segunda-feira, 7 de agosto de 2023

Francisco Ensina Paz e Solidariedade -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O Papa Francisco chegou a Portugal em cadeira de rodas, frágil, rosto marcado pelo sofrimento pessoal e da Humanidade. De repente começou a falar e partiu tudo. Citou o Tratado da União Europeia para dizer que a liderança do cartel, apostando na guerra, está a trair os princípios e os seus fundadores que sonharam alto um mundo de paz e solidariedade. O grande líder mundial perguntou aos nazis de Bruxelas: Para onde vais Europa e Ocidente? Para onde levas os teus sonhos? As armas não são o futuro. Invistam nos vossos filhos e no Estado Social. Avancem com a diplomacia.

O Papa falava no Centro Cultural de Belém para uma plateia de ignorantes e corruptos, tirando uma ou outra excepção, como mandam as regras. Deu-lhes umas pérolas mesmo sabendo que iam comê-las e depois defecá-las. A maioria nem se apercebeu que eram joias da Cultura. Citou Camões para nomear Portugal, país onde a terra se acaba e o mar começa. Citou Pompeu, nascido mais de 100 anos antes de Cristo: Navegar é preciso viver não é preciso. (Eu a dar uma de latinista: Navigare necesse, vivere non est necesse), Fernando Pessoa e depois Caetano Veloso também citaram o guerreiro romano. Oiçam o Papa, almas danadas. O vosso progresso só serve para a técnica. Ai de ti Europa que só apostas na guerra! Regressa urgentemente ao roteiro da paz.

Eu sabia que Francisco havia de esmagar as elites corruptas e ignorantes que dominam Portugal. Os que mandam para a Ucrânia tanques de guerra com os motores gripados e helicópteros sem rotores. Oiçam o Papa: “A guerra na Ucrânia e outros pontos do mundo só se resolve com diplomacia, não com armas!” Francisco contra a indústria bélica! Nenhum líder mundial é mais progressista do que ele. Se Deus existe que lhe dê mais 500 anos de vida porque ele vai pôr o mundo nos eixos e acabar com as guerras, a pobreza e a fome. É bom acreditar no impossível e exigir a utopia.


O Plano Nacional de Geologia (PLANAGEO) é um grande negócio. Gerações de técnicos portugueses elaboraram as cartas dos solos de todos os distritos (províncias). Está lá tudo. O Francisco Queiroz, antes de se dedicar ao negócio das ossadas mandou fazer estudos que estavam feitos. Torrou milhões. Diamantino Azevedo continua a explorar o filão. Garante que há dezenas de interessados em procurar diamantes uro, urânio e outras miudezas. Está tudo nos estudos dos portugueses. Ofereço esses livros ao senhor ministro para ele fotocopiar e oferecer aos “investidores”. Estou mesmo a lixar-lhe o negócio. De propósito. Sou um sacana.

Outro negócio milionário é o das ravinas. Aquilo começa por um pequeno sulco aberto pela água da chuva ou a erosão. Como ninguém liga, o sulco vira valeta, depois cratera e finalmente um abismo. Nesta fase entra o negócio que consiste em tapar tudo com betão. Muito betão. Toneladas de betão. Milhões de dólares. Angola tem 743 ravinas prontas para o negócio. Imaginem quantos milionários vão nascer sem asas de marimbondo nem pinças de caranguejo. Todos com asinhas de anjos à moda de João Lourenço!

Entre o Quitexe e o Bindo nasce o rio Dange. Corre pertinho da nossa casa e segue para sul, regando o Cuanza Norte até às terras do Itombe onde muda de nome para Zenza. Continua a regar as terras por onde passa e de repetente chama-se Bengo, amainando a sede às terras de Catete. Avança imparável até ao mar onde se chama Dande. Para trás deixa lagoas fabulosas como a da Funda. 

Alto lá. Aqui os portugueses decidiram criar a Cintura Verde de Luanda. Muita água vinda do Quitexe e do Bindo, milhões de hectares aráveis, muitos braços para trabalhar. Só faltavam estradas em condições.

Eu fui fazer uma reportagem nas terras irrigadas pelo Bengo. Estavam a ser construídas obras de arte (pontes e pontecos) na estrada da Funda e o troço entre Banza Qiutel e Quiminha estava pronto. Os camponeses de Kabiri e da Lagoa da Funda estavam servidos de uma estrada nova, asfaltada, para venderem os seus produtos nos mercados da capital e arredores! Assim nasceu a Cintura Verde de Luanda que era completada por outra mais fina nas terras da Cuca, com menos água. As parcelas (grandes hortas) foram distribuídas a colonos portugueses.

Os agricultores da Quiminha, organizados em cooperativas, não conseguem escoar as toneladas de hortícolas que produzem! Não estou a falar do Ninda, Muié, Mussuma, Calai, Cuchi, Dirico, Nancova ou Rivungo. Não são terras do Cuvelai ou da Cahama. Estão a 50 quilómetros de Luanda. Deixar degradar até ficarem intransitáveis as estradas secundárias da “cintura verde” ou a estrada nacional construída de raiz em 1965 é crime sem perdão. Podem cortar-me as mãos. Podem destituir-me. Ainda bem. Estou farto de pagar contas e comprar comida ao preço do ouro.

O Primeiro de Agosto é o marco mais importante da História de Angola Contemporânea. O 10 de Dezembro de 1956 é a data da fundação do MPLA. Importantíssima, foi o nascimento de um “amplo movimento” para a Independência Nacional. Mas surgiram outros. Dia 4 de Fevereiro de 1961. Os angolanos quebraram as algemas e ergueram-se em armas contra o colonialismo, o crime mais grave que alguma vez foi cometido contra a Humanidade. Importantíssimo. Mas localizado em Luanda. O 15 de Março de 1961 (UPA/FNLA) marcou a Grande Insurreição no Norte. Muitíssimo importante. Mas uma marca partidária.

O Primeiro der Agosto marcou o nascimento de um exército nacional em armas pela liberdade. Com expressão universal. As FAPLA eram Angola em Armas. E ganharam dimensão mundial quando ajudaram a libertar o Zimbabwe, a Namíbia e a África do Sul do regime de apartheid. Sem as FAPLA não tinha existido o 11 de Novembro. E Mandela tinha morrido na prisão.

Sem as FAPLA não tinha existido o Triângulo do Tumpo (Batalha do Cuito Cuanavale). Sem as FAPLA não tinha existido o Acordo de Nova Iorque (capitulação dos racistas de Pretória). Das FAPLA nasceram as Forças Armadas Angolanas que absorveram meia dúzia de sicários da UNITA. Alguns foram matar angolanos poucos dias depois de jurarem defender a Pátria Angolana. Por exemplo, Abílio Camalata Numa (criminoso de guerra e desertor).

Esta data histórica foi ontem ignorada olimpicamente. A culpa é minha. Podem cortar-me as mãos. Podem destituir-me. Não é preciso. Eu mesmo me destituo. Não quero ser conivente com o assassinato da nossa memória colectiva. 

*Jornalista

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