Após
38 anos como chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos vai ter direito,
quando deixar o cargo, a imunidade, residência oficial e uma subvenção mensal
vitalícia de 80% do salário base do Presidente da República. Coisa pouca num
país que é dos mais corruptos do mundo, que lidera o ranking mundial da
mortalidade infantil e que (só) tem 20 milhões de pobres.
Com
as eleições gerais em Angola agendadas para o próximo dia 23, às quais José
Eduardo dos Santos – que completa 75 anos cinco dias depois -, não se
recandidata e nas quais foi substituído por uma marioneta por si escolhida
(João Lourenço), a lei aprovada pela Assembleia Nacional, sobre o “Estatuto dos
Antigos Presidentes da República de Angola”, foi publicada em Diário da
República a 17 de Agosto.
No
seu preâmbulo, a lei refere a necessidade de definir “os deveres e os direitos
dos antigos Presidentes da República”, sendo certo que desde 1975 o país
conheceu apenas dois chefes de Estado. O primeiro Presidente de Angola foi
Agostinho Neto, cargo ocupado, após a sua morte, por José Eduardo dos Santos,
em 1979.
A
lei agora em vigor define que os antigos Presidentes da República gozam de
tratamento protocolar “compatível com a dignidade das altas funções
anteriormente desempenhadas” (certamente tendo no seu espírito o desempenho
emérito no comando da corrupção) e que têm direito, nomeadamente, a gabinete de
trabalho, oficial às ordens, escolta pessoal, protecção e segurança especial na
residência, entre outros benefícios extensíveis ao cônjuge e aos descendentes e
ascendentes de primeiro grau, como o passaporte diplomático.
A
subvenção mensal vitalícia a que terá direito José Eduardo dos Santos, enquanto
antigo Presidente, após as eleições do dia 23 e tomada de posse do novo chefe
de Estado, corresponde a 80% do salário base do Presidente da República, que
está fixado desde Junho último em 640.129,84 kwanzas (3.300 euros).
Esta
subvenção, refere ainda a legislação, é acumulável com a pensão de aposentação
ou de reforma e em caso de morte do beneficiário transmite-se em 75% ao
cônjuge, descendentes ou ascendentes.
“O
cônjuge do antigo Presidente da República, à data do exercício das suas
funções, tem direito a uma subvenção mensal vitalícia equivalente a 60% do
salário base de um ministro”, lê-se ainda na lei, que entrou em vigor na
quinta-feira.
Define
igualmente que os antigos Presidentes “têm direito a uma residência oficial”,
que pode ser do Estado ou arrendada, e ainda a uma viatura protocolar “de
modelo idêntico à viatura oficial atribuída ao vice-Presidente da República [em
funções]”.
“O
Estado garante motoristas, combustível, manutenção e seguro contra todos os
riscos”, acrescenta o texto da lei, que refere ainda que os antigos Presidentes
“têm também direito a viaturas, de uso pessoal, para apoio do cônjuge e filhos
melhores ou incapazes a seu cargo”.
José
Eduardo dos Santos terá igualmente direito, conforme decorre da lei, a uma
viagem anual de férias, “com passagens aéreas em primeira classe e ajudas de
custo para si, cônjuge e filhos melhores ou incapazes, dentro do país ou no
estrangeiro”.
A
imunidade atribuída aos antigos Presidentes da República é semelhante à
conferida aos deputados à Assembleia Nacional.
A
lei, que se aplica também aos antigos vice-presidentes, prevê que estes possam
“renunciar aos direitos patrimoniais” previstos.
Quase,
quase emérito
Como
o Folha 8 escreveu em devido tempo, colocar um ex-presidente a ter direito a
salário, património móvel e imóvel, guardas, alimentação, saúde, bilhetes de
1.ª classe, incluindo mulher e filhos menores e outras regalias de Estado, não
constitui um furto, mas um roubo qualificado, dada não só a premeditação da
quadrilha política bajuladora, como os efeitos ilícitos da acção dolosa do
agente e seus descendentes.
Se,
na realidade o presidente Eduardo dos Santos precisa de tão abjecta lei, o
cidadão comum, facilmente, entende a natureza perversa daqueles que o suportam
hoje, pois serão os mesmos que mandarão os algozes baixarem a guilhotina. Isso
porque, quando a bajulação supera o círculo do bajulado, este fica sem rotas
alternativas no futuro, uma vez ter desprezado, não só a oposição, como a
sociedade civil, não bajuladora, para além de calcinar, ao longo do seu
consulado, anti-corpos na sua estrutura.
Esta
lei do “presidente semi-emérito” é cobarde e demonstra a natureza criminosa de
todos quantos a suportam, por atentar contra o prestígio que deve ter a
instituição Presidência da República, infelizmente, banalizada desde 1975, por
dois titulares do mesmo partido: i MPLA.
Um
(suposto) emérito é alguém que se mantém, politicamente activo, refugiado na
sombra de um sistema mafioso que opera no submundo da política, com poder de
manietar, intervir e condicionar o mandato de quem esteja no activo, sempre que
achar estarem os seus ilegais direitos em cheque. Daí esta lei ser um atentado
ao livre pensamento da maioria dos angolanos.
A
maioria do MPLA mostra, mais uma vez, não se importar de estar dominada por um
grupelho de intelectuais pobres, com neurónios enferrujados, higienicamente
incapazes de soluções democráticas abrangentes e abstractas, mas detentores de
um forte poder bélico intimidatório.
Ele
tem mesmo de ser emérito…
Ochefe
de Estado angolano, por sinal também Presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo
e, o que não é despiciendo, pai de Isabel dos Santos, passará a ser designado
no meio da corja de acólitos (enquanto não passar de bestial a besta) como
“Presidente da República Emérito”.
Para
além da campanha, infelizmente ainda sem resultados visíveis, de angariação de
apoios a favor da designação de José Eduardo dos Santos como a figura mundial
do século, o Folha 8 entende que a luta continua.
Assim,
deveria ser chamado de “Majestade Reverendíssima, Divina e Presidente da
República Emérito e Único”. Quanto à Pensão Vitalícia, o seu valor deveria
corresponder a 1000% do vencimento, acrescido de ajudas de custa sem limite,
bem como de um bónus por cada um dos 38 anos que fez o favor de ser Presidente
de todos nós, incluindo dos 20 milhões de pobres.
Se,
eventualmente, os deputados que saírem das eleições de 23 de Agosto não
acolherem, como é seu dever, as propostas de alteração sugeridas pelo Folha 8,
estamos a recolher assinaturas (já temos quase 20 milhões – as dos pobres) para
fazer uma petição mundial para que se reconheça o papel divino e eterno de sua
majestade, havendo inclusive um capítulo relativo à obrigatoriedade de este ano
ser atribuído a José Eduardo dos Santos um Prémio Nobel, seja ele qual for.
Recorde-se
que o segundo capítulo da proposta de lei, denominado “Foro Especial”,
estabelece que, findo o mandato, o antigo Presidente da República passa a gozar
de “foro próprio para efeitos criminais ou responsabilidade civil, por actos
estranhos ao exercício das suas funções, perante o Tribunal Supremo, no termo
do disposto na lei”.
Folha 8 com Lusa
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