quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Portugal | O SOS do SNS

Joana Pereira Bastos, jornalista | Expresso (curto)

Bom dia,

A recusa cada vez mais generalizada dos médicos em fazer horas extraordinárias além do limite legal já obrigou ao fecho de vários serviços de urgência um pouco por todo o país e está a criar uma situação nunca antes vivida no Serviço Nacional de Saúde.

Se nada for feito para estancar o protesto, cerca de 25 hospitais deixarão de conseguir assegurar, nos próximos meses, o atendimento urgente em áreas tão sensíveis como medicina interna, cirurgia, pediatria, cardiologia, cuidados intensivos e ginecologia/obstetrícia, avisa o bastonário da Ordem dos Médicos, alertando para a “catástrofe” iminente.

Na reunião que esta manhã terá com o ministro, Carlos Cortes vai exigir soluções imediatas para responder à crise e tentar forçar Manuel Pizarro a dar um passo atrás e a regressar às negociações com os sindicatos, a que o Governo pôs fim em setembro.

Há um mês, o ministro da Saúde avançou unilateralmente com alterações ao funcionamento do SNS. A reforma imposta até prevê aumentos substanciais para os médicos – acima de 30% na carreira hospitalar e de 60% nos cuidados primários – mas exige, em contrapartida, muito mais trabalho, fixando, entre outras coisas, um acréscimo brutal das horas extraordinárias de 150 para 250 por ano. Na prática, está a pedir-se aos médicos que possam “trabalhar 50, 60 ou até 80 horas por semana”.

Alegando que já estão exaustos e não conseguem fazer mais, os médicos rejeitaram o ‘presente envenenado’ e avançaram para um protesto que está a paralisar várias urgências. Pizarro não esconde que está preocupado e reconhece a situação “muito penosa” vivida pelos clínicos. Mas já confidenciou que está de ‘mãos atadas’ perante o espartilho das Finanças. Só António Costa poderá obrigar Medina a abrir os cordões à bolsa, permitindo aumentos sem mais trabalho extra.

E o timing certo é agora, quando o Governo está a ultimar o “orçamento mais importante do mandato”. Entre as prioridades está a redução da dívida, área em que o ministro das Finanças tem razões para se gabar: Medina é um dos mais ‘poupados’ da Europa, conseguindo este ano o terceiro défice mais baixo da zona euro. O problema é que “há mais vida para além do défice” – a famosa frase nunca dita por Jorge Sampaio, que se tornou um slogan contra a austeridade. Perante o fecho de urgências hospitalares, é a saúde dos portugueses que está em causa.

OUTRAS NOTÍCIAS

Só no ano passado foram registadas mais de 1400 queixas contra a atuação das forças de segurança, mais 22% do que em 2021. É o número mais alto dos últimos seis anos. A PSP é o principal alvo das participações, seguindo-se a GNR e o SEF. Comportamentos incorretos por parte dos agentes e ofensas à integridade física motivaram a maioria das queixas.

O antigo ministro da Cultura Manuel Maria Carrilho foi condenado em definitivo a três anos e nove meses de prisão pelos crimes de violência doméstica e difamação contra a ex-mulher, Bárbara Guimarães. O Supremo Tribunal de Justiça recusou uma última reclamação apresentada pela defesa de Carrilho, que terá agora de pagar €30 mil à apresentadora e €6 mil à APAV, se quiser evitar a cadeia.

A comissão de inquérito a Boaventura de Sousa Santos recebeu denúncias de assédio sexual e moral apresentadas contra o investigador por parte de dez mulheres, de várias nacionalidades. O prazo para a apresentação de denúncias terminou a 30 de setembro, mas um coletivo de vítimas pede para se manter um canal aberto, “perante a gravidade dos casos”.

O preço das casas em Portugal não para de aumentar, em contraciclo com o que está a acontecer no resto da União Europeia. Por cá, os valores dispararam mais 8,7% no segundo trimestre, face ao mesmo período do ano passado, enquanto que na zona euro caíram, em média, 1,7%.

Na Liga dos Campeões, o Braga conseguiu uma vitória épica em Berlim por 2-3, depois de ter estado a perder por 2-0. A arte de Bruma e um tiro de Castro nos descontos derrotaram o Union Berlin. Mais infeliz foi a noite do Benfica em Milão, com uma derrota por 1-0 que complicou as contas do apuramento. Hoje é dia de FC Porto, que agora enfrenta em casa o Barcelona, depois da vitória na primeira jornada.

Lá fora

Em Espanha, o Rei propôs ontem o socialista Pedro Sánchez como novo candidato a primeiro-ministro, depois do fracasso da investidura de Alberto Núñez Feijóo, do PP, que não teve condições para formar Governo apesar da vitória nas legislativas de julho. O Parlamento tem agora até dia 27 de novembro para eleger um novo chefe de Governo e evitar uma repetição das eleições. O futuro político do país está nas mãos de catalães, bascos e galegos.

