições e abandonaram o executivo. Alguém os convenceu de que estava na hora de derrubar o MPLA. 

Nessas eleições, o partido dos golpistas, PRD, foi sozinho. Os restos da Revolta Activa e antigos maoistas concorreram com a Frente para a Democracia (FpD). O chefe era Justino Pinto de Andrade, o subchefe Filomeno Vieira Lopes e Fernando Pacheco o ideólogo. Resultados: MPLA 81,64 por cento, UNITA 10,39, PRS 3,17, Nova Democracia 1,20, FNLA 1,11, PDP-ANA 0,51. Todos os outros concorrentes foram extintos por terem menos de 0,50 por cento dos votos. A lista: PLD, AD Coligação, PADEPA, PAJOCA, PPE, FOFAC.

 O partido dos golpistas de 27 de Maio de 1977, nestas eleições foi sozinho e registou 0,22 por cento. A Frente para a Democracia (FpD) do ideólogo Fernando Pacheco e dos popularíssimos políticos Justino Pinto de Andrade e Filomeno Vieira Lopes conseguiu 0,26 por cento. Os votos dos dois juntos dá 0,48 por cento o que ditaria igualmente a extinção por falta de capacidade para mobilizar o mínimo de votos que é 0,50 por cento. Face à extinção, a FpD deu lugar ao Bloco Democrático. Que agora se extinguiu na UNITA!

A partir das eleições de 2008 acabaram os governos de unidade e reconciliação nacional porque os partidos da Oposição mataram essa solução. E fizeram dos gritos da fraude os seus programas políticos. Para as eleições de 24 de Agosto, anunciaram uma “frente patriótica” mas falharam estrondosamente. Vão todos a votos nas listas da UNITA que tem este historial:

Nasceu em 13 de Março de 1966. Um ano depois tornou-se uma unidade especial das tropas coloniais de ocupação. Os seus principais comandantes, Pedro e Sachilombo, foram reforçar os Flechas da PIDE nas operações anti-guerrilha do MPLA. Savimbi tornou-se o herói da luta contra a Independência Nacional. Assassinou dirigentes que o contrariaram. Atirou para as fogueiras da Jamba as elites femininas do movimento.

Após 11 de Novembro de 1975 a UNITA mudou-se de armas e bagagens para as forças de defesa e segurança do regime racista da África do Sul. Savimbi tornou-se o herói do aparheid na luta contra a Independência Nacional. Assinada a Paz de Bicesse, a UNITA foi estrondosamente derrotada nas eleições e Savimbi tornou-se o herói de Portugal e das potências ocidentais derrotadas na guerra colonial, na guerra de transição, na guerra pela soberania nacional e a integridade territorial. Em 24 de Agosto  a UNITA vai a votos reforçada com antigos maoistas, vigaristas de sempre e ladrões descarados. Estão lá muito bem. Dali vão directamente para o lixo, sem deixarem saudades nem às famílias deles. Lixo humano!

A Frente Podre da UNITA (FPU) é apenas uma anedota de mau gosto, por isso, os gritos de fraude eleitoral troam por todo o lado. Uma discípula do agente secreto do apartheid Sean Cleary, Paula Roque, angolaníssima, construtora da Angola que temos, garante que o "árbitro destas eleições não vai ser imparcial nem independente". Como chegou a esta conclusão não diz. Pensa que somos todos Francisco Viana, Justino Pinto de Andrade ou Filomeno Vieira Lopes. Está enganada. As angolanas e os angolanos podem fingir que vão empurrar o comboio malandro da UNITA, mas não empurram mesmo. Falta pouco para verem.

Jon Schubert, da Universidade de Basileia, do alto da sua sabedoria sobre Angola diz tonitruante: “Todas as últimas eleições pós-guerra foram manipuladas (…) no passado, sempre ouvimos o MPLA a falar de confusão, de retorno à guerra. Também o faz agora para desencorajar os eleitores a votarem na oposição, mas também para tentar impedir uma contestação dos resultados na rua”. Antes das eleições falam em fraude. Mas ao mesmo tempo atiram a toalha ao chão para evitarem o KO eleitoral.

Mais piadético é o “jurista e académico” Benja Satula. Recomenda uma “acção popular para pôr termo à forma desigual como os órgãos de comunicação social estatais se têm posicionado”. O Faustino Henrique, funcionário da embaixada dos EUA e editor de Opinião do Jornal de Angola vai ser testemunha chave. Eu vou estar na bancada contrária a explicar que não se pode tratar de forma igual o que é abissalmente desigual. As notícias não se medem a metro e os acontecimentos são todos diferentes e ai do jornalista que trate todos de forma igual. Isso de meia bola e força é coisa que não cabe no Jornalismo. Só n a prática de políticos vigaristas. 

*Jornalista

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