sexta-feira, 21 de julho de 2017

“O posto de trabalho é MEO”: modelo da Altice e trabalhadores transferidos motiva greve histórica



Desde 2006 que os trabalhadores da PT não se mobilizam para uma greve geral contra as condições de trabalho - voltam a fazê-lo esta sexta-feira. Temem despedimento em massa, querem regresso dos trabalhadores à MEO e dizem que há um ambiente intimidatório. BE fala em “faroeste laboral” por parte da Altice. PCP defende a recuperação do controlo público da PT

Os trabalhadores da PT, empresa controlada pela franco-israelita Altice, vão estar esta sexta-feira na rua a protestar contra as novas condições de trabalho e a transmissibilidade de trabalhadores da PT para empresas externas à operadora, uma estratégia de gestão iniciada recentemente. Os trabalhadores temem que este seja o princípio de um processo que poderá levar a um elevado número de despedimentos. O Expresso noticiou, recorde-se, que a Altice chegou a contactar o Governo no sentido de perceber qual a recetividade para avançar com um processo de rescisão bem acima das quotas atuais. Em causa estaria a saída de cerca de três mil trabalhadores.

“Há uma grande motivação para participar na greve geral com o objetivo de contestar o atual modelo de gestão. Apesar do ambiente intimidatório na empresa, acreditamos que irá pesar mais a vontade de fazer greve e lutar por um futuro melhor do que o ambiente persecutório sentido pelos trabalhadores”, diz Francisco Gonçalves, membro da direção da comissão de trabalhadores da PT. “Esta utilização da lei leva à precarização dos trabalhadores e gera preocupação. Até agora foram transferidas, através da figura da transmissibilidade, 155 trabalhadores para outras empresas, e não acreditamos que fique por aqui. Por isso, não descansaremos enquanto estes trabalhadores não regressarem à MEO.”

Entretanto, os sindicatos SICOMP e a União dos Sindicatos Independentes vieram dizer que estão a estudar com a administração da PT formas de atenuar o modelo de transmissibilidade dos trabalhadores para outras empresas e propõem, por exemplo, que estes possam regressar ao universo PT, durante cinco anos, no caso de falência ou encerramento da sociedade para onde foram transferidos.

LUTAR CONTRA A PRECARIEDADE

O objetivo desta greve geral é combater e denunciar a transferência de grupos alargados de trabalhadores da PT para outras empresas, nomeadamente da Altice, que sejam fornecedoras de serviços do antigo operador histórico português.

O processo de transferência começou com a passagem, no início de junho, de 37 trabalhadores da área informática para a Winprovit. E prosseguiu com o anúncio da transferência de mais 118 pessoas para a Tdnord e a Sudtel. São, para já, 155 pessoas.

Trabalhadores e fontes conhecedoras da empresa ouvidas pelo Expresso temem que este seja apenas o início de um significativo processo de transmissão de trabalhadores para empresas da Altice, a maioria criada recentemente, com balanços pequenos e políticas sociais mais frágeis do que as da PT. Em carta enviada a 30 de junho aos deputados da comissão de Trabalho e Segurança Social, um grupo de trabalhadores da PT afirma mesmo que algumas das maiores direções da empresa estão a estudar e a preparar o processo de transmissão de trabalhadores em áreas que vão desde as técnicas (rede) e as operacionais (manutenção/instalação) até às comerciais. A Altice controla a PT desde junho de 2015.

DÚVIDAS E RECEIOS

Os recursos humanos têm dito aos trabalhadores que a sua transmissão, feita ao abrigo da lei e de uma nova diretiva, se faz com “todos os direitos” laborais de base, nomeadamente antiguidade, férias e subsídios. Fica, porém, a dúvida se irão manter-se ou não alguns dos direitos ao abrigo do acordo de empresa. Na informação dada aos sindicatos, a que o Expresso teve acesso, é referido que há uma “integração nas políticas sociais e procedimentos” das empresas para onde os trabalhadores são transferidos. Além disso, os direitos da contratação coletiva — onde está a proteção vitalícia de doença — cessam ao final de um ano. Em resposta ao Expresso, a administração da PT tem passado uma mensagem de tranquilidade. “Existe uma obrigação das empresas que recebem os colaboradores em manter todo o conjunto de benefícios, nomeadamente os consignados em Acordo Coletivo de Trabalho, pelo menos durante um ano. Após esse período, ou mantêm os benefícios ou os mesmos são aumentados ou são substituídos por aqueles em vigor na empresa a essa data”, diz fonte oficial.

DESPEDIMENTOS OU AGILIZAÇÃO?

Há, porém, espaço para interpretação jurídica e há trabalhadores que estão a estudar avançar com providências cautelares e com processos em tribunal. As transferências dos trabalhadores são feitas ao abrigo do artigo 285º e seguintes da lei nº 7/2009 de 12 de fevereiro, do Código do Trabalho. É a primeira vez que a PT invoca este artigo. Sindicatos e trabalhadores dizem temer estarmos “perante um despedimento encapotado”. Paulo Neves, o presidente da PT, tem negado que a PT vá avançar com despedimentos. “Não vamos despedir pessoas. Estamos num processo de agilização.”

Desde que a Altice entrou na PT já saíram da empresa mais de 1300 trabalhadores. E há cerca de 400 pessoas que estão sem funções atribuídas, algumas há mais de meio ano, e a quem os recursos humanos vão propondo regularmente a rescisão de contrato.

Anabela Campos | Expresso | Foto: Nuno Botelho

Texto publicado na edição do Expresso Diário de 20/07/2017

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