A
hipótese de o Estado apoiar o BES já foi afastada por Pedro Passos Coelho e por
Maria Luís Albuquerque, que poderão ser forçados a rever as suas declarações
CRISTINA FERREIRA - Público
Há
várias soluções que o Estado pode seguir para ajudar o BES a sair do impasse:
emissão de uma garantia do Estado, transferência de activos tóxicos para a
esfera pública ou uma recapitalização.
Perante
a declaração histórica dos maiores
prejuízos [apesar de semestrais] de sempre da economia portuguesa, de
quase 3,6 mil milhões de euros, o Estado prepara-se para ter um papel decisivo
na resolução do dossier BES, no contexto da União Bancária europeia.
Com
os analistas a estimarem as necessidades de financiamento do BES entre 3000 e
4000 milhões de euros (mais de metade do seu capital), as cotações
a caírem a pique e os clientes do banco a darem sinais de inquietação,
aumenta a pressão para que a gestão encontre um desfecho rápido para
estabilizar o banco.
O
acerto final das contas referentes à actividade semestral do BES traduziu-se
num prejuízo de 3577 milhões e no registo de imparidade e contingências de 4253
milhões de euros, o que levou o Banco de Portugal a neutralizar
os interesses da família Espírito Santo no banco. Os valores são
expressivos e atiraram o rácio de capital Core Tier 1 para 5%, abaixo dos 7%
recomendados, o que impede o BES de passar no exame dos testes de stress
europeus.
Foi,
aliás, esta situação que levou Vitor Bento, depois da apresentação das contas
semestrais na quarta-feira, a anunciar que encomendou o novo plano de
recapitalização ao Deutsche Bank, mas não informou se será por via pública,
privada ou mista. O tema esteve no centro do debate nesta quinta-feira. A
agência Bloomberg considerou que “o BES poderá precisar de fazer um aumento de
capital até quatro mil milhões de euros” e o BPI menciona um valor entre 3 e 4
mil milhões de euros.
A
hipótese de o Estado apoiar o BES já foi afastada por Pedro Passos Coelho e por
Maria Luís Albuquerque, que poderão ser forçados a rever as suas declarações. O
primeiro sinal surgiu nesta quinta-feira pela voz de Luís Marques Guedes, que admitiu
potenciais “impactos para a economia” se a crise no Grupo Espírito
Santo (GES) se acentuar. O ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares
não descartou uma participação do Estado na recapitalização do banco, mas
defendeu que “a primeira linha” de salvamento do BES “deve passar
necessariamente primeiro pelo mercado, pelos accionistas privados”.
Uma
posição alinhada com Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, que
já disse que recebeu manifestações de interesse por parte de privados, o que
também afirmou o presidente executivo Vítor Bento. Um dos investidores que
contactou as autoridades foi um fundo que esteve activo na resolução da crise
da banca grega. Por seu turno, o Bradesco, accionista de referência do BES,
avisou que não acompanhará o aumento de capital projectado.
A
questão é saber se, sem o Estado a dar um sinal inequívoco de que intervém no
banco, os privados aceitam “meter-se” na instituição, pois a tendência é para
contornar os riscos. E são várias as questões ainda sem resposta: Qual é a
verdadeira situação do BES? Quem
manda? Quem são os reais detentores do capital (há posições a garantir dívida)?
Qual a extensão das ilicitudes (nos primeiros seis meses do ano, o BES criou
veículos especiais para investirem em dívida emitida pelo próprio banco)?
Qual a natureza das potenciais litigâncias jurídicas e policiais? Que garantias
há de que as contas do próximo trimestre não trarão surpresas?
E
há ainda o tema da exposição da instituição ao GES, que se tornou
incontornável, pois os problemas da esfera familiar têm acabado a desaguar no
BES, o que levou às sucessivas emendas das contas.
Os
desafios que as autoridades têm pela frente impõem, portanto, decisões não
precipitadas, mas rápidas, para travar eventuais ondas de choque
resultantes de novas revelações. E impedir que a “insegurança” sobre a boa
saúde do banco continue a contaminar a confiança dos clientes.
Daí
que, conforme apurou o PÚBLICO, as autoridades estejam articuladas (BdP,
Governo, Europa e gestão do BES) a estudar (pela primeira vez) como é que,
dentro do novo quadro jurídico criado pela União Bancária, o Estado pode intervir
no BES. Há várias soluções (ou uma mistura delas): emissão de uma garantia
pública, apoio formal à nova gestão (Vitor Bento não foi indicado pelo Estado,
mas pelos accionistas e 20% do capital, detido pela família Espírito Santo, já
perdeu o poder de voto), separação dos activos tóxicos para serem geridos na
esfera pública e venda da parte rentável, e ainda a injecção de fundos
estatais ou a recapitalização pela linha criada pela troika, ainda em vigor.
Ao
contrário de 2008, quando o BPN foi nacionalizado, em que não existia um quadro
jurídico e o Estado se responsabilizou pelas perdas, hoje há instrumentos que
impedem que sejam os contribuintes a assumir os prejuízos resultantes de erros
de gestores imprudentes e pouco sérios. E as consequências de uma intervenção
estatal no BES são “fortes” e imediatas: os accionistas “perdem” o que
investiram, bem como os detentores de dívida subordinada. Se, por hipótese (o
que não é provável), o Estado subscrevesse um aumento de capital de 3 mil
milhões de euros, ficaria com 70% do BES. O mesmo se passará se fossem
privados.
Uma
das vias que tem sido, aliás, sugerida por Carlos Costa é a do recurso aos 6
mil milhões de euros do fundo estatal de recapitalização. Mas já não será nos
mesmos moldes “suaves” que beneficiaram o BCP, o BPI e o Banif, dado que as
regras (do regime de transição) que decorrem da entrada em vigor da União
Bancária são agora mais severas. O governador do BdP garantiu já que a
solvabilidade do BES não está em causa.
Por
enquanto, o problema parece estar circunscrito ao segundo maior banco privado
que voltou nesta quinta-feira a sofrer na bolsa portuguesa, com os investidores
a reflectirem os receios em torno de novo reforço de capital. Mas o dia foi
sobretudo negro para os subscritores (muitos clientes de retalho) do último
aumento de capital de Maio (reforço de 1,04 mil milhões) colocado a 65 cêntimos
e que assistiram à queda a pique da cotação (42,07%) que fechou a 0,201 euros
(e esteve durante a manhã 0,16 euros). Já os restantes bancos encerraram com
quedas menos fortes: BCP (4,37%), BPI (0,99%), Banif (3,23%).
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