terça-feira, 21 de novembro de 2023

Angola | Publicidade Comparativa e Falsificações -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A publicidade entra em campo quando a concorrência vai à vida. Começou com os reclames e o “matabicho” (meu pai oferecia um pano e um lenço para a senhora por cada dez sacos de mabuba). Hoje apresenta formas que têm tanto de sofisticadas como de ilegítimas. Nos EUA, o caos publicitário foi resolvido com a auto-regulação. Bem resolvido. Os métodos usados foram importados e copiados em todo o mundo onde prosperava o negócio.

As instituições da auto-regulação começaram por actuar sobre a publicidade enganosa. Ganharam com grande facilidade. Os publicitários reconheceram facilmente que enganar os consumidores tinha o seu quê de baixeza. Mas sobrou um problema que levou anos a resolver: A publicidade comparativa. Os legisladores aprovaram uma lei que proibia absolutamente todos os anúncios na base “o meu produto é o melhor de todos” ou “o meu é melhor do que teu”. Nada de comparações.

Apesar da auto-regulação eficaz e da Lei, os publicitários continuavam a arrasar a concorrência com publicidade comparativa. Até que foi arranjada uma solução eficaz. Quem recorria à publicidade comparativa tinha que provar ante o regulador. Ou no Tribunal. Em qualquer das instâncias as multas eram pesadíssimas. Acabou. Primeiro nos EUA e depois em todo o mundo onde a publicidade avançava quando já não existiam condições para a concorrência leal.

Em 1978, o partido português CDS ajudava a instalar em Portugal a UNITA, numa sede localizada no Campo Grande, Lisboa. Ao mesmo tempo os Media portugueses começaram a falsificar os acontecimentos que levaram à Independência Nacional. Alarmado com a situação, o Comandante Onambwe desafiou-me a repor verdade dos factos. Passei umas quantas noites sem dormir (de dia trabalhava) e escrevi o livro Angola a Via Agreste da Liberdade. Subtítulo: (Do 25 de Abril ao 11 de Novembro de 1975). Na época existiam jornalistas ainda que alguns fossem vendidos. Mas não queriam que se soubesse. E o livro teve o condão de acabar com as aldrabices.

Hoje estamos muito pior do que em 1978. Os Media, os portais, as redes sociais divulgam aldrabices sem o menor pudor. Porque ninguém protege a História Contemporânea de Angola. E muito menos os seus principais actores. Não falo de marginais ou farsantes. Mas de pessoas com altas responsabilidades na vida social, económica e política de Angola que mentem, falsificam e manipulam. Vou dar o exemplo mais chocante e que me chegou às mãos hoje mesmo. 

Nas redes sociais circula um texto atribuído à Dra. Tchizé dos Santos (não acredito que seja a autora, alguém usou o seu nome abusivamente) onde Agostinho Neto e sua família são vítimas de calúnias e insultos grosseiros. Mas também o Presidente José Eduardo dos Santos e o MPLA. 

Quando alguém escreve que Irene Neto foi nomeada por José Eduardo dos Santos para o Comité Central e o Bureau Político do MPLA, estão a chamar ditador ao anterior Chefe de Estado. No MPLA a direcção e o líder são eleitos em congresso e não nomeados. 

No mesmo texto está escrito que Agostinho Neto “é um assassino” e matou mais gente do que as vítimas do Holocausto. Uma calúnia, um insulto, uma agressão inadmissível ao Fundador da Nação. 

Estou cansado de ser confrontado com situações iguais ou muito piores. Leio descrições de acontecimentos que vivi e por isso sei que a verdade dos factos está a ser espezinhada. Somos um país jovem. As circunstâncias em que chegámos à Independência levaram a autênticas catástrofes. Apagámos páginas únicas da nossa História. Destruímos provas documentais. Esvaziámos arquivos. Mas ainda cá andam alguns dos que viveram esses acontecimentos para reporem a verdade dos factos.

E quando já não existirem actores vivos? Vai ser o dilúvio. Falsificar deliberadamente a História de um país é crime que devia ser punido com a pena máxima. Assassinar a memória histórica de um povo é pior do que homicídio com especial violência e perversidade. Tem de ser crime público!

Daqui lanço um apelo (é mais um grito de socorro) a todas as deputadas e deputados da Assembleia Nacional. Por favor, aprovem legislação que acabe com este massacre à História Contemporânea de Angola e seus actores principais. É urgentíssimo. 

Se a Lei que protege a Memória Histórica e a Verdade dos Factos já estivesse em vigor, o ministro dos Transportes, Viegas Abreu, a esta hora estava a contas com a Justiça. Porque fez uma afirmação mentirosa sobre quem foi responsável pelo projecto e as obras do Aeroporto Internacional Dr. António Agostinho Neto. Atribuiu tudo a João Lourenço! Apagou deliberadamente o nome de José Eduardo dos Santos. Nunca se esqueçam: Quem não sabe donde vem, não se conhece. Não sabe quem é. Jamais saberá para onde vai. 

A solução é muito simples. Vamos recuar ao tempo em que foi preciso reprimir a publicidade enganosa e a publicidade comparativa. Ai é? Então prove o que diz e escreve. Não prova, é condenado. Mas com penas pesadas, não com bagatelas penais. Escrever que Agostinho Neto é um assassino e matou mais pessoas do que as vítimas do Holocausto dá pena máxima. 

Por favor, deputadas e deputados angolanos. Aprovem legislação que obrigue a provar afirmações que estão em conflito com a História de Angola. Somos um povo com passado e memória. Não nos tirem esse património de valor inestimável. A nossa História é a força do presente e a garantia de um futuro digno.

Provem o que escrevem, seja onde for. Mentir não é liberdade de expressão. Falsificar e manipular é crime.

* Jornalista

Sem comentários:

Mais lidas da semana