William
Tonet – Folha 8 Digital, 29 novembro 2014
O
monopólio da imprensa em Angola, a perseguição dos órgãos independentes tornam
actual uma revista ao pensamento de Claude Bertrand, para percebermos os
riscos, que a incipiente democracia sofrerá com a concentração de todos os
órgãos de comunicação social, exclusivamente, na esfera de empresários do
regime.
Mais
a concentração torna mudo muitos actos ilícitos de perseguição, assassinatos e
destruição de bens, como ocorreu no 28 de Novembro, em Cabinda com a residência
do deputado da UNITA, Raúl Danda, uma semana depois dele ter criticado o fraco
desempenho governamental, na implantação dos projectos no enclave.
A
maioria da imprensa não comentou. É mera coincidência?
Não!
É
fruto dos monopólios e da manipulação da liberdade de imprensa e de expressão.
Não
é surpreendente que as pesquisas indiquem uma desconfiança á mídia e uma
tendência a restringir a sua liberdade. Nos Estados Unidos, três quartos dos
usuários têm confiança limitada na mídia, somente um terço dos françeses crêem
na independência dos jornalistas. E, por outro lado, os diversos públicos exprimem
o seu profundo descontentamento com o entretenimento que a mídia oferece.
Paradoxo:
acusa-se a mídia de todos os males embora ela nunca tenha sido melhor do que
hoje. Para convencer-se disso, basta folhear os jornais do século passado, ver
alguns programas de televisão dos anos 50 ou ler as vituperações dos críticos
de antigamente. Melhor hoje portanto, mas mediocre. Ora, se antigamente a
maioria das pessoas podia passar sem meios de comunicação, hoje em dia, mesmo
nas nações rurais, sente-se necessidade, não só de mídia, mas de mídia de
qualidade. E a sua melhoria não é simplesmente uma mudança desejável: o
destino da humanidade depende disso. Efectivamente, só a democracia pode assegurar
a sobrevivência da civilização, e não pode haver democracia sem cidadãos bem
informados, e não pode haver tais cidadãos sem mídia de qualidade.
Essa
afirmação é excessiva? A resposta vem da ex-URSS onde, entre 1917 e os anos 80,
centenas de milhares de livros antigos e obras de arte foram destruídos,
espaços imensos foram irremediavelmente poluídos, dezenas de milhões de
pessoas foram mortas-sem que a mídia soviética tenha querido revelar e
protestar.
Se
a mídia não cumpre bem as suas funções, um problema crucial em toda sociedade
cabe numa pergunta: como melhorá-la?
A
mídia-diz-se que ela constitui ao mesmo tempo uma indústria, um serviço
público e uma instituição política. Na verdade, nem todos os meios de
comunicação fazem parte desta natureza tríplice: primeiro, a nova tecnologia
permite o renascer de um artesanato. Por outro lado, uma parte da produção da
mídia não consiste absolutamente num serviço público (por exemplo, a imprensa
sensacionalista). Enfim, numerosos veículos (como os milhares de revistas
profissionais) não desempenham nenhum papel na vidas política.
Apesar
disso, os órgãos com os quais se preocupam os cidadãos esclarecidos são os
meios de informação geral, que não podem desfazer-se de nenhum dos três
caracteres.
Conflito
de liberdades-consequentemente, encontramo-nos frente a um conflito
fundamenta lentre liberdade de empresa e liberdade de expressão. Para os
empresários da mídia (e os anunciantes), a informação e o entretenimento são
um material com o qual exploram um recurso natural, o consumidor, e tentam manter
uma ordem estabelecida que lhes é lucrativa. Para os cidadãos, pelo contrário,
informação e entretenimento são uma arma na sua luta pela felicidade, que não
podem alcançar sem mudanças na ordem estabelecida.
Para
tal antagonismo não há uma solução simples. Durante decênios, duas foram
praticadas em mais da metade das nações do globo. Consistem em eliminar um dos
dois antogonistas: as ditaduras de tipo fascista suprimem a liberdade de
expressão sem tocar habitualmente na propriedade dos meios de comunicação. Os regimes
comunistas suprimem a liberdade de empresa, pretendendo manter a liberdade de
expressão. O resultado é o mesmo nos dois casos: a imprensa mutilada torna-se
um instrumento de estupidez e de doutrinação.
Uma
opção seria conceder á indústria da mídia liberdade (política) total. Com
efeito, o fim do monopolio estatal e do controlo governamental do rádio e da
televisão na Europa, nos anos 70 e 80, fez muito pela democracia e pelo
desenvolvimento da mídia. Mas a sua comercialização crescente no século XX e a
concentração da propriedade não combinam mal com o pluralismo. A
“conglomerização” combina bem com a necessária independência da mídia. Se
houvesse total liberdade, poder-se-ia esperar a prostituição da mídia, tanto
no sector de informação quanto no de entretenimento. Tem-se uma ligeira ideia
disso nos Estados Unidos onde quase toda a mídia é comercial e a regulamentação
mínima. Segundo Eugene Roberts, célebre director de quotidiano, “os jornais,
salvo exepções, concentram-se no aumento de seus lucros a fim de agradar aos accionários”. Com o resultado que, naquele país, um grupo de imprensa pode
chegar a perto de 25% de lucro (Ganet)-enquanto uma emissora de televisão pode
alcançar 50%.
A
finalidade da mídia não pode ser unicamente ganhar dinheiro. Nem ser livre:
liberdade é uma condição necessária mas não suficiente. A finalidade a atingir
é ter uma mídia que atenda bem a todos os cidadãos. Em todo o ocidente industrializado,
a mídia privada desfruta há muito tempo de liberdade política e muito frequentemente
forneceu serviços deploráveis.
É
preciso então, ao contrário, pôr toda a mídia sob o controlo do Estado? A
experiência feita no século XX pelo comunismo e pelo fascismo não realizou nada
para dissipar uma desconfiança secular em relação ao Estado. Teme-se e com
razão que aconteça uma manipulação absoluta das informações e do
entretenimento.
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