quarta-feira, 7 de novembro de 2018

A estratégia de Trump contra a Rússia e a China

Os Generais James Mattis (Secretário da Defesa) e Joseph Dunford (Chefe do Comissão de Chefes do Estado-maior)

Alfredo Jalife-Rahme*

A guerra na Síria mostrou que as Forças Armadas dos EUA perderam a sua superioridade em matéria convencional em favor da Rússia. O desenvolvimento por Moscovo de uma nova geração de vectores nucleares hipersónicos atestaria igualmente a ultrapassagem aos Estados Unidos em matéria nuclear. Procurando recuperar o seu atraso, o Pentágono pretende aproveitar-se —enquanto ainda é tempo— da sua superioridade quantitativa nuclear para impor as suas escolhas à Rússia e à China.

Si vis pacem, para bellumn [1]

A revista Foreign Affairs, do influente Council on Foreign Relations, acaba de expor cruamente o debate em curso sobre uma guerra nuclear que os EUA poderiam desencadear contra a Rússia e a China [2].

Antes de mais, surge um artigo de Elbridge Colby –um dos principais autores da Estratégia de Defesa Nacional do Pentágono [3], que proclama o fim da guerra efectiva contra o terrorismo e o retorno da concorrência entre as grandes potências– tendo como palavra de ordem estratégica : «se queres a paz, prepara-te para a guerra nuclear» [4].

Colby, o Secretário-adjunto encarregue da estratégia e do desenvolvimento da força, adverte : qualquer confronto com a Rússia e com a China poderia tornar-se nuclear se, no decurso de um combate mais duro, e tornando-se mais incerto, cada um dos combatentes seja tentado a sacar da sua espada nuclear para testar a determinação da parte adversa, para enfrentar o desafio, ou simplesmente para poder continuar o combate.

Segundo Colby, o melhor meio para evitar uma guerra nuclear é estar preparado para travar uma de carácter limitado (sic); e os EUA estão dispostos a realizar operações nucleares eficazes (sic), bem como limitadas.

André Damon, do sítio trotskista WSWS [5] retoma a análise sobre a ameaça de Trump em retirar os EUA do Tratado INF, sobre as Forças Nucleares Intermédias [6], que interdita aos EUA e à Rússia desenvolver misseis com alcance entre os 500 e 5. 500 km.

Damon considera que a ameaça de Trump põe em risco as vidas de milhões de pessoas na Europa e na Ásia Oriental, ao planear (planejar-br) um fogo cruzado contra Pequim e contra Moscovo. E, os EUA já não escondem o desejo de utilizar armas nucleares nos seus combates, onde não mais haveria nenhum limite, com o objectivo de vencer os «adversários».

Damon acrescenta que estes planos se realizam, em segredo, com a cumplicidade do New York Times e do Partido Democrata, o qual permaneceu quase em silêncio quanto às consequências e ao perigo de uma guerra mundial.

George Shultz, o poderoso Secretário de Estado sob a presidência republicana de Ronald Reagan, defende o INF: «nós devemos preservar este tratado nuclear», afirma [7].

Shultz salienta que as armas nucleares são uma ameaça para o mundo, e faz a justificada apologia da assinatura do Tratado, em 1987, por Ronald Reagan, o Presidente republicano de então, e pelo dirigente da ex-URSS Mikhaïl Gorbatchov [8].

Ele critica as ameaças de Trump de sair do INF, sob o pretexto de violações da parte da Rússia, e aproveita a ocasião para convidar outros países a juntarem-se aos signatários do Tratado, e a resistir à tentação dos EUA de desenvolver novos tipos de armas letais; ele propõe para isso, como etapa preliminar, uma reunião de especialistas dos EUA e da Rússia afim de debater eventuais violações.

À época, o Tratado havia suscitado um enorme cepticismo, mas George Schultz argumenta que era possível realizar «inspeções amplas in situ para verificar se todos os mísseis interditos haviam sido realmente eliminados». E já em 1992 cerca de 2. 700 mísseis tinham sido destruídos [9].

Shultz cita, a este propósito, uma frase chave do czar Vlady Putin proferida há um ano: «se me perguntam se o desarmamento nuclear é possível ou não, eu direi que sim, é possível. Deseja ou não a Rússia o desarmamento nuclear universal? A resposta é sim, ainda outra vez, se a Rússia o deseja, ela vai trabalhar para isso».

Shultz lembra que na Revisão da Posição Nuclear dos EUA [10], publicada em fevereiro passado, uma das citações era : «os EUA continuam comprometidos nos seus esforços para apoiar a eliminação global, em última instância, das armas nucleares, biológicas e químicas».

Os EUA reduziram as suas reservas nucleares num nível de 85%, desde o auge da Guerra Fria, e não instalaram novas capacidades nucleares durante mais de duas décadas» [11]. O antigo Secretário de Estado de Ronald Reagan conclui que este não é o momento de construir grandes arsenais de armas nucleares. É tempo de eliminar esta ameaça do mundo inteiro.

O pior seria acreditar que a Rússia e a China ficarão de braços cruzados.

Alfredo Jalife-Rahme* | Voltaire.net.org | Tradução Alva | Fonte La Jornada (México)

* Professor de Ciências Políticas e Sociais da Universidade Nacional Autónoma do México (UNAM). Escreve artigos sobre política internacional no jornal La Jornada. Último livro publicado: China irrumpe en Latinoamérica: ¿dragón o panda? (Orfila, 2012).

Notas:
[1] «Se queres a paz, prepara a guerra»
[4] “If You Want Peace, Prepare for Nuclear War. A Strategy for the New Great-Power Rivalry”, Elbridge Colby, Foreign Affairs, November/December 2018.
[5] “US missile treaty withdrawal: “Prepare for nuclear war””, Andre Damon, WSWS, October 24, 2018.
[7] “We Must Preserve This Nuclear Treaty”, George P. Shultz, The New York Times, October 25, 2018.
[8] “A Casa Branca prepara o regresso dos euro mísseis”, Manlio Dinucci, Tradução Maria Luísa de Vasconcellos, Il Manifesto (Itália) , Rede Voltaire, 28 de Outubro de 2018.
[9] “Factsheet INF Treaty: At a Glance”, Bureau of Arms Control, Verification and Compliance, US Department of State, December 8, 2017.
[10] «"Revisión de la postura nuclear" del Pentágono: EU contra Rusia y China», Alfredo Jalife-Rahme, La Jornada, 18 de Febrero de 2018.
[11Nuclear Posture Review 2018. US Defense department, January 2018.

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