Obras de mobilidade
inacabadas, denúncias de corrupção, soluções de segurança de última hora e
decepção com os legados não são exclusividades brasileiras.
Paulo Vasconcellos –
Carta Maior
A festa do vizinho
sempre parece melhor até quando se trata de Copa do Mundo ou Jogos Olímpicos. A
África do Sul, em 2010, e a Olimpíada de Londres, em 2012, não foram nenhum
primor de organização, mas poucos lembram disso para amenizar os equívocos do mundial
do Brasil. Obras de mobilidade inacabadas, denúncias de corrupção, soluções de
segurança de última hora, frustração com o número de turistas e decepção com os
legados não são exclusividades brasileiras.
A boa nova é que o Reino Unido registrou um crescimento de 10% no fluxo
turístico um ano depois dos jogos e espera chegar à marca de 40 milhões de
visitantes estrangeiros por ano até 2020. Os sul-africanos de algumas cidades
comemoram um sistema de transporte mais rápido e taxa de crescimento da economia
este ano de 5,3%, de acordo com previsão do Fundo Monetário Nacional (FMI), em
parte por conta do Plano Nacional de Infraestrutura lançado no rastro da Copa
do Mundo com 18 projetos estratégicos e investimentos de US$ 83 bilhões
direcionados aos 23 distritos mais pobres do país e que vão beneficiar 19
milhões de pessoas.
Nada disso aconteceu sem percalços. A África do Sul, que gastou US$ 8 bilhões,
se frustrou com o retorno da competição para o turismo e a geração de emprego.
A organização do mundial enfrentou denúncias de corrupção. As obras do trem que
liga os 35 quilômetros do centro de Joanesburgo ao Aeroporto Internacional OR
Tambo em apenas 15 minutos só ficaram prontas depois que o mundial acabou.
Durante a competição, turistas e sul-africanos tiveram que suportar muita
poeira nos olhos. O sistema chegou ainda à Pretoria, Porto Elizabeth e Cidade
do Cabo, que ganhou também 300 novos ônibus. Durban ganhou novas estações de
trem. Mas a taxa de desemprego se manteve alta e o país voltou a enfrentar
conflitos sangrentos entre policiais e trabalhadores das minas de platina. O
crescimento médio do PIB também patinou logo depois do mundial e chegou a ficar
em 2,6% ao ano – ainda assim maior do que quase todas as outras economias do
mundo, noves fora a China.
O legado mais próximo do fracasso parece ser o dos estádios. O Cape Town
Stadium, construído na Cidade do Cabo por US$ 600 milhões em dinheiro público e
capacidade para 55 mil pessoas, virou um rombo nos cofres da administração
municipal mesmo com shows de Lady Gaga, U2 e Justin Bieber. O prejuízo chegava
a US$ 5 milhões por ano. O Green Point Stadium, com capacidade para 66.005
pessoas, custou cerca de US$ 600 milhões e, apesar de a cidade ter dois times
de futebol e uma das equipes de rugby mais famosas do país, quase nunca recebe
jogos. Só o custo de manutenção é de R$ 10,5 milhões por ano. Em Porto Elizabeth é
pior. No Nelson Mandela Bay Stadium nem as traves sobreviveram ao abandono.
Para o Reino Unido restou mais do que os feitos de Usain Bolt nas pistas e de
Michael Phelps nas piscinas. Antes parecia uma festa de arromba. A vinte dias
dos jogos, o governo britânico botou 20 mil homens das forças armadas nas ruas
às pressas para fazer a segurança porque a empresa contratada em licitação se declarou
incompetente para o trabalho depois de denúncias de corrupção. As autoridades
ainda tiveram que apelar ao espírito cívico dos ingleses para que usassem menos
a internet e não provocassem um congestionamento nas comunicações.
Quatro jornalistas da CBN, emissora do Sistema Globo de Rádio que desanca a
organização do mundial do Brasil, testaram os trasportes para chegar ao Estádio
Olímpico na abertura. O que foi de metrô levou 56 minutos, o que usou bicicleta
gastou quase uma hora e meia, aquele que pretendia ir de táxi nem saiu do lugar
e o escalado para chegar de ônibus ainda esperava no ponto uma hora depois.
Quem precisou voltar para casa ou para o hotel depois da cerimônia encontrou
estações de metrô fechadas por causa do pico de passageiros. Manifestantes
foram às ruas contra os gastos da competição e a remoção de um bairro inteiro
na zona leste da cidade para a construção da infraestrutura esportiva. As
arquibancadas apareciam vazias nos primeiros dias da competição. Os jornais
chegaram a estampar manchetes dizendo que Londres se tornara uma cidade
fantasma porque os turistas não tinham aparecido e os londrinos tinha saído da
capital inglesa para evitar a confusão.
Nada como um ano depois do outro. Em 2013, o país recebeu 33 milhões de
turistas. Foram 30.798 milhões, em 2011, e 31.084 milhões, no ano da olimpíada.
Os visitantes deixaram 21 bilhões de libras esterlinas – o equivalente a R$
78,5 bilhões – para a economia britânica. Por trás de todos os esforços para
garantir o sucesso dos Jogos Olímpicos de Londres prevaleceu uma estratégia
política de turismo prioritária: mudar a imagem excessivamente reservada dos
britânicos. Foram sete anos de planejamento e marketing para que os ingleses
aprendessem a se tornar mais receptivos.
"Os Jogos
Olímpicos foram uma grande plataforma de comunicação", afirma Samuel
Lloyd, diretor do VisitBritain para a América Latina, a agência nacional
britânica que participou da coordenação do evento. A plataforma de comunicação
para a Copa do Mundo do Brasil prevê três bilhões de espectadores em todo o
planeta bombardeados durante mais de um mês com 73 mil horas de transmissão do
país pelo rádio e pela televisão – sem contar as redes sociais. E nem precisa
mudar o jeitinho brasileiro.
Créditos da foto:
Getty Images
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