José Ricardo
Livramento - Expresso das Ilhas (cv), opinião
Nos últimos anos os
Cabo-Verdianos viram-se confrontados com níveis de criminalidade preocupantes.
Antes conhecida pela sua “morabeza” e paz social, hoje temos índices de
criminalidade bastante elevados na nossa sociedade. Os números apresentados pela
Polícia Nacional demonstram um aumento significativo de crimes de ano para ano. Segundo as ocorrências policiais, o crime contra as
pessoas aumentou entre 2010 e 2011 de 10.571 casos para 11.741 casos, e entre
2011 e 2012 aumentou de 11.741 para 12.156 casos registados.
Ou seja um aumento de 11,1% entre 2010 e 2011 e de 12,1% entre 2011 e 2012. Quanto aos crimes contra a propriedade também houve um aumento significativo entre 2010 e 2012, aumentando de 10.411 casos em 2010 para 11.288 em 2012.
Ao contrário do que
se pensa os crimes tendem a acontecer de dia quando as pessoas estão fora das
suas casas. Tanto os crimes contra as pessoas como contra as propriedades
tendem a acontecer da parte de manha e à tarde. Partimos da ideia de que para haver
crime tem de haver 3 elementos fundamentais: a vítima, o criminoso e a
oportunidade.
Em Cabo Verde o
chamado “Caço Body” é o tipo de crime mais frequente. Este tipo de crime é
normalmente cometido por jovens, que têm uma coisa em comum, a exclusão social.
A exclusão social é realidade em Cabo Verde, temos cada vez mais um fosso entre
pessoas menos favorecidas e pessoas mais abastadas financeiramente.
Lembro-me em
criança da minha mãe dizer que em Cabo Verde não há rico nem pobre, mas hoje já
é um fenómeno que se observa a olho nu. Na minha opinião em Cabo Verde já
podemos falar em subculturas delinquentes (muito estudada pela escola de
Chicago). Se não apostarmos na prevenção, em 10 ou 15 anos poderemos ter casos
graves de subculturas delinquentes. Podemos definir subcultura como uma
“cultura dentro da cultura” (segundo Cohen). Do ponto de vista sociológico a
cultura é vista como um conjunto de critérios de valor capazes de orientar
eficazmente a ação social. Subcultura implica a existência de padrões normativos
opostos (ou divergentes) dos que presidem à cultura dominante. Clifford shaw e
Henry McKay, são autores que se destacaram na escola de Chicago pelo estudo dos
Gangs ou como apelidamos em Cabo Verde de “grupos thug”.
Segundo eles 80% de
todos os casos de delinquência juvenil estudados tinham sido cometidos por
jovens que integravam gangs. Esses jovens procuram esses grupos para, na
maioria das vezes conseguirem afirmarse, já que não conseguem fazer isso
cumprindo as normas da sociedade. O gang ou “grupo thug “ passa a ser a família
do jovem. Na nova família vai receber novos valores, onde a delinquência está
no centro.
Esses novos valores
formam a subcultura delinquente, e o mais preocupante é que em Cabo Verde já há
casos de crianças que já nascem nesses grupos, por isso poderemos ter em alguns
anos uma situação de subcultura bem mais grave que a atual, pois essas crianças
que hoje estão abandonadas nas ruas a conviverem entre si, e sem qualquer
fiscalização dos pais, somente quando crescerem eles reconhecerão apenas os
valores do seu “grupo thug”.
Na maioria dos
casos em Cabo Verde o delinquente apresenta remorsos pelos seus atos e sabe que
o que faz é errado, mesmo praticando crimes sente alguma empatia com a vítima,
se não apostarmos na prevenção nem isso teremos no futuro.
As políticas de
combate a esse tipo de criminalidade devem passar pela prevenção, apostar no
reforço dos valores sociais, apostar na igualdade social, promover a igualdade
de oportunidade, chamar os principais atores sociais para reforçar os seus
papeis, refirome às escolas, igrejas, associações comunitárias, famílias, etc.
Também a polícia tem de ter outro papel, é urgente criar uma polícia
comunitária, que teria como principal característica a proximidade, mas não
basta enviar os agentes policiais para as comunidades, têm de ter formação adequada na área social. Com a polícia
de proximidade/comunitária, as populações passariam a confiar mais nas
autoridades, facilitando a obtenção de informações quando necessário, por outro
lado os polícias teriam maior conhecimento da realidade social da zona onde
atuam, teriam melhores ferramentas para mediar conflitos e intervir quando
solicitados.
Anteriormente não
foram adotadas as melhores políticas para combater o fenómeno de “crianças na rua”
ou “crianças de rua”, hoje pagamos caro por isso. Mas podemos mudar a próxima
geração de crianças que neste momento têm essa lacuna de valores, valores que
em vez de serem passados pelas famílias, escolas ou outros atores sociais,
estão a ser passados pelos grupos delinquentes.
É uma situação
facilmente observável, é só ver o número de crianças nos bairros das cidades que
ficam sozinhas nas ruas de manha à noite. Alguma coisa tem de ser feita a nível
de intervenção social ou corremos o risco de quando forem adultas não se
identificarem com a nossa cultura, mas sim com uma subcultura ou ainda mais
grave com uma “contracultura”.
grave com uma “contracultura”.
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