Um
cidadão passa cinco anos sem descontar para a segurança social. Depois chega a
primeiro-ministro e manifesta grande preocupação com a sustentabilidade
financeira da segurança social
Ricardo
Araújo Pereira – Visão, opinião
Após ter votado a lei de bases da segurança social, um deputado diz desconhecer as suas obrigações legais para com a segurança social.
Após
ter passado anos a dar aulas de catequese, um catequista diz ter ficado com a
ideia de que a obediência aos mandamentos era opcional.
Um
cidadão passa cinco anos sem descontar para a segurança social. Depois chega a
primeiro-ministro e manifesta grande preocupação com a sustentabilidade
financeira da segurança social.
Um
cidadão passa cinco anos sem tomar banho. Depois fica incomodado quando
partilha o elevador com um vizinho que acabou de chegar do ginásio.
Um
primeiro-ministro admite que cometeu irregularidades mas justifica-se dizendo
que são irregularidades menores do que aquelas que o primeiro-ministro anterior
é acusado de ter cometido.
Um
aluno falha a entrega dos trabalhos de casa mas justifica-se dizendo que não
procedeu tão mal como um aluno que, no ano anterior, tinha roubado a lancheira
a outro menino. A professora lembra-lhe que o facto de outros terem cometido
infracções maiores não o isenta de uma nota negativa. O aluno, mesmo sendo
pequenino, compreende o argumento da professora.
Um
primeiro-ministro apercebe-se, em 2012, que deve dinheiro ao Estado, mas acha
que é mais oportuno fazer o pagamento apenas no fim do seu mandato, para não
criar confusões. Ao mesmo tempo, o seu governo recorre a penhoras automáticas
para executar mais rapidamente as dívidas fiscais.
Um
verdugo apercebe-se, em 2012, que cometeu um delito parecido com os que são
cometidos pelas pessoas que castiga com chibatadas. Passa a dar chibatadas com
mais força, para transmitir a ideia de que a sua adesão à prática delituosa não
significa que a aprove.
Um
primeiro-ministro decide regularizar imediatamente a sua situação fiscal depois
de perceber que o jornal Público descobriu aquilo que ele já sabe desde 2012.
?O ministro da segurança social considera a postura do primeiro-ministro muito
digna.
Um
criminoso decide confessar um crime cometido dez anos antes, e só depois de
terem surgido provas absolutamente claras e indesmentíveis de que o cometeu. O
seu advogado considera a postura do cliente muito digna.
Milhares
de cidadãos falham o pagamento dos impostos na data estipulada e justificam-se
dizendo que o jornal Público não teve a gentileza de os incentivar a saldar a
dívida.
Um
cidadão acumula dívidas e não recebe a respectiva notificação. O sistema que
não o notifica durante cinco anos é o mesmo que não deixa passar cinco dias sem
notificar os outros cidadãos devedores. O ministro da segurança social diz que
o primeiro-ministro foi vítima de um erro do sistema.
Um
cidadão ganha a lotaria. Os seus amigos dizem que foi vítima de um acaso da
sorte
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