Rui
Sá – Jornal de Notícias, opinião
Se
há evidência nesta campanha eleitoral é a de que só uma segunda volta permitirá
separar as águas, clarificando as opções que verdadeiramente se colocam para o
exercício das funções de presidente da República para os próximos cinco (10?)
anos.
De
facto, e por força da estrondosa derrota que a direita sofreu nas eleições de 4
de outubro, o candidato apoiado por essa mesma direita teve de travestir-se,
vestindo a pele de cordeiro.
Assistimos,
assim, a uma sucessão de afirmações e de atos que claramente não casam com o
perfil do candidato. O homem que foi secretário de Estado, deputado, autarca,
presidente do PSD e conselheiro de Estado nomeado por Cavaco afirma-se
"independente". O homem que defendeu e patrocinou propostas do PSD
com vista ao desmantelamento do Serviço Nacional de Saúde arvora-se em
"defensor" desse mesmo serviço. O homem que, claramente, foi apoiante
do regime fascista e colonial (mas baldando-se à tropa que isso da defesa das
colónias era para os outros...) diz-se, agora, "ser da esquerda da
direita". O homem que se destacou nas artes da intriga política afirma-se
como o "único capaz de construir pontes". O homem que disse que era
necessário "Cristo voltar à Terra" para que ele fosse candidato à
presidência do PSD - coisa que o foi passado poucas semanas sem que se tenham
lido notícias desse regresso divino... - aparece-nos, agora, a apregoar o valor
da sua palavra. O homem que, durante 10 anos, nos entrou dentro de casa por
intermédio do pequeno ecrã, critica, agora e com evidente populismo, os outros
candidatos que têm de gastar dinheiro para fazerem chegar a sua mensagem.
Mas
não é apenas Marcelo a vestir essa pele de cordeiro. Os seus mais relevantes
defensores apoiam-no, mas procuram esconder-se na sombra. Passos Coelho afirma
que não aparece na campanha eleitoral para que as presidenciais não sejam
confundidas com a segunda volta das legislativas. Marcelo, mais criativo (com a
sua conhecida veia de entertainer que tudo diz para nos fazer sorrir...), diz
que Passos Coelho (e Portas) não aparece na campanha eleitoral porque o PSD e o
CDS andam muito envolvidos com as eleições intercalares de S. João da
Madeira...
Honra
seja feita a Alberto João Jardim (pagando a presença de Marcelo, em anos
anteriores, nos célebres festivais do Chão da Lagoa?), que, tal como os líderes
do PSD e do CDS na Madeira, aparece às claras a apoiar Marcelo, defendendo que
só ele pode "equilibrar o país ao centro" - sabendo-se o que
significam, para Jardim, as palavras "equilíbrio" e "centro"
estamos conversados...
Por
isso, uma segunda volta teria o condão de fazer Marcelo (como diria Jorge
Jesus...) "sair da toca". Tendo de se assumir como o candidato do
projeto derrotado a 4 de outubro e que, nos últimos quatro anos, conduziu o
país ao estado em que se encontra.
Por
isso, e como diz Alberto João Jardim, a direita deseja que Marcelo ganhe à
primeira volta, porque "à segunda [volta] é mais difícil"...
Também
por isso, venha lá uma segunda volta!
*Engenheiro
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