O próximo
dia 23 de agosto vai ditar um novo Presidente para Angola, depois 38 anos de
poder de José Eduardo dos Santos. Os desafios que o país enfrenta são elevados,
como o prova a recente descida do ‘rating’ da dívida pública anunciada pela
agência de notação financeira Fitch.
Plataforma Macau, 19.08.2017
A
queda do preço do petróleo, a ausência de diversificação, o poder excessivo dos
militares 15 anos após o fim da guerra civil e a falta de peso da classe média
e da sociedade civil na gestão do país são os fatores que os analistas apontam
como os mais perigosos para a estabilidade de Angola. Mas acima de tudo, a
permanência de José Eduardo dos Santos à frente do Movimento para a Libertação
Popular de Angola (MPLA) e o peso dos seus familiares em empresas decisivas
para a economia angolana serão fatores que o novo Presidente angolano terá de
enfrentar logo e início.
Alguns
especialistas avaliam que o próximo Presidente angolano, que emergirá das
eleições gerais de 23 de agosto, poderá enfrentar dificuldades em governar
devido ao poder de José Eduardo dos Santos, que permanecerá como líder do MPLA
até 2018. “José Eduardo dos Santos quer afastar-se da Presidência, mas quer
manter algum poder sobre a máquina do Estado e sobre o motor económico e político
do país”, diz João Paulo Batalha, presidente da associação Transparência e
Integridade.
A
campanha eleitoral do MPLA é liderada por João Lourenço, cabeça-de-lista e que
concorre à eleição por via indireta para Presidente da República, sendo o sucessor
indicado por José Eduardo dos Santos. “Haverá uma mudança histórica com a saída
de José Eduardo dos Santos da Presidência, mas este foi um processo de sucessão
gerido pelo próprio Presidente, com vontade que parece óbvia de manter algum
poder nas sombras através da presidência do partido, que obviamente
condicionará muito o papel do Estado” e do futuro Presidente, diz o responsável
da Transparência e Integridade.
“Numa
primeira fase, vai haver uma continuidade do poder e, depois, um distanciamento
que vai correr após 2018 com a retirada de José Eduardo dos Santos de
presidente do partido MPLA”, diz Fernando Jorge Cardoso, especialista em
estudos africanos.
“O
novo Presidente da República, que muito provavelmente será o candidato do MPLA,
vai ter pela sua frente, nos primeiros tempos da sua governação, uma situação
em que não vai poder mexer muito na estrutura que lhe é deixada, porque que tem
um contrapoder exatamente ao lado, um contrapoder real”, diz Fernando Jorge
Cardoso.
Segundo
Cardoso, “as condições objetivas do país não vão dar margem de manobra ao novo
poder presidencial para poder ganhar um ‘élan’ [impulso] suficiente para
resolver as questões graves que o país enfrenta e que não são possíveis de
resolver enquanto a principal e quase única fonte de rendimento do Orçamento de
Estado vier das receitas do petróleo”.
“É
um pouco difícil ter uma perspetiva do que vai acontecer diante de uma situação
que nunca ocorreu, já que é a primeira vez que Angola vai a eleições e o
Presidente, que esteve muitos anos no poder, não irá concorrer novamente ao
cargo”, considera Eugénio Costa Almeida, investigador do Centro de Estudos Internacionais
do Instituto Universitário de Lisboa (CEI-IUL).
Fernando
Jorge Cardoso diz ainda que João Lourenço “é uma pessoa que vem de dentro do
aparelho partidário (…), que é casado com uma ex-ministra das áreas económicas
que atuou vários anos e que tem de facto um poder junto às elites da
administração pública que é importante, tem também tem um peso político forte”.
“Tem
de ser feita uma grande reforma de natureza fiscal e, de facto, tem de haver
uma diversificação na economia, com um aumento de investimentos ao nível
agrícola”, considera Jorge Cardoso. Para o investigador, “isto [da
diversificação da economia] é fácil de dizer e tem sido dito, mas tem de haver
quem invista e depois tem de haver quem consuma estas produções a preços
competitivos em relação a produções de outros países”.
“O
que a diversificação da economia exige são condições muito maiores de
pluralismo, de liberdade democrática, de liberdade de investimento, de um
sistema de justiça verdadeiramente independente e que funcione eficazmente na
resolução de conflitos”, refere João Paulo Batalha.
Seis
formações políticas estão a concorrer nestas eleições de 23 de agosto: MPLA,
UNITA, CASA-CE, PRS, FNLA e APN – contando com 9,317,294 eleitores em condições
de votar.
Nuno
Vinha e Cristina Silva Rosa | Exclusivo Lusa / Plataforma Macau|19 agosto 2017
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