domingo, 10 de março de 2024

Certezas e Dúvidas Portuguesas -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Os portugueses vão hoje eleger 230 deputados. Amigas e amigos perguntam-me quem vai ter a maioria na Assembleia da República. Não sei responder porque apesar de ter feito muitos esforços, não consegui o estatuto de bruxo. Mas as eleições decorrem num clima de algumas certezas e muitas dúvidas. Disso posso falar.

A alguns dias dos 50 anos do 25 de Abril a direita está às portas do poder e a esquerda perde cada vez mais espaço. De certeza certezinha. A minha dúvida é se contados os votos a esquerda fica em minoria. Isso significa que a direita troglodita derrubada pelo meu amigo Otelo Saraiva de Carvalho e os seus camaradas do Movimento das Forças Armadas volta ao poder ainda mais reacionária e agressiva. 

O bloco de direita com laivos extremistas tentou abafar o Chega, partido racista e xenófobo, pela voz de Passos Coelho, antigo primeiro-ministro. Ele associou a insegurança aos emigrantes. Ainda não perceberam que nesta altura do campeonato o problema é saber se os emigrantes vão continuar a escolher Portugal como matadouro ou sorvedouro do seu suor a troco de um salário rastejante. 

Uma certeza irrefutável. A coligação Aliança Democrática (AD) foi ressuscitada para recuperar o eleitorado de extrema-direita à custa do CDS e do Partido Popular Monárquico. Chega e Iniciativa Liberal vão pagar para esse peditório. A dúvida está em saber se os eleitores compram os discursos de Passos Coelho, Cavaco Silva, Luís Filipe Menezes, Manuela Ferreira Leite e outras múmias do PSD. Uma certeza: Os pensionistas não esquecem que o PSD lhes roubou as reformas, o subsídio de Natal e aumentou os impostos para o dobro.

Até às 16 horas de hoje já tinham votado 52 por cento dos eleitores. De certeza. A dúvida é se a abstenção vai ganhar novamente, como aconteceu nas eleições de 2022. Se assim for, a extrema-direita elege mais uns quantos deputados.

Marcelo Rebelo de Sousa fez três intervenções públicas a favor da AD. Ninguém o pode acusar de incoerência ou virar as costas aos seus. Já trata o chefe do Chega por presidente Ventura. Se a AD, Iniciativa Liberal e Chega tiverem um a maioria de deputados está vingado seu pai, antigo ministro e governador do colonial-fascismo E seu padrinho, ditador derrubado no 25 de Abril de 1974 (Marcelo o Caetano). Estão vingados, A alguns dias dos 50 anos da Revolução dos Cravos, os fascistas podem fazer governo. Esta é a grande dúvida.

Os socialistas ganharam as eleições com maioria absoluta em 2022. Os Media, com especial destaque para a RTP, iniciaram imediatamente o “bota-abaixo”. À sombra do partido Chega, polícias, agentes da Justiça, ricaços e outros grupos socias puseram em marcha iniciativas para derrubar o governo de António Costa. Um parágrafo assinado pela Procuradora-Geral da República foi o facto decisivo.

Marcelo Rebelo de Sousa derrubou um governo suportado por maioria absoluta na Assembleia da República. Ontem, dia de reflexão, disse aos eleitores que estas eleições vão marcar um novo ciclo. O qual não. Antes, o Partido Socialista governou com maioria simples. Em 2022 governou com maioria absoluta. Dois ciclos. O que ele quis dizer, sem dizer, foi que hoje é preciso eleger o seu partido, travestido de Aliança Democrática. O tal “novo ciclo”. Golpe-baixo, de certeza.

Para os chefes da AD vale tudo menos tirar olhos. O presidente do governo regional da Madeira (PSD) afirmou à boca das urnas que “apesar da crise política a vitória está garantida”. Mas o pior estava para vir. Os donos dos Media mandaram os seus carregadores de microfones, gravadores e câmaras amplificarem propaganda da Aliança Democrática em tempo de votação. Proibidíssimo.

Os boletins de voto são conhecidos há muito tempo. Mas hoje, os dirigentes da AD apresentaram “queixa” aos “jornalistas” porque o partido ADN tem semelhanças com a sua sigla! Fraude. Estamos a ser vítimas de fraude. E o povão foi a correr votar na coligação para castigar os fraudulentos. Uma golpada destas nem o Bolsonaro protagonizava. De certeza.

Uma certeza absoluta. Não sou apoiante da democracia representativa e muito menos da economia de mercado. Só voto de braço no ar para toda a gente saber o que penso e em quem voto. Nem morto me metia numa cabine, escondido, com um papelinho na mão para lhe colocar uma cruz, dobrar em quatro o boletim e metê-lo numa caixa à qual chamam “urna”. Mas se votasse era na CDU, uma coligação do Partido Ecologista Os verdes e o Partido Comunista Português.

Última certeza. A Europa está no caminho da nazificação. Se os eleitores portugueses trocarem os socialistas pela extrema-direita com gravata (AD e Iniciativa Liberal) ou sem gravata (partido Chega), é o rumo que está a dar. Os aspirantes a nazis são belicistas e fazem tudo para envolver a União Europeia, Reino Unido e OTAN (ou NATO) numa guerra contra a Federação Russa. Se tal acontecer, tenho dúvidas fundadas de que voltem a acontecer eleições porque não há eleitores.

União Europeia em recessão. EUA em recessão. Japão em recessão. Genocídio de Israel na Faixa de Gaza mobiliza forças no Médio Oriente para uma guerra total. No Mar Vermelho já começou. No Sul do Líbano também. Os EUA têm na região o chefe da CIA para ajudar os nazis de Telavive a prosseguir as matanças. Guerra na Ucrânia com tendência para alastrar. Guerra no Leste da RDC cada vez mais mortífera. Guerra no Sudão já atingiu a catástrofe humanitária. 

 Os países africanos ameaçam cortar as borlas em matérias-primas ao ocidente alargado. O Sul Global está a libertar-se do estado terrorista mais perigoso do mundo. Os portugueses estão indecisos entre dar uma vitória total à extrema-direita sem gravata ou à extrema-direita marcelista. Para piorar, o Benfica leva grandes cabazadas e o bom vinho português atingiu preços proibitivos. Só os ricaços podem embebedar-se. Olho para a carteira e não tenho dúvidas. Está tão vazia como o meu copo.

Para Angola não é indiferente ganharem racistas e xenófobos ou socialistas. Mas mais logo, às 20 horas de Lisboa 21 horas de Angola, ficamos a saber. Esperem pelo meu contacto.

* Jornalista

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