Paulo
Baldaia – Diário de Notícias, opinião
Já
ninguém está preocupado com a família Espírito Santo e poucos são os que se
preocupam com o Governo, os partidos que o apoiam e o regulador. A todos
podemos substituir, mas a pancada que volta a sobrar para os portugueses vai
doer muito mais do que é possível imaginar.
Esses
portugueses são pequenos accionistas, trabalhadores de empresas que acabarão
por falir, que dependem de um sistema bancário que passa de bestial a besta e
de uma economia que dava sinais de recuperação e que ameaça entrar novamente em depressão. Por
muito que a elite pense que sim, a necessidade de o Estado intervir para salvar
um banco que julgávamos salvo não é o problema maior.
Este
país não tem solução enquanto todos os poderes pactuarem com um sistema que
favorece o enriquecimento ilícito, que julga na praça pública por ser incapaz
de fazer justiça nos tribunais, que despreza a competência e aplaude o
amiguísmo, que se mostra totalmente incapaz de promover a igualdade de
oportunidades. Um sistema que recicla os donos disto tudo mas apenas para
substituir uns pelos outros.
O
capitalismo sem ética, a que aludiu o Papa Francisco como uma das principais
chagas do mundo moderno, é que nos tem arrastado de desgraça em desgraça. Agora ,
que começávamos a pôr a cabeça fora de água, aproximando as nossas despesas das
nossas receitas, podemos ter de começar todo o calvário de novo. O pior é que
muita gente, muita gente mesmo, não tem como aguentar nova tragédia que obrigue
o Governo a cobrar mais impostos, a banca a reter capital e as empresas a
despedir.
Tudo
isto é mau, muito mau mesmo, mas ainda não é o pior dos pesadelos. Imaginem que
Ricardo Salgado, tocado pelas santas palavras do Bispo de Roma, resolve
redimir-se do seu capital pecado e confessar o carácter diabólico que presidiu
às suas relações nas últimas décadas. É que não há banco do regime sem regime,
nem regime sem titulares do poder, nem corruptores sem corruptos. Nós sabemos
como, entre as migalhas e os grandes banquetes, muita gente comeu à mesa do
último banqueiro.
Se
ele se confessa, o colapso que se abateu sobre a família Espírito Santo será de
repercussões bem maiores, envolvendo outros banqueiros, empresários que foram
apenas testas-de-ferro, milionários de toda a espécie, dezenas ou centenas de
políticos, alguns jornalistas e magistrados... Não faço ideia se ficaria pedra
sobre pedra e até imagino que esta catarse deixaria mais feridas do que curas,
mas, pelo menos, viveríamos na verdade.
Deve
ser porque vejo muita gente com medo que Ricardo Salgado conte tudo o que sabe
que este pesadelo parece real. Ele, afinal, ainda tem muito poder. A destruição
criativa continua nas mãos deste homem.
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