sexta-feira, 23 de junho de 2023

ATAQUES DA CIA E DAS FORÇAS ESPECIAIS DOS EUA

Os Estados Unidos vinham realizando duas campanhas militares separadas no Iêmen, que foi mantida praticamente em segredo do público americano. Uma das campanhas estava sob a autoridade da CIA usando drones, e a outra estava sendo executada por tropas de elite dos EUA do Comando Conjunto de Operações Especiais (JSOC).

Shane Quinn | Kateon | # Traduzido em português do Brasil

O presidente dos EUA, Barack Obama (2009-17), pediu para ver as "listas de mortes", com as biografias dos militantes islâmicos a serem alvo de guerra com drones e ataques militares (1). O Bureau of Investigative Journalism, com sede em Londres, informou em janeiro de 2015 que, sob o governo Obama, os americanos realizaram 103 ataques dentro do Iêmen, que incluíram 88 ataques com drones e ataques terrestres lançados por unidades das forças especiais dos EUA; que matou pelo menos 580 pessoas (424 delas em ataques com drones) e a morte de 131 civis.

Embora as forças americanas tenham frequentemente implantado drones para assassinar pessoas, os militares russos, por exemplo na Ucrânia, usaram drones para minar a infraestrutura crítica, o fornecimento de armas e munição que sustenta o regime em Kiev durante o conflito com a Rússia. Os russos usaram drones e outros equipamentos militares, como mísseis, de uma maneira muito mais humana do que os americanos.

Antes dos anos Obama até à administração Bush, de 2002 a 2004 os ataques de drones norte-americanos sobre o Iémen, provavelmente lançados a partir de bases como no Djibuti, mataram entre 294 e 651 insurgentes e "suspeitos de terrorismo", juntamente com entre 55 a 105 civis adultos e 24 crianças. (2)

O líder do grupo extremista Al Qaeda, Osama bin Laden, disse que os EUA consideravam o Iêmen como sua propriedade, por causa de sua proximidade com as maiores reservas de petróleo do mundo dos países do Golfo Pérsico (3). Bin Laden acreditava que o Iêmen tinha grande importância estratégica, pois está localizado ao lado do estreito de Bab el-Mandeb, que liga o Golfo de Áden ao Mar Vermelho, separando a África Oriental da Ásia Ocidental, proporcionando uma passagem vital também para o Mar Mediterrâneo e Oceano Atlântico.

No início da presidência de Obama, o Departamento de Energia dos EUA, um ramo do governo dos EUA, estimou em 2009 que 3,2 milhões de barris por dia (BPD) de petróleo fluíam para a América e a Europa através do estreito de Bab el-Mandeb; e do oleoduto Suez/Sumed, de 200 milhas de comprimento, no Egito, que vai do Golfo de Suez, perto do Mar Vermelho, até o Mediterrâneo.

Os americanos, usando os pretextos de combater a pirataria na Somália e combater a Al Qaeda no Iêmen, militarizaram as regiões ao redor do estreito de Bab el-Mandeb, construindo bases como o Campo Lemonnier em Djibouti, no leste da África. Ao controlar o estreito de Bab el-Mandeb, Washington esperava impedir o fluxo de petróleo da Arábia Saudita para grandes rivais, como a China. O estreito é uma passagem central entre a África e o Oriente Médio, garantindo uma conexão estratégica entre o Mediterrâneo e o Oceano Índico.

O presidente Obama queria mudar a "postura global" dos Estados Unidos, com uma das principais ambições sendo a tentativa de conter a influência da China na Ásia. Grande parte dessas áreas compreende o território que as Forças Armadas dos EUA haviam capturado do Império do Japão, entre 1942 e 1945. A base para o poder dos EUA hoje ainda consiste em grande parte de suas vitórias na Segunda Guerra Mundial, inclusive na Europa Ocidental após o desembarque da Normandia em 1944 no norte da França.

Obama descreveu a área da Ásia-Pacífico como um foco central de seus empreendimentos de política externa, que incluíram o estacionamento de 2.500 fuzileiros navais no norte da Austrália, o maior acúmulo militar dos EUA no país desde a Segunda Guerra Mundial. Em novembro de 2011, Obama disse em uma entrevista coletiva durante uma viagem à capital australiana, Camberra: "Com minha visita à região, estou deixando claro que os Estados Unidos estão intensificando seu compromisso com toda a região Ásia-Pacífico". (4)

No sudeste da Ásia, os EUA tentaram controlar o estreito de Malaca, que separa a Península Malaia da ilha de Sumatra, no oeste da Indonésia. Quatro quintos (80%) do petróleo importado pela China, do Oriente Médio e da África, passaram pelo Estreito de Malaca e pelo Estreito de Bab el-Mandeb. O estudioso brasileiro Moniz Bandeira escreveu que "o Estreito de Malaca liga o Oceano Índico ao Mar da China Meridional e ao Oceano Pacífico, bem como as economias do Leste Asiático ao Oriente Médio e à Europa". (5)

