segunda-feira, 13 de março de 2017

Moçambique: CIP DE OLHOS POSTOS NA TRIBUTAÇÃO DA EXXON MOBIL


Fragilidades na legislação deixam a sociedade moçambicana em alerta em relação à entrada da Exxon Mobil no setor dos hidrocarbonetos.

A gigante petrolífera norte-americana Exxon Mobil anunciou, na quinta-feira (09.03), que vai comprar 25% da participação da italiana ENI no projeto Coral, na bacia do Rovuma, norte de Moçambique.

O Governo moçambicano anunciou, esta sexta-feira (10.03), que aguarda por uma comunicação sobre o contrato entre a Exxon Mobil e a ENI, sobre o projeto na Bacia do Rovuma.

A italiana ENI vai continuar a liderar o projeto de gás natural liquefeito no projeto Coral e todas as operações na Área 4, enquanto a Exxon vai liderar a construção e a operação da construção da central de liquefação de gás em terra, segundo a empresa.

Esta transação financeira, avaliada em 2,6 mil milhões de euros, precisa de dois meses para ser concluída e depois disso ser aprovada ou não pelo Governo moçambicano.

Entretanto surgem várias questões que foram levantadas a Fátima Mimbire, especialista em recursos minerais, do Centro de Integridade Pública de Moçambique (CIP).

DW África: As autoridades moçambicanas têm tudo acautelado, em termos de tributação da transação financeira, para que o país não seja prejudicado, à semelhança do que aconteceu com outras operações envolvendo multinacionais do setor dos recursos naturais?

Fátima Mimbire (FM): Queremos acreditar que está tudo acautelado. A grande preocupação é como é que o Governo vai calcular as mais-valias, tendo em conta que no passado tivemos experiências dúbias de tributação das mais-valias.

O Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas (IPRC) referia-se ao valor de 32% de uma matéria tributável, tendo em conta o tempo em que a companhia detém a concessão ou a licença para operar no país. Entretanto, vimos situações em que o próprio Governo aplicou uma outra fórmula, como no caso da Anadarko. Agora, como se vai calcular o valor a ser tributado é outra discussão.

DW África: Quanto mais tempo se demora a implementar o projeto, mais baixas serão também as taxas a ser pagas pelas multinacionais, se considerarmos o Código do IRPC. Será que a Exxon Mobil poderá usar a estratégia de ir arrastando a implementação do projeto para tirar vantagens?

FM: Estas grandes empresas quando vão à procura de países como Moçambique é com o objetivo de aumentar o seu portefólio, com projetos pelo mundo fora, e não necessariamente com o objetivo de priorizar a implementação de projetos. Então, para nós, o ponto fundamental - em jeito de apelo ao próprio Governo - é no sentido de que sim, a transação é feita entre grandes operadoras petrolíferas no mundo, mas é preciso assegurar que o Governo reforce o posicionamento de que queremos ver o projeto a andar. E é de salientar que esses projetos têm estado a ser adiados há bastante tempo.

Houve momentos em que acreditámos que os projetos, da ENI e Anadarko, seriam implementados em 2013. Mas, nessa altura, iniciaram negociações com o Governo que resultaram na aprovação de regimes específicos para as operações petrolíferas, em 2014. Depois, em 2015, as empresas concluíram os seus estudos para submeter ao Governo. E só em 2016 é que tivemos o primeiro projeto a ter o plano de desenvolvimento aprovado. Portanto, estamos com mais de três anos de atraso para aquilo que eram as expectativas inicias. É preciso reforçar que há esse acordo entre as multinacionais, mas isso não deve, de forma alguma, significar estar ativo e manter cativo, à espera de uma oportunidade melhor. Mas sim continuar no ativo e avançar.

DW África: O velho sonho dos moçambicanos de verem este projeto a andar pode ficar em “banho maria” por algum tempo?

FM: Esperamos que não. Mas é um risco, que tem de ser muito bem acautelado pelo próprio Governo. Portanto, o Gobverno tem de ter uma mão de ferro para assegurar que as empresas não fiquem sentadas em cima dos projetos. Espero que a Exxon nos surpreenda pela positiva.

DW África: O facto de Moçambique estar em crise financeira e económica, devido a operações pouco transparentes, retraiu os investimentos estrangeiros e fez com que o país queimasse a sua imagem no mercado internacional. A imagem da Exxon Mobil pode funcionar como uma espécie de encorajamento a outros investidores?

FM: De certa forma pode ser. Mas o facto de Moçambique estar numa lista suja, digamos assim, a nível internacional, por não estar a honrar os seus compromissos, pode ser também um fator de retração, na medida que as empresas – à exceção da Exxon que tem capital próprio e capacidade para sustentar estas operações – nem sempre têm capacidade. Elas descobrem novos projetos e também são influenciáveis pelo mercado. O facto do projeto se localizar em Moçambique e o fato de Moçambique se localizar nesta lista suja de incumprimento, pode ser constrangedor e prejudicar as empresas que querem operar em Moçambique.

Nádia Issufo – Deutsche Welle

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