Pedro
Marques Lopes – Diário de Notícias, opinião
1 Não
entendo a surpresa de tanta gente com a permanência de Paula Teixeira da Cruz e
de Nuno Crato no governo. É que das duas uma: ou eram eles a pedir a demissão
ou teria de ser o primeiro-ministro a demiti-los.
Como
é público e notório, nenhum dos dois ministros tem consciência da sua
incompetência. Um escarnece dos cidadãos e das vidas de milhares de alunos e
muitos professores brincando com tempos verbais. A senhora ministra, no
intervalo da sua enésima declaração sobre pedofilia, diz que o que se passa nos
tribunais não é grave, ou seja, a justiça civil parada é apenas um contratempo.
E até pedem desculpa, como se a gravidade dos seus erros políticos fosse apenas
uma travessura. Sendo este um governo que fala tanto do exemplo da gestão de
empresas privadas - apesar de tão poucos terem esse tipo de experiência a sério
-, talvez não fosse má ideia perguntar a um homem com provas dadas, António
Pires de Lima, por exemplo, o que faria a um seu administrador que decidisse
fazer uma mudança no software e que por causa disso a empresa ficasse sem poder
faturar dois meses ou mais. Ou a um que mudasse um sistema de alocação de
recursos e o resultado fosse a incapacidade duma fábrica funcionar normalmente.
Por
outro lado, se o primeiro-ministro os demitisse, seria como apresentar a sua
própria demissão ou, pelo menos, seria a confissão final do seu estrondoso
fracasso. Seria o último espasmo dum estertor que já vai longuíssimo. É que só
sobram eles do grupo que era considerado chave para a revolução anunciada. São
eles os últimos dos visionários que iam transformar Portugal, e que, para mal
dos nossos pecados, em grande parte, conseguiram.
Tínhamos
o grande ideólogo, Vítor Gaspar, que se foi embora porque percebeu que se tinha
enganado - aliás, voltou a escrevê-lo esta semana, indiretamente, num relatório
do FMI que é mais um momento da sua espetacular mudança de ideias. Miguel
Relvas, a alma gémea de Passos Coelho, que não saiu pela sua gigantesca
incompetência na coordenação política, nem por ter mentido descaradamente no
Parlamento, nem por ter tido uma atitude vergonhosa com uma jornalista, mas por
querer ser licenciado sem se dar ao trabalho de estudar para isso. Mesmo assim,
e foi ele que o declarou, saiu porque quis sair. Santos Pereira, o homem que
escreveu um livro onde garantia saber a fórmula para a mudança estrutural da
nossa economia com muita atitude e pastéis de nata. O Álvaro saiu porque, bom,
incompetência já não era a palavra apropriada, a coisa estava no âmbito da
gargalhada.
O
ramalhete revolucionário completava-se com Nuno Crato e Paula Teixeira da Cruz.
Também eles eram a vanguarda da revolução, pessoas que iam mudar dois setores
fundamentais para a comunidade. Ele era o homem que queria dinamitar o
ministério (pelos vistos: uma vez extremista, sempre extremista), exames com
fartura, o fim do facilitismo num sistema com uma taxa de reprovações e
abandono escolar muito acima da média europeia. Nem vale a pena perguntar ao
ministro o que pensa agora sobre o rigor e a responsabilização que apregoava.
Na
Justiça seria o fim da lentidão, o fim da impunidade e a mais importante
reforma na Justiça dos últimos duzentos anos (a ignorância é dum atrevimento
sem fim).
O
disfarce comum para a incompetência e a ignorância é a ideologia. Ou melhor, a
invenção duma qualquer ideologia. É por isso que ouvimos que isto são apenas
problemas normais que acontecem sempre nas grandes transformações.
Passos
Coelho aguentará estes autênticos símbolos de incompetência o mais que puder -
como aguentou até ao limite os outros -, convencido de que eles esconderão a de
quem os escolheu e promoveu. Vai tarde. Já todos percebemos quem é o maior
incompetente.
2 Todo
este espetáculo do fim do BES, e agora da PT, é demasiado português para o
olharmos sem sentirmos vergonha da comunidade que fomos criando. Amigos que
promovem amigos que depois os ajudam utilizando bens e recursos que não são
deles, homens que aceitam vender um bocado da alma para singrar na vida,
criação de autênticos heróis nacionais que passada meia dúzia de meses passam a
vilões e claro, não podia faltar, muita falta de vergonha.
Por
falar em falta de vergonha, na mesma semana que o primeiro-ministro e a
ministra das Finanças vieram admitir aquilo que já todos sabíamos, que o caso
BES ia ter custos para os contribuintes, o primeiro-ministro janta pública,
amistosa e calmamente com José Maria Ricciardi, presidente do Banco Espírito
Santo Investimentos.
Escusado
será dizer que o sr. Ricciardi não tem nada que ver com o que aconteceu com o
BES e com o GES, nunca soube de rigorosamente nada do que se estava a passar,
fez os possíveis e os impossíveis para evitar tudo o que veio a acontecer. Às
tantas, o jantar serviu para preparar uma homenagem pública ao sr. Ricciardi. A
oeste nada de novo.
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