Artur Queiroz*, Luanda
A pedido de várias famílias vou
contar o que se passou hoje
Este é o ponto da situação a esta hora da noite. Mas logo de manhã, agentes do Ministério Público desencadearam uma operação que considero um golpe de estado palaciano. Ao fim de vários anos investigando o que aconteceu nas concessões da exploração de lítio e ”hidrogénio verde”, os investigadores decidiram hoje avançar à força toda.
O gabinete de Imprensa do Ministério Público, em comunicado, anunciou que “no decurso das investigações surgiu, além do mais, o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do Primeiro-Ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos no contexto supra referido. Tais referências serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, por ser esse o foro competente”.
Eis o pronunciamento do golpe de estado. “Suspeitos” e nada mais do que suspeitos falaram no nome de António Costa e da sua autoridade (primeiro-ministro) “para desbloquear procedimentos”. O que trocado por miúdos pode ser “tráfico de influências”. Se há ou não crime, tem de ser analisado pelo tribunal supremo de Portugal porque se trata de uma suspeita sobre o primeiro-ministro, titular de um órgão de soberania.
A partir de hoje em Portugal o poder já não está no voto popular. Seja qual for o resultado das eleições, desde uma maioria simples a uma maioria qualificada, o Ministério Público deita abaixo qualquer gabinete com um simples comunicado de um qualquer “gabinete de imprensa”.
O Partido Socialista ganhou as eleições com maioria absoluta. Governou aos encontrões porque as fossas televisivas, ocupadas por forças ilegítimas e, percebe-se agora, golpistas, ia lançando suspeitas sobre ministros, secretários de estado e outros membros do Governo de António Costa. Apesar de tantas diatribes e golpadas mais ou menos chanceladas pelo Tio Célito, não caiu. O partido Chega desesperou. O PSD bravou. Avançaram as tropas de assalto ao poder.
Hoje o governo socialista levou o golpe fatal. Se não cais a bem, cais a mal. E num comunicado singelo, foi referido que António Costa, segundo suspeitos investigados há quatro anos, “desbloqueou procedimentos”. O processo vai para o Supremo Tribunal. Como manda a lei. Golpada! Para não parecer mal, o Ministério Público arranjou cinco detidos e um ministro, António Galamba, foi constituído arguido. Está feito. À boleia de uns quantos suspeitos (nada mais do que isto, suspeitos) deita-se abaixo um governo suportado por maioria absoluta no Parlamento. Brincadeira à moda da UNITA que em Portugal se chama Chega.
O Tio Célito pode agora dissolver a Assembleia da República e convocar eleições antecipadas. Ou pode convidar o Partido Socialista para formar um novo governo. António Costa está fora. Já deve ter aberto uma dúzia de garrafas de champanhe na comemoração por se ver livre da choldra. Um esclarecimento. O rei D. Carlos quando ia no seu veleiro investigar o alto mar, quando regressava, mal via a costa portuguesa dizia que estava a chegar à choldra!
A partir de agora, seja qual for o resultado das eleições, uma dúzia de agentes do Ministério Público com ou sem o Tio Célito, com ou sem Chega, mobiliza guardas da PSP um juiz de instrução criminal, fazem umas buscas, procedem ou não a detenções mas num comunicado assassino escrevem que há suspeitas quanto à integridade e à honra do primeiro-ministro. O governo cai por terra, como caiu hoje em Portugal.
Aos “analistas” das fossas televisivas quero apenas lembrar isto. A Polícia Judiciária está fora disto! Para mim só há a um motivo. Sendo uma instituição séria, não embarcou no golpe palaciano.
O general romando Galba ocupou a Ibéria e face à resistência teimosa dos lusitanos teve este desabafo: Este é um povo que não se governa nem se deixa governar!
Os últimos lusitanos estão
acantonados no Ministério Público
Por fim informo as famílias antigas que a Polícia Judiciária está fora disto. E os cinco detidos são tão inocentes como Dona Lucília Morgadinho Gafo, a PGR portuguesa. Nenhum sabe até à hora em que escrevo, de que factos são suspeitos. O ministro constituído arguido, João Galamba, sabe. Mas é tão inocente como eu, que nada sei de hidrogénio verde nem de lítio. António Costa está limpinho, sem sombra de pecado. Nem sequer foi ouvido. Nada.
Os golpes de estado, violentos ou palacianos, são assim mesmo.
* Jornalista
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