Guiné-Bissau
continua confrontada com "grande imbróglio político", que exige uma
posição firme do Presidente e uma solução guineense pela via do diálogo,
defende José Ramos-Horta, em entrevista exclusiva à DW África.
O
Prémio Nobel da Paz José Ramos-Horta apela à tranquilidade e ao entendimento na
Guiné-Bissau. O político timorense pede ao Presidente da Guiné-Bissau, José
Mário Vaz, para reunir todas as partes do conflito na base de um diálogo sério
com vista a salvar o país. A iniciativa presidencial, segundo José Ramos-Horta,
deve durar o tempo que for necessário, até que seja possível definir uma agenda
comum para os próximos 18 meses, que contribua para a estabilidade do país
antes de eleições gerais.
Em
Lisboa, José Ramos-Horta concedeu uma entrevista exclusiva à DW África, à
margem das conferências do Estoril, que terminam esta quinta-feira (31.05) em
Cascais, Portugal. O antigo Presidente de Timor-Leste, que representou as
Nações Unidas em Bissau, depois do golpe de Estado de 2012, liderou a missão do
Gabinete Integrado das Nações Unidas para a Consolidação da Paz na Guiné-Bissau
(UNIOGBIS, na sigla em inglês), criada para a consolidação da paz no país.
Para
Ramos-Horta, o Presidente guineense José Mário Vaz "pode ainda salvar a
sua presidência, salvar o país, se for inspirado por essa responsabilidade que
é a de um chefe de Estado. Mas é necessário também que os outros deem as mãos,
que também deem um passo ao encontro do Presidente".
"É preciso encontrar uma fórmula muito guineense para amenizar as tensões,"
refere o homem que também foi ministro dos Negócios Estrangeiros e
primeiro-ministro de Timor-Leste.
Acordo
liderado por "algum amigo"
Ramos-Horta
sugere que a solução para a crise na Guiné-Bissau deveria contar "com a
facilitação de algum amigo, alguém de confiança e com experiência".
"Todos os atores políticos e sociais guineenses participariam para
estudarem uma agenda mínima de ano e meio para acalmar o país, resolver algumas
questões de urgência e - havendo um acordo mínimo que apazigue os ânimos -
vamos então mobilizar apoio da comunidade internacional para ajudar a resolver
a falta de pagamentos, sarar algumas feridas económicas e sociais, algum défice
que há, para também compensar," considera o político timorense.
Ramos-Horta
diz que não quer dar lições a ninguém, mas sim "continuar a ajudar",
facilitando o diálogo como observador - depois de ter servido, durante ano e meio,
como representante especial do secretário-geral das Nações Unidas, no tempo de
Ban Ki-moon.
"Tenho
andado em diálogo com gente das Nações Unidas, alertando o secretário-geral
[António Guterres], o Departamento dos Assuntos Políticos, que é necessário fazer
algo. Não se pode abandonar a Guiné-Bissau. Primeiro, apesar de tudo, o país
não está em guerra. Não é Mali, não é República Centro-Africana nem Sudão do
Sul. É preciso reconhecer o papel das Forças Armadas, que tem-se mostrado com
muita disciplina, muita maturidade, não se imiscuindo mais nas querelas
políticas da Guiné-Bissau. Tem que manter essa postura," defende.
O
papel do Presidente
José
Mário Vaz era um dos oradores das Conferências do Estoril, o qual se avistaria
certamente com Ramos-Horta para falar da difícil situação política na Guiné-Bissau.
Ambos encontraram-se em fevereiro deste ano em Bissau, entre as reuniões de
consulta que o Prémio Nobel da Paz teve com várias autoridades e figuras da
sociedade civil guineense.
Ramos-Horta
esteve no país, na altura, para participar numa conferência sobre reconciliação
e não numa missão de mediação – esclarece. Entende as manifestações de protesto
contra o Presidente porque, afirma, "o povo está cansado, os jovens estão
cansados, as escolas não funcionam, os funcionários não são pagos e, dado o
imbróglio político, a comunidade internacional não liberta os dinheiros
prometidos - e isso gera então contestação".
Devido
a essa situação, "é preciso o Presidente tomar o pulso da situação com
inteligência, com pragmatismo e com humildade," acrescenta.
Ramos-Horta
dá a conhecer que não tem planos para regressar à Guiné-Bissau, mas deixa as
portas abertas caso receba algum convite por parte das instituições soberanas
guineenses, prometendo trabalhar sempre com as representações da Comunidade
Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), União Africana (UA), União
Europeia (UE) e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
João
Carlos (Lisboa) | Deutsche Welle
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