Uma "crise de fome está a aproximar-se" do Sudão do Sul, onde nos últimos cinco meses chegaram cerca de 300 mil pessoas fugidas da guerra no vizinho Sudão. Segundo o Programa Alimentar Mundial, quase 20% das crianças com menos de cinco anos e mais de um quarto das mulheres grávidas e lactantes estão subnutridas. E não há "recursos para prestar assistência vital aos que mais precisam".

Em Veneza, um autocarro incendiou-se depois de cair de um viaduto, provocando pelo menos 21 mortos e 18 feridos. Há ainda registo de vários desaparecidos e tudo indica que o número de vítimas mortais vai aumentar. Para já, não são conhecidas as causas do acidente.

O Prémio Nobel da Física foi atribuído aos cientistas Pierre Agostini, Ferenc Krausz e Anne L’Huillier, responsáveis por projetos de investigação que “abriram a porta ao mundo dos electrões” e “deram à humanidade novas ferramentas” para o explorar no interior dos átomos e das moléculas. Professora de Física Atómica na Universidade de Lund, na Suécia, Anne L’Huiller junta-se, assim, à restrita lista de apenas quatro mulheres que já venceram o galardão. Hoje será atribuído o Nobel da Química e amanhã anunciado o Nobel da Literatura. A lista fica completa sexta-feira, com a divulgação do Nobel da Paz.

FRASES

“O primeiro-ministro tem um ódio de estimação aos professores”,
Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, reagindo às declarações de António Costa, que segunda-feira à noite, em entrevista à CNN e à TVI, voltou a recusar a recuperação integral do tempo de serviço congelado

"Venho negar de A a Z, porque se trata de uma acusação falsa e sem nexo",
Manuel Pinho, antigo ministro da Economia acusado de crimes de corrupção, branqueamento e fraude fiscal, no falso arranque do julgamento, que acabou por ser adiado devido à greve dos funcionários judiciais

“Os governos e as empresas declararam guerra à sociedade e ao planeta”,
Faixa empunhada pelos nove ativistas da Climáximo que ontem de manhã bloquearam a segunda circular, em Lisboa, em frente à sede da Galp, para alertar para a inação no combate às alterações climáticas

O QUE ANDO A LER

“Caro Professor Germain”, de Albert Camus

É sabido que um bom professor faz a diferença, não apenas no percurso académico de um aluno, mas muitas vezes em toda a sua vida. O caso de Albert Camus, um dos mais brilhantes escritores do século XX, autor de O Estrangeiro ou A Peste, é disso um exemplo paradigmático. Menino pobre de um bairro operário de Argel, que ainda em bebé ficou órfão de pai, Camus tinha o destino traçado: mal acabasse a primária, deveria abandonar a escola e ir trabalhar para ajudar a mãe no sustento da casa. Era essa a vida que lhe caberia se não tivesse tido a sorte de ter como professor Louis Germain, que considerava como o seu “pai espiritual”. Foi o “mestre” que convenceu a família a deixar o pequeno Camus seguir para o liceu, antevendo nele um futuro promissor, que para felicidade do próprio – e de todos os que amam a literatura – haveria de se cumprir. A relação entre os dois, de admiração e ternura mútuas, prolongou-se muito para lá dos bancos da escola, através de uma comovente troca de correspondência, agora editada pela Livros do Brasil, que só terminou com a morte prematura do escritor.

“Sem o senhor, sem essa mão afetuosa que estendeu à pequena criança pobre que eu era, sem o seu ensinamento e exemplo, nada disto me teria acontecido”, escreveu Camus ao seu professor primário em 1957, quando foi laureado com o Prémio Nobel da Literatura. “Apesar do senhor Nobel, continuarás a ser sempre o meu rapaz”, respondeu-lhe o mestre. A coleção de cartas “Caro Professor Germain” é um testemunho poderoso sobre o valor da educação e funciona como uma verdadeira homenagem aos professores, uma das mais nobres profissões, a que tantas vezes, e tão injustamente, tem faltado o devido reconhecimento.

SUGESTÕES DE PODCASTS

manchete do Expresso desta semana dava conta da denúncia feita por um dos acusados na Operação Tempestade Perfeita: Paulo Branco implica o ministro João Gomes Cravinho na aprovação de um contrato fictício com Marco Capitão Ferreira. Os fantasmas de Cravinho são o principal tema desta Comissão Política que não esquece também as manifestações pela habitação

Parabéns ao podcast A Noite da Má Língua! Como não há categoria de melhor podcast na cerimónia dos Globos de Ouro, nunca perdem o prémio. Com o calor que se sentiu no Coliseu dos Recreios, as transparências foram muito úteis. Terá sido esta a noite mais escaldante do ano? A culpa é das alterações climáticas e, especialmente, da transparência de Rita Blanco, que não apareceu. Ouça o novo episódio

A Autoeuropa, a fábrica portuguesa do grupo Volkswagen, voltou a abrir depois de três semanas de paragem. É o ‘Peso-pesado’ da economia portuguesa. E agora? Mais um importante tema económico esclarecido no podcast diário do Expresso Economia dia a dia

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