quinta-feira, 24 de julho de 2014

Saúde em Português descontente e indignada com entrada da Guiné Equatorial




Coimbra, 24 jul (Lusa) -- A organização não-governamental para o desenvolvimento Saúde em Português manifestou-se descontente e indignada com a entrada da Guiné Equatorial para a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), aprovada por consenso na quarta-feira.

A adesão da Guiné Equatorial "desprestigia a CPLP" e "prejudica o seu potencial solidário e humanitário", sustentou a Saúde em Português, num comunicado hoje divulgado para afirmar o seu "descontentamento e indignação" com a decisão da CPLP.

Trata-se de "uma tentativa de branqueamento de um regime ditatorial e que desrespeita claramente os direitos humanos", que "pautam a atuação da CPLP e pelos quais tem vindo a lutar desde a sua criação [em 1996]", disse à agência Lusa Ana Rita Brito, diretora executiva do Departamento de Cooperação da Saúde em Português.

Com a decisão, fica "maculada a imagem da CPLP junto da comunidade internacional", pois a Guiné Equatorial vive num regime que "tem ainda processos criminais internacionais pendentes em países de relevo na cena internacional, como França e Estados Unidos da América", disse.

Continua por "demonstrar (factualmente) a abolição (e não apenas a moratória) da pena de morte e a adoção de medidas que promovam o uso e ensino da língua portuguesa", naquele país africano, afirmou Ana Rita Brito, sublinhando que estas condições foram consideradas pela CPLP como "requisitos mínimos para a adesão da Guiné Equatorial" à comunidade.

A CPLP aprovou na IX Conferência de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, em 2012, em Maputo (Moçambique), aquelas condições como pressupostos indispensáveis para permitir a adesão da Guiné Equatorial, recordou a Saúde em Português.

"Fica também por provar o fim das limitações à liberdade de imprensa, expressão, associação e manifestação, bem como dos maus-tratos a prisioneiros, detenções arbitrárias, tortura e corrupção na Guiné Equatorial", salientou ainda a organização não-governamental sediada em Coimbra.

A inclusão da Guiné Equatorial na CPLP "deveria envergonhar uma comunidade que se guia por princípios tão nobres como o primado da paz, da democracia, da justiça social e dos direitos humanos", defendeu Ana Rita Brito, que disse não acreditar, "pelo menos enquanto não forem adotadas na prática uma série de medidas", que o regime daquele país sofra alterações positivas por passar a pertencer à comunidade lusófona.

A X Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP aprovou na quarta-feira, em Díli (Timor Leste), a adesão da Guiné Equatorial como Estado membro da organização.

Durante a cimeira, os líderes da CPLP reiteraram "o empenho da comunidade em continuar a apoiar as autoridades do país no pleno cumprimento das disposições estatutárias da CPLP, no que respeita à adoção e utilização efetiva da língua portuguesa, à adoção da moratória da pena de morte, até à sua abolição, e demais acervo da CPLP no respetivo ordenamento interno da Guiné Equatorial".

Integram agora a CPLP Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

JEF (MSE/JH) // VM - Lusa

Investigador cabo-verdiano lamenta adesão da Guiné Equatorial, oposição congratula-se

Cidade da Praia, 24 jul (Lusa) - O investigador cabo-verdiano Corsino Tolentino condenou hoje a adesão da Guiné Equatorial à comunidade lusófona, considerando que será prejudicial para a imagem das duas partes, enquanto o maior partido da oposição se congratulou com a decisão.

Em declarações à agência Lusa, o antigo ministro da Educação, embaixador e ex-diretor geral da Fundação Calouste Gulbenkian considerou que na decisão tomada quarta-feira em Díli, Timor-Leste, prevaleceu a "cedência a grupos de pressão", nomeadamente os ligados às grandes empresas de construção e petrolíferas, e que tudo não passa de uma ilusão.

"A adesão vai ser prejudicial para a imagem da CPLP e para a própria Guiné Equatorial, porque se criou a ilusão de que o país está a caminhar para a democracia. Os interesses económicos falaram mais alto. Considero que predomina uma cedência a grupos de pressão, nomeadamente às grandes empresas construtoras e petrolíferas, e que há uma certa ilusão de acesso fácil a esses recursos", afirmou.

Para Corsino Tolentino, atualmente funcionário do Ministério das Relações Exteriores, administrador da Fundação Amílcar Cabral e membro da direção do Instituto da África Ocidental (IAO), a questão da adesão "não foi devidamente debatida".

"Tenho reservas porque a adesão é contra os estatutos da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), pois a organização visa a integração dos povos de língua portuguesa. Não é por haver um decreto a declarar a Guiné Equatorial país de língua portuguesa que ela passa a ser" membro da organização, sustentou.

Corsino Tolentino recorreu ao artigo 6.º dos Estatutos da CPLP, que prevê nos princípios aplicáveis os da democratização da sociedade, proteção dos Direitos Humanos e boa governação.

"Como é possível demonstrar isso na Guiné Equatorial?", questionou, lembrando tratar-se de uma "mera opinião pessoal" e que são os chefes de Estado e de Governo dos oito estados da comunidade lusófona, agora nove, que têm "competência para tomar as decisões".

No entanto, destacou três aspetos positivos da cimeira de Díli: o de se realizar pela primeira vez em Timor-Leste, o do regresso da Guiné-Bissau à CPLP e a da prioridade dada à economia e educação nos debates que estão previstos.

Por seu lado, o presidente do Movimento para a Democracia (MpD, maior partido da oposição cabo-verdiana), Ulisses Correia e Silva, num comunicado, congratulou-se com a entrada da Guiné Equatorial na CPLP, salientando que houve um conjunto de critérios que foram cumpridos para que a decisão fosse tomada.

"Houve alguns avanços, nomeadamente em termos de adoção do português como língua oficial e a suspensão da pena de morte. Por isso, a comunidade entendeu que estariam criadas as condições para que esse processo fosse evolutivo", sustentou.

Para Correia e Silva, estando na CPLP, "há mais condições para pressionar uma evolução positiva em todo o quadro democrático de liberdade e de direitos humanos" da Guiné Equatorial",

JSD // APN - Lusa

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