Líbia - PCB - [Gleen Greenwald e
Murtaza Hussain, traduzido pelo pessoal da Vila Vudu] Apenas três anos depois
da intervenção militar pela OTAN contra a Líbia e com a intervenção elogiada
pelos interventores como se tivesse sido retumbante sucesso, a Líbia é país em
colapso total. A violência e a anarquia são de tal modo disseminadas, que
"praticamente nenhum líbio consegue viver vida normal" – escreveu
Stephen Kinzer, da Brown University, no Boston Globe, semana passada.
Mês
passado, o Parlamento líbio, sem exército funcional que lhe garanta proteção
contra milícias fortemente armadas, foi obrigado a fugir de Trípoli e
abrigar-se num barco grego.
O
New York Times noticiou em setembro que:
(...)
o governo da Líbia declarou (...) que perdeu o controle de seus ministérios
para uma coalizão de milícias que tomou a capital, Trípoli, em mais um sinal
claro do esfacelamento do estado.
A
luta sectária e atraso nos pagamentos destruíram quaisquer tentativas que EUA e
Grã-Bretanha tenham feito para treinar soldados líbios, o que levou os dois
países, semana passada, a abandonar completamente programas futuros:
(...)
nenhum único soldado foi treinado pelos EUA, porque o governo líbio não
compareceu com o dinheiro prometido.
A
Agência Associated Press noticia hoje que uma cidade inteira, Derna, rendeu-se
e jurou fidelidade ao Estado Islâmico no Iraque e Levante [ing. ISIS],
(...)
tornando-se a primeira cidade fora do Iraque e da Síria a unir-se ao 'califado'
anunciado pelo grupo extremista.
Relatório
distribuído pela ONG Anistia Internacional há duas semanas, documentava que:
(...)
milícias foras-da-lei e grupos ilegalmente armados de todos os lados do
conflito na Líbia ocidental, cometem cada vez mais e maiores crimes de abusos
de direitos humanos, inclusive crimes de guerra.
Em
suma, é quase impossível exagerar os horrores que os líbios são obrigados a
enfrentar diariamente, e a miséria tomou conta do país.
Tudo
isso leva a uma pergunta óbvia: que fim levaram todos os
"humanitários" que tanto insistiram que seriam movidos por profunda e
nobre preocupação pelo bem-estar do povo líbio, quando clamavam a favor da
intervenção pela OTAN? Quase sem exceção, os que advogavam a favor de ação
militar da OTAN em campo na Líbia sempre disseram que a ação seria motivada,
não por objetivos primariamente estratégicos, ou pelos recursos naturais
líbios, mas por puro altruísmo.
Nicholas
Kristof, do New York Times, escreveu:
(...)
a Líbia nos faz lembrar que às vezes é possível usar ferramentas militares para
fazer avançar causas humanitárias.
Anne-Marie
Slaughter, ex-assessora do governo Obama, clamava que
(...)
a intervenção tinha a ver com manter "valores universais" os quais,
por sua vez, encaminhariam na direção de alcançar os objetivos estratégicos dos
EUA.
Ao
justificar a guerra ante os norte-americanos (mais de uma semana depois de os
ataques já terem começado), o presidente Obama decretou:
(...)
há nações capazes de fingir que não veem atrocidades em outros países. Os EUA,
não. Os Estados Unidos da América são diferentes.
O
caso é que "fingir que não veem" as atrocidades atuais – e atualmente
ainda muito piores que antes – na Líbia é, precisamente, o que fazem hoje os EUA,
seus aliados e a grande maioria dos "humanitários" que tanto pregaram
guerras e mais guerras. De fato, depois que o bombardeio foi suspenso, os
pró-guerra só se mantiveram interessados na sorte do povo líbio por tempo
suficiente para se vangloriarem da própria "clarividência" e para
vingar-se dos que haviam discordado deles.
Slaughter
teve sua "volta da vitória" com uma coluna assinada no Financial
Times do dia 24/8/2011, sob o título:"Por que se comprovou que os céticos
quanto à ajuda humanitária à Líbia sempre estiveram errados" [orig. Why
Líbia sceptics were proved badly wrong]. Nessa coluna ela desqualifica todos
que diziam que "ainda é cedo para avaliar" e que:
(...)
em um ano, ou numa década, a Líbia corre o risco de desintegrar-se em conflitos
tribais ou em insurgências islamistas, ou racha ao meio, ou apenas passa, de um
ditador, para outro.
E
insiste que nada jamais poderia ser pior que deixar Gaddafi no poder. Assim
sendo, então,
(...)
a Líbia é a prova de que o ocidente, afinal, é capaz de fazer escolhas com
sabedoria.
Assim
também Kristof aproveitou seu momento de fama para celebrar o quanto sempre
acertara em suas avaliações e previsões e balanços, para visitar Trípoli no
mesmo mês de agosto, e de lá anunciou que os norte-americanos eram vistos como
heróis pelos líbios agradecidos. Embora toda sua coluna fosse carregada de
ressalvas, sobre inúmeras coisas que ainda poderiam acabar terrivelmente mal, o
colunista mesmo assim não se envergonhou de escrever que:
(...)
essa foi das raras forças de intervenção militar movidas por razões
humanitárias, e teve sucesso (...) e que (...) só em raros momentos há forças
militares capazes de promover direitos humanos. A Líbia até aqui é modelo para
esse tipo de intervenção.
Quando
a derrota de Gaddafi já era iminente o blog Think Progress, que apoia a Casa
Branca, explorou as emoções resultantes (exatamente como os Republicanos
fizeram quando Saddam foi capturado), para provocar os Republicanos: "Será
que John Boehner ainda acha que as operações militares dos EUA na Líbia são
ilegais?" – Como se assassinar Gaddafi pudesse justificar aquela guerra,
mesmo depois de o Congresso ter negado autorização para os ataques, ou, então,
como se o assassinato de Gaddafi pudesse, só ele, assegurar resultado que
favorecesse os líbios.
A
mesma cena de patética autocongratulação repetiu-se também em outros países que
participam da guerra.
No
momento em que o Canadá encenava um espantoso desfile militar comemorativo da
vitória na Líbia, com exibição de aviões da Força Aérea sobre o Parlamento em
Ottawa, a Líbia mergulhava rapidamente na mais absoluta anarquia, noticiou The
Chronicle Herald.
Em
setembro de 2011, o Christian Science Monitor narrou como
(...)
líderes ocidentais voam paraTrípoli para celebrar a vitória dos rebeldes e oferecer
apoio à nova Líbia, cujo sucesso eles veem como modelo para outras revoluções
árabes. O presidente francês Nicolas Sarkozy e o primeiro-ministro britânico
David Cameron (na foto acima) mergulharam com prazer nos agradecimentos dos líderes
favoritos da OTAN para a transição líbia, por terem combatido uma guerra
"por razões exclusivamente humanitárias".
Fonte:
Pátria Latina
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