Martinho Júnior, Luanda
1- As âncoras de África no que
toca à questão essencial do seu subdesenvolvimento, resultam dum conjunto muito
alargado de factores de ordem antropológica, histórica e contemporâneos, estes
resultantes do capitalismo neoliberal globalizante e de tendência hegemónica
unipolar, fundamentalmente desde o início da década de 90 do século passado,
com toda a perniciosa cadeia de correntes de acção que disseminou (a começar
no “soft power” dos seus procedimentos culturais indexados ao fluxo
das novas tecnologias instrumentalizadas pela aristocracia financeira mundial).
Desse modo há um conjunto muito
alargado de factores socioculturais forjados no e desde o passado, uns de há
milénios, outros ao longo dos cinco últimos séculos, que são reaproveitados
pelos “livres” impactos do capitalismo neoliberal contemporâneo por
via de suas acções de choque e terapia, que no terreno mole das democracias
representativas de contingência, em África tão fragilizadas, tão subvertidas e
por vezes tão malparadas, estão abertas à “sublimação” de ideologias
radicais fundamentalistas, ou mesmo de nacionalismos tão arcaicos que derivam
em estreitos procedimentos de corrupção, ou mesmo em fascismos, que se adequam
às insipiências dos próprios estados a ponto de ser possível que em república
possam vingar sucessões familiares em especial onde os suportes neocoloniais ou
de assimilação foram historicamente mais fortalecidos.
As motivações de guerra
psicológica de baixa intensidade e ao sabor dos interesses extracontinentais,
derivam de tudo isso e África não indicia capacidades independentes e soberanas
de contramedidas, até por que os projectos estratégicos infraestruturais,
articulando mas integrando, estão por conta de outros, de fora do continente!
2- A dialética entre as culturas
nómadas e de criação de gado em regime de transumância, redundantes dos maiores
e mais quentes desertos do globo (Sahara e Sahel) e as culturas sedentárias
redundantes das regiões tropicais ricas em água (sobretudo na bacia do Congo e
Grandes Lagos), onde proliferam as disputas pelo espaço vital, é uma dialética
de fluência milenar desde a civilização egípcia forjada entre o deserto e o
vale do Nilo.
Os movimentos migratórios
africanos (a partir do Sahara e Sahel em direcção ao Mediterrâneo e em direcção
à África Austral), assim como a acção de rebeldes ou de terroristas, resultam
ainda hoje dessa dialética tão sensivelmente contraditória, porque os modos de
produção não absorveram de forma ampla a complexidade dos processos da
revolução industrial, ficando-se nas imensas áreas desérticas ou rurais (que
neste caso ainda são bastante populosas), por atavismo e arrasto, em processos
característicos de nomadização, de economias de subsistência, ou mesmo de
expedientes de recolecção, incapazes de poder corresponder e fazer face por si
às tão apelativas e impactantes culturas modernas extracontinentais.
O colonialismo agravou assim o
estágio económico subdesenvolvido dessa dialética antropológica, o que explica
por que as economias coloniais subsistiram tanto tempo em função das
fragilizadas culturas, que a partir da Conferência de Berlim foram sujeitas a
poderes dominantes extracontinentais, que deram continuidade ao despotismo e
dividiram o continente sem respeito algum pelos africanos, apenas “para
melhor reinar”, dispor de mão-de-obra escrava ou barata e ter acesso às
matérias-primas, ainda que competindo entre si, ou por intermédio de terceiros
(mercenários e rebeldes de ocasião).
Esta dialética antropológica tem
neste momento condições físico-geográfico-ambientais e humanas para se
radicalizar, pois além do mais, há diminuição de caudais freáticos nas regiões
equatoriais e tropicais húmidas, afectação danosa de muitas nascentes e cursos
dos rios, a redução drástica de florestas e de biodiversidade (há espécies em
vias de desaparecer) e a população humana está a aumentar exponencialmente
apesar das guerras e das epidemias!
3- O capitalismo neoliberal que
começou a gerar impactos em África aproveitando o fim do “apartheid” na
África Austral (o fim da acção dos movimentos de libertação que levaram a cabo
a luta armada), tirando partido desse estado de torpor e de inércia onde as
conquistas da revolução industrial praticamente nunca existiram (à excepção da
África do Sul), moldaram por via do choque a que se seguiu a terapia, a
mentalidade dominante do quadro das democracias representativas que
simultaneamente foram geradas por seu engenho e arte dominantes, substituindo
os modelos coloniais pelos novos modelos neocoloniais de domínio, assimilação e
formação das elites em disputa do poder.
O “soft power” das
potências e suas poderosas transnacionais globalizantes, obedeceu desde logo a
modelos e parâmetros obrigatórios de natureza sociopolítica, que tiveram
oportunidade de deitar mão e sobre a plataforma antropológica adveniente do
passado, foram-se estabelecendo, de forma quantas vezes caótica, consumismos
modernos e até franjas intensivas de novas tecnologias, particularmente no
âmbito das comunicações.
Desse modo África, já de si
desarticulada pelos choques neoliberais, atraía aos fulcros onde os benefícios
da revolução industrial e das novas tecnologias se faziam (e fazem) melhor
sentir, ou unicamente sentir, a desamparada mole errática redundante das
culturas humanas em contradição milenar, pelo que as migrações em busca da
legítima miragem de melhores condições de vida, aumentaram inexoravelmente de
intensidade, engrossando a população urbana, mas subsistindo em subculturas por
vezes em condições de extrema insalubridade e em manchas enormes de pobreza, vulnerabilidade,
marginalidade e criminalidade!
A China, que determinou uma
parceria estratégica com África, tem-se empenhado de há 29 anos a esta parte,
na criação de infraestruturas e estruturas numa perspectiva de “ganha-ganha” e
procurando estimular concepções na base de várias “belt and road”, tudo
isso com um alinhamento progressivo dos atordoados (para não dizer
anestesiados) africanos, remetidos ao silêncio acabrunhado perante a poderosa
mas aliciante aproximação!…
Lembre-se que quem cala,
consente!
Ao criar em Djibouti uma base
militar, a China indