Ana Sá Lopes – jornal i, opinião
Avançar para um
novo partido é um projecto difícil e corajoso
Rui Tavares foi
corajoso quando decidiu avançar com a formação de um novo partido. A acusação
feita ao eurodeputado de que está a construir uma nova formação eleitoral só
para ser reeleito para o Parlamento Europeu devia ter terminado no dia em que
se soube que Tavares recusou integrar as listas do PS. Convenhamos que se o
objectivo de Rui Tavares fosse estritamente pessoal, seria cumprido com muito
maior eficácia com um simples "sim" à proposta de acolhimento nas
listas europeias dos socialistas. Rui Tavares teria o seu problema pessoal
resolvido - continuaria tranquilamente a ser deputado europeu, com as
facilidades inerentes à integração numa lista do partido que previsivelmente
sairá vencedor das eleições europeias.
Mas Rui Tavares não
queria, afinal, simplesmente continuar deputado europeu. Ao avançar para a
constituição de um partido, ao atirar qualquer coisa para "o meio da
esquerda", optou pela intervenção dura e de alto risco. Ao trocar a
certeza de uma eleição fácil nas listas do PS pela disponibilidade para trazer
um novo protagonista ao sistema (com todos os riscos de insucesso que a ideia
comporta), Rui Tavares mostra que defende algo maior do que "o seu lugar
em Estrasburgo", o mimo que lhe tem sido dirigido pelos opositores - de
esquerda, claro.
Avançar para a
constituição de um novo partido de esquerda é um projecto difícil e corajoso -
num tempo em que o antipartidarismo floresce - embora a desagregação do Bloco
de Esquerda possa facilitar a tarefa. Se se juntar parte da "esquerda
alegre" que se foi desiludindo com o PS e com o Bloco de Esquerda, à vez,
pode haver eleitorado disponível para ser captado por um novo partido.
No entanto, o
partido Livre ainda não tem programa e não pode ficar sustentado única e
exclusivamente na figura de Rui Tavares e mais duas ou três antigas figuras do
Bloco ou do PS. Da reunião deste fim-de-semana ainda não se pode extrair
grandes conclusões, com a excepção de que o novo partido vai optar por fórmulas
mais abertas de organização (em contra- -ponto com os restantes partidos cada
vez mais fechados) e que é "europeísta", seja lá o que isso for hoje
em dia, e que recusa firmemente sair do euro. Mas isto ainda não é um programa
para chegar às massas. Os fundadores do partido Livre têm ainda de descobrir
respostas para perguntas que o eleitorado lhes vai fazer - como podemos lutar
contra a austeridade sem ser através de slogans? O caminho é duro, mas a
coragem é de assinalar.
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