Os
imigrantes portugueses no Brasil podem ter as melhores padarias, mas ninguém
consome tanto pão como os brasileiros
João
Almeida Moreira - Dinheiro Vivo
O
Brasil pode ser o maior produtor de café mas quem conhece o movimento de uma
pastelaria lisboeta pela manhã sabe que ninguém reverencia tanto a bebida como
os portugueses: ao balcão, juntam-se centenas de consumidores a pedir uma bica
cheia, uma italiana, um café normal, uma meia de leite, um pingado, um galão,
um garoto, um descafeinado, um carioca, um carioca de limão, um duplo, um café
com cheirinho, um abatanado, um escorrido ou um americano e tudo em duas
versões, chávena fria ou em chávena quente, para complicar.
Por
tradição, podem ser os imigrantes portugueses no Brasil os donos das melhores
padarias, mas ninguém consome pela manhã tantas variedades e formatos de pão
como os brasileiros: ao balcão juntam-se centenas de consumidores a pedir pão francês,
pão árabe, pão de mel, pão de centeio, pão de queijo, pão integral, pão francês
integral, baguete, pão preto, pão sírio, misto light, bauru, torrada pão de
forma, panini, pão na chapa com requeijão, pão na chapa com polenguinho, e tudo
em três versões, com muita, pouca ou nenhuma manteiga, para complicar.
Pois
o quilo do pão, essa paixão brasileira, está ao preço do frango, segundo
pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, com média
de seis reais (mais ou menos dois euros) podendo atingir o dobro ou até o
triplo na valorizada zona sul do Rio de Janeiro. De 2010 - ano da eleição de
Dilma Rousseff - até Maio deste ano, a subida do preço foi de 51 por cento no
país e 61, se considerarmos apenas a Cidade Maravilhosa. O pão, o básico
fundamento do pequeno almoço brasileiro, teve subida superior à carne no mesmo
período.
A
culpa, diz Guido Mantega, ministro da Fazenda de Dilma, é de um problema na
colheita.
Da
mesma forma que, para ele, o baixo crescimento económico do país é culpa da
conjuntura internacional - embora os EUA, onde a crise começou, estejam a
crescer, a Europa dê sinais de recuperação, os outros BRIC mantenham ritmo
razoável e a maioria dos vizinhos sul-americanos atraiam investimento como
nunca.
Aliás,
segundo o seu diagnóstico, o crescimento do PIB abaixo das expetativas no
primeiro semestre deste ano também não foi culpa sua: foi, acreditem,
"culpa da Copa" porque houve menos dias úteis prejudicando o comércio
e a indústria.
Considerado
por analistas independentes e da oposição como o pior Ministro da Fazenda na
história do país, o brasileiro nascido em Génova, Itália, "perdeu o
respeito porque diz uma coisa e faz outra", sentenciou Luís Carlos Ewald,
conhecido no Brasil por Senhor Dinheiro, por causa de pequenas aulas de gestão
televisivas.
Já
cometeu erros de cálculo, já maquilhou números como um espertalhão, já induziu
a presidente em erro em entrevistas a jornais internacionais relevantes, já foi
apontado como o vilão da política económica brasileira pelo The Economist, é
considerado, em suma, o calcanhar de Aquiles do consulado de Dilma, ou muito
pior do que isso, porque a importância da economia num programa de governo é
muito superior ao de um calcanhar - é o coração, que bombeia sangue para o
organismo todo.
"O
governo tem de aplicar um remédio já para evitar um descontrole de
preços", alertou, não um analista independente ou da oposição, mas o
próprio Luiz Inácio Lula da Silva, maior "acionista político" do
governo, há dois meses. Lula referia-se, entre outros erros de Mantega que
minam a credibilidade da gestão de 12 anos do seu PT, a produtos tão amados
como o pão.
Se
o Brasil fosse uma padaria, se os fregueses fossem os eleitores do próximo dia
5 de Outubro e se Dilma fosse um pão, a clientela até nem se importaria de
arriscar outra vez uma Dilma ao pequeno almoço. Desde que com pouca ou nenhuma
Mantega.
PS:
Já depois deste texto estar escrito, Dilma anunciou que, caso eleita, trocará
de ministro da Fazenda.
*Jornalista - Escreve
à quarta-feira - Crónicas
de um português emigrado no Brasil
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