domingo, 10 de maio de 2015

Angola. CONVERSAS DE REDES SOCIAIS E OUTRAS



Filomeno Manaças - Jornal de Angola, opinião

O fim do mundo não aconteceu e por isso a vida continua normalmente. Lá para as bandas do Huambo e Benguela quem foi atrás da “má nova” está a constatar, felizmente, que afinal a premonição não passou de uma mentira descabelada.

Algumas seitas religiosas são assim. E quando o presságio do fim do mundo, ou outro qualquer, não acontece, para satisfazer o ego dos seus líderes são capazes de partir para o suicídio colectivo. A obediência cega à crença pode levar a comportamentos irracionais. O mundo está cheio de exemplos dessa natureza.

Pena é que tenhamos políticos que considerem normal que centenas de pessoas se desfaçam dos seus bens, das suas casas, portanto de todos os seus haveres para se refugiarem numa montanha porque alguém terá dito que a vida na terra vai acabar.

Nem nos parece ser de boa sanidade mental política o oportunismo com que vimos outras desgraças serem anunciadas, explorando o efeito multiplicador e potencial de intriga que agora as redes sociais permitem, onde na maior parte das vezes o rigor em relação à qualidade da informação e da comunicação está ostensivamente ausente.

Salvo muito raras excepções, não há a preocupação que se exige ao profissional do jornalismo de apurar os factos, confrontar as fontes, antes de os dar à estampa. Para os consumidores passivos dessa informação, os que não detêm nem os conhecimentos nem as ferramentas para - como bem dizia um velho e já falecido homem da rádio que entre nós esteve e deixou boa fama -, deslindar o embuste, tudo o que vem na rede é peixe.

Até vir à tona a verdade, permanece a ideia de que a informação veiculada tem algum fundo de verdade.

E assim, enquanto o representante da Procuradoria Geral da República no Huambo não se tivesse pronunciado e o próprio também dado a voz e a cara ao mundo, o líder da seita a Luz do Mundo estaria sempre morto.

Coisas não apenas das redes sociais, mas também de certos sítios da Internet, onde a aparência vale mais do que a própria verdade dos factos, afinal um princípio que é caro ao jornalismo e um dos eixos no qual se funda a profissão, razão porque tem um código de ética e deontologia a nortear toda a sua acção para garantir a credibilidade da informação, para impedir que o seu exercício seja banalizado e para assegurar que o seu papel de media seja desempenhado com idoneidade e responsabilidade social.

A não ser assim, estaremos a caminhar para a deriva e a confundir a inquestionável necessidade de pluralidade de linhas editoriais, imprescindível ao reforço da democracia, também no universo da comunicação social, com um campo aberto para a imputação falsa de factos, terreno privilegiado da calúnia, da injúria e da difamação. São os crimes típicos resultantes do abuso da liberdade de imprensa, sobre os quais muitos profissionais da classe preferem nem sequer abordar ou analisar a sua profunda conexão com o código de ética e deontologia, pois entendem que deve imperar uma certa liberalidade no mundo da comunicação social.

Nada mais errado.

Geralmente, essa percepção só muda quando somos nós, os jornalistas, os visados, ou quando, nas barras do Tribunal, somos chamados a fazer prova dos factos e damos conta que, afinal, temos as mãos cheias de nada. Pois é preciso sublinhar que para certos casos, ainda que tenhamos provas e elas atestem que os factos são verídicos e não se trata de difamação, elas não nos isentam ou ilibam de sermos condenados e, por conseguinte, pagarmos a justa indemnização.

No mês que tem o dia 3 dedicado internacionalmente à Liberdade de Imprensa, é bom frisar que a ideia de “liberdade total” soa a um convite à irresponsabilidade, à proliferação de informações falsas com o claro objectivo de criar um ambiente generalizado de descrédito e, desse modo, caminhar-se para o aprofundamento da crise de valores sociais.

É óbvio que, numa outra perspectiva, a positiva, é claro, e para isso é necessário que a informação reúna os requisitos de qualidade, ela se inscreve como contributo para a moralização da sociedade e para influenciar a construção de um outro tipo de mentalidade, mais apropriado ao desenvolvimento que se pretende do país. A mentalidade é também um factor de progresso e ela deve ser vista como estando arreigada não apenas à cultura, mas também ao conhecimento, que deve ser científico, e às boas práticas.

Sabendo que nem todas as conversas nas redes sociais são triviais, pois são diferentes os seus actores e o nível e qualidade de intervenção, mas reconhecendo o seu papel na disseminação de informação e, nalguns casos, da prevalência da “má informação” como suposto “dado adquirido”, aos leitores do Jornal de Angola fica o conselho sobre a necessidade de se questionar sempre a idoneidade da fonte que a fornece.

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