O
nosso director, William Tonet, foi hoje, dia 28, ouvido na DNIAP (Direcção
Nacional de Investigação e Acção Penal) de Angola em autos de interrogatório,
condição que o coloca na condição de arguido. O Serviço de Inteligência e
Segurança do Estado, SINSE, considera-se difamado e injuriado pelo que temos
escrito sobre o assassinato de Isaías Cassule e Alves Kamulingue.
Orlando
Castro – Folha 8 Diário
O processo
é relativo a uma notícia publicada no Folha 8 sobre a execução do jornalista
norte-americano James Foley, morto este ano pelos jihadistas do chamado Estado
Islâmico, e em que foi feita uma analogia com os assassinatos dos angolanos
Isaías Cassule e Alves Kamulingue, ocorridos nos dias 27 e 28 de Maio de 2012.
O
julgamento destes cidadãos angolanos continua a decorrer na 6 secção e, como
temos divulgado, todos os dias apresenta elementos novos sem que, contudo, se
vislumbre a condenação dos autores morais, os mandantes, já que os executantes
estão identificados.
Os
activistas Isaías Cassule e Alves Kamulingue foram mortos por “orientação
superior”, disseram em tribunal dois dos acusados do rapto e assassinato.
A
acusação, ou confirmação, foi feita perante o juiz Carlos Baltazar por Manuel
Miranda, antigo investigador do distrito urbano da Ingombota, e Luís Miranda,
ex-chefe dos Serviços de Informação do Comando de Divisão da Ingombota, que
confessaram ter sido os autores do rapto de Alves Kamulingue.
Acrescentaram,
contudo, desconhecer quem disparou mortalmente contra o activista, ao mesmo
tempo que confessaram que a morte de Cassule e Kamulingue tinha sido uma
orientação superior.
Um
dos advogados da defesa, patrocinada pela Associação Mãos Livres, terá dito na
ocasião ser preciso saber quem foram os autores morais dos assassinatos de
Cassule e Kamulingue escondidos por detrás das “ordens superiores”.
Estão
detidos neste processo sete operacionais dos serviços secretos em Luanda e
ainda o delegado e o seu adjunto, António Gamboa Vieira Lopes e Paulo Mota,
respectivamente.
O
julgamento tinha sido suspenso devido à promoção a brigadeiro de António Vieira
Lopes, um dos arguidos, entretanto já revogada, que forçou o Tribunal
Provincial de Luanda a declarar-se, na altura, incompetente para julgar o caso.
Alves
Kamulingue e Isaías Cassule foram assassinados em 2012 quando tentavam
organizar uma manifestação, que visava exigir do Governo angolano o pagamento
de salários em atraso e uma indemnização, enquanto antigos membros da Unidade
de Guarda Presidencial (UGP).
Na
última semana Paulo Mota veio desmentir o seu chefe António Vieira Lopes que
havia dito ter sido uma acção da Polícia. “Tudo que eu fiz, assumo, foi por
ordens superiores do meu chefe. Conheço o caso e nele participei”, terá dito.
Com
base na contradição das declarações, o advogado da Defesa, Afonso Mbinda,
solicitou o contraditório para saber de quem tinha sido a ordem de matar e a
responsabilidade do processo.
Diante
um do outro, o agente Kiko da Polícia acusado de ter sido ele, por ordens
expressas de Paulo Mota, a disparar pediu a este, “como mais velho, para
assumir só, pois fomos nós que cometemos”.
Quando
questionado de quem tinha sido a coordenação dos acontecimentos, disse ter sido
da Segurança.
É
sabido que ambos os activistas estavam envolvidos na organização de uma
manifestação, marcada para o dia 27 de Maio de 2012, envolvendo ex-membros da
Unidade de Guarda Presidencial (UGP) e também desmobilizados.
Os
antigos guardas da UGP cancelaram a sua participação na manifestação, após
encontros mantidos entre representantes seus e o ministro de Estado e chefe da
Casa Militar do presidente da República, general Manuel Hélder Vieira Dias
“Kopelipa”, e o comandante da UGP, general Alfredo Tyaunda.
Para
além dessa questão central, há uma outra não menos importante que requer
esclarecimento. Por que razão estão os assassinatos de Kamulingue e de Cassule
a ser julgados como um mesmo caso, quando os grupos de executantes são
diferentes?
Ao
todo, estão detidos sete elementos, envolvidos nos dois casos. Relativamente ao
caso Kamulingue, encontram-se no banco dos réus dois oficiais do SINSE, o
ex-delegado em Luanda e o seu adjunto, respectivamente António Gamboa Vieira
Lopes e Paulo Mota.
Da
parte da Polícia Nacional respondem em julgamento os então chefes de
Investigação Criminal do Distrito da Ingombota e dos Serviços de Informação do
Comando de Divisão da Ingombota, nomeadamente Manuel Miranda, Luís Miranda e o
operativo da Direcção Provincial de Investigação Criminal (DPIC), Francisco
Pimentel Tenda Daniel “Kiko”, que fuzilou o activista.
Em
relação ao caso Cassule, encontram-se detidos um operativo do MPLA, Tcheu, e o
então chefe de operações do SINSE em Luanda, Fragoso.
Recorde-se
que, em Novembro de 2013, o Folha 8 revelou em exclusivo, pela primeira vez, os
detalhes operacionais sobre os assassinatos dos dois activistas.
E
é por tudo isto que, estando provado que Cassule e Kamulingue forram
assassinados, conhecendo-se os confessos executores, o SINSE move um
processo-crime, por difamação e injúrias, contra o nosso director.
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