segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Portugal. POR UMA SEGUNDA VOLTA


Rui Sá – Jornal de Notícias, opinião

Se há evidência nesta campanha eleitoral é a de que só uma segunda volta permitirá separar as águas, clarificando as opções que verdadeiramente se colocam para o exercício das funções de presidente da República para os próximos cinco (10?) anos.

De facto, e por força da estrondosa derrota que a direita sofreu nas eleições de 4 de outubro, o candidato apoiado por essa mesma direita teve de travestir-se, vestindo a pele de cordeiro.

Assistimos, assim, a uma sucessão de afirmações e de atos que claramente não casam com o perfil do candidato. O homem que foi secretário de Estado, deputado, autarca, presidente do PSD e conselheiro de Estado nomeado por Cavaco afirma-se "independente". O homem que defendeu e patrocinou propostas do PSD com vista ao desmantelamento do Serviço Nacional de Saúde arvora-se em "defensor" desse mesmo serviço. O homem que, claramente, foi apoiante do regime fascista e colonial (mas baldando-se à tropa que isso da defesa das colónias era para os outros...) diz-se, agora, "ser da esquerda da direita". O homem que se destacou nas artes da intriga política afirma-se como o "único capaz de construir pontes". O homem que disse que era necessário "Cristo voltar à Terra" para que ele fosse candidato à presidência do PSD - coisa que o foi passado poucas semanas sem que se tenham lido notícias desse regresso divino... - aparece-nos, agora, a apregoar o valor da sua palavra. O homem que, durante 10 anos, nos entrou dentro de casa por intermédio do pequeno ecrã, critica, agora e com evidente populismo, os outros candidatos que têm de gastar dinheiro para fazerem chegar a sua mensagem.

Mas não é apenas Marcelo a vestir essa pele de cordeiro. Os seus mais relevantes defensores apoiam-no, mas procuram esconder-se na sombra. Passos Coelho afirma que não aparece na campanha eleitoral para que as presidenciais não sejam confundidas com a segunda volta das legislativas. Marcelo, mais criativo (com a sua conhecida veia de entertainer que tudo diz para nos fazer sorrir...), diz que Passos Coelho (e Portas) não aparece na campanha eleitoral porque o PSD e o CDS andam muito envolvidos com as eleições intercalares de S. João da Madeira...

Honra seja feita a Alberto João Jardim (pagando a presença de Marcelo, em anos anteriores, nos célebres festivais do Chão da Lagoa?), que, tal como os líderes do PSD e do CDS na Madeira, aparece às claras a apoiar Marcelo, defendendo que só ele pode "equilibrar o país ao centro" - sabendo-se o que significam, para Jardim, as palavras "equilíbrio" e "centro" estamos conversados...

Por isso, uma segunda volta teria o condão de fazer Marcelo (como diria Jorge Jesus...) "sair da toca". Tendo de se assumir como o candidato do projeto derrotado a 4 de outubro e que, nos últimos quatro anos, conduziu o país ao estado em que se encontra.

Por isso, e como diz Alberto João Jardim, a direita deseja que Marcelo ganhe à primeira volta, porque "à segunda [volta] é mais difícil"...
Também por isso, venha lá uma segunda volta!

*Engenheiro

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