Na área do Mar Cáspio, o maior corpo de água interior do planeta, a Administração de Informação de Energia dos EUA estimou, em 2012, que continha 48 bilhões de barris de petróleo e 292 trilhões de pés cúbicos (TCF) de gás natural "em reservas provadas e prováveis" (6). O Serviço Geológico dos EUA, outra agência do governo americano, calculou que há grandes reservas de combustíveis fósseis não descobertas no Mar Cáspio, totalizando outros 20 bilhões de barris de petróleo e 243 trilhões de pés cúbicos de gás.

As fontes totais de petróleo do Mar Cáspio foram estimadas em 1999 em mais de 100 bilhões de barris, 10 vezes mais do que o presente no Alasca. Depois do Golfo Pérsico, o Cáspio contém a segunda maior reserva de petróleo e gás do mundo. A região do Mar Cáspio tem sido vista como "carente de estabilidade" no Ocidente, e a instabilidade percebida às vezes dissuadiu os investidores ocidentais de financiar oleodutos e gasodutos originários do Mar Cáspio.

No entanto, o Cáspio tem atraído cada vez mais atenção em Washington nos últimos 30 anos. Foi identificado por altos funcionários como Dick Cheney como criticamente importante (7). O Pentágono enviou ao exterior pessoal armado de organizações militares como a Blackwater, com o objetivo de proteger os oleodutos e gasodutos na região do Cáspio.

O interesse externo pelo Mar Cáspio não é novidade. Ao atacar a União Soviética no início da década de 1940, Adolf Hitler planejou "tomar o prêmio de poupança dos recursos do Cáspio e, em seguida, dirigir para o sul para o prêmio ainda maior da Pérsia [Irã] e do Iraque", escreveu o jornalista John Rees. Cerca de 50 anos antes da invasão nazista, a Rússia havia lutado com sucesso para impedir que a American Standard Oil Company, de John D. Rockefeller, ganhasse o controle do Cáspio. (8)

Na última geração, a produção total de petróleo do Mar Cáspio excedeu o Mar do Norte, rico em recursos, onde os poços de petróleo explorados diminuíram de 44 em 2008 para 12 em 2014. Ainda há cerca de 16 bilhões de barris de petróleo recuperável na costa de Aberdeen, no leste da Escócia, e a oeste das Ilhas Shetland, mais ao norte. (9)

A Rússia e seu vizinho Cazaquistão tradicionalmente controlam a maior parte do Mar Cáspio. Na Quarta Cimeira do Cáspio, realizada na cidade de Astrakhan, na Rússia, em 29 de setembro de 2014, os cinco países que têm linhas costeiras com o Cáspio – Rússia, Cazaquistão, Irão, Azerbaijão e Turquemenistão – concordaram unanimemente que defenderiam a segurança da região e não permitiriam a interferência de entidades militares estrangeiras, como a NATO liderada pelos EUA. O acordo alcançado em Astracã desferiu um golpe na hegemonia norte-americana, ao fechar o Cáspio aos desígnios de Obama.

Obama, assim como seu antecessor George W. Bush, persistiu nas tentativas de estender a Otan à Ucrânia. Os americanos sentiram que a Ucrânia serviria como uma cabeça de ponte, fornecendo-lhes outra rota fundamental para penetrar na Eurásia, enquanto tentavam retardar o ressurgimento da Rússia. Washington e seus aliados da Otan, portanto, alimentaram distúrbios e financiaram grupos de oposição antirrussos em Kiev.

Isso envolveu o apoio ocidental a um golpe de extrema direita implementado em Kiev no início de 2014. Um ano depois, durante uma entrevista à CNN, Obama admitiu o envolvimento do governo americano na derrubada do presidente legalmente eleito Viktor Yanukovych. Os comentários de Obama foram imediatamente notados pela hierarquia política russa, incluindo o ministro das Relações Exteriores, Sergey Lavrov. (10)

Os governos ocidentais, com o apoio dos meios de comunicação de massa nos Estados Unidos e na UE, travaram uma campanha de guerra psicológica (psyops) contra a Rússia, que envolveu a demonização de Moscou por reincorporar a Crimeia ao controle russo na primavera de 2014. Ignorado pelo Ocidente é que a Crimeia, como a Ucrânia, é historicamente um território russo, e tanto a Crimeia quanto a Ucrânia foram libertadas pelas forças russas do domínio nazista na Segunda Guerra Mundial. O controle dessas áreas para a Rússia é crucial para permitir que o país projete sua força sobre o Mar de Azov e o Mar Negro, corpos de água que fluem através das fronteiras russas.

Depois de 1945, é verdade que nenhum outro país teve a mesma influência que os EUA. Seus aliados, como Reino Unido, França e Canadá, têm participado com bastante destaque na arena internacional, mas suas ações são restritas e pouco ambiciosas e geralmente se limitam a obedecer às políticas de Washington.

O poder dos EUA, no entanto, sofreu uma série de reveses apenas no último meio século. Isso inclui o fracasso em garantir todos os seus objetivos na guerra do Vietnã, seguida em 1979 pela "perda" do Irã após uma revolução lá (11). O Irã é uma nação muito importante devido à sua posição no Oriente Médio e ao fato de conter entre as maiores reservas de petróleo e gás do planeta.

Se "perder" o Irã não fosse sério o suficiente, a perda do Iraque veio a partir de 2003, após a incapacidade dos militares dos EUA de conquistar o país. A invasão dos EUA também obrigou o Iraque, rico em petróleo, a buscar relações mais estreitas com seu vizinho iraniano a leste. O Irã recebeu um novo impulso quando os militares dos EUA não conseguiram garantir a vitória no Afeganistão, um país que tem uma fronteira ocidental de quase 600 milhas com o Irã.

Como resultado, o Irã, em um momento sob grave ameaça, tornou-se livre do espectro do cerco completo dos americanos, tanto nas fronteiras ocidentais quanto orientais do Irã. Com o Iraque e o Afeganistão sob seu controle, Washington esperava que tal cenário forçasse uma mudança de regime em Teerã ou, na falta disso, eles poderiam prosseguir para lançar uma invasão do Irã. Isso está fora de questão por causa das deficiências militares dos EUA no Iraque e no Afeganistão, que são países mais fracos do que o Irã.

A influência dos EUA na Ásia Central também vem diminuindo, em parte por causa da crescente confiança russa e da derrota dos EUA no Afeganistão, que compartilha fronteiras com o Turcomenistão, Tadjiquistão e Uzbequistão. Sob Obama, a "guerra ao terror" foi diluída para se tornar "operações de contingência no exterior". Na primeira metade da presidência de Obama, de 2009 a 2013, os americanos executaram 291 ataques de drones contra insurgentes, que resultaram na morte de entre 1.299 e 2.264 pessoas. As forças especiais dos EUA realizaram 675 ataques de morte/captura em 2009, aumentando para cerca de 2.200 em 2011. (12)

De 2004 a janeiro de 2015, a CIA realizou 413 ataques com drones, conforme relatado pelo Bureau of Investigative Journalism. Desses 413 ataques com drones da CIA, 362 deles foram lançados durante o mandato de Obama. Os ataques com drones em questão mataram entre 2.342 e 3.789 pessoas, das quais entre 416 e 957 eram civis (13). Os ataques com drones estavam ocorrendo em países como Afeganistão, Paquistão e Iêmen.

De acordo com o New America, um think tank com sede em Washington, o presidente Bush ordenou entre 45 e 50 ataques com drones durante seus 8 anos no cargo, resultando na morte de 477 pessoas. (14)

Anotações:

1 Luiz Alberto Moniz Bandeira, A Segunda Guerra Fria: Geopolítica e as Dimensões Estratégicas dos EUA (Springer; 1ª edição, 23 de junho de 2017) p. 213

2 Ibidem 

3 Ibidem, p. 215

4 "Obama aumenta militares dos EUA na Austrália, tranquiliza a China", Reuters, 16 de novembro de 2011

5 Bandeira, A Segunda Guerra Fria, p. 216

6 "A produção de petróleo e gás natural está crescendo na região do Mar Cáspio", Administração de Informação de Energia dos EUA, 11 de setembro de 2013

7 John Pilger, The New Rulers Of The World (Verso Books, 20 de fevereiro de 2003) pp. 109-110

8 Ibidem, p. 110

9 "A produção de petróleo do Mar do Norte aumenta apesar da queda dos preços", Daily Telegraph, 3 de agosto de 2015

10 "As declarações de Obama confirmam o envolvimento dos EUA no golpe na Ucrânia: Lavrov", Press TV, 2 de fevereiro de 2015

11 "Facções por trás da política dos EUA no Golfo", Middle East Research and Information Project, março/abril de 1988

12 "Targeted killings", Council on Foreign Relations, 23 de maio de 2013

13 Luiz Alberto Moniz Bandeira, The World Disorder: US Hegemony, Proxy Wars, Terrorism and Humanitarian Catastrophes (Springer; 1ª edição, 4 de fevereiro de 2019) p. 54

14 Ibidem, p. 55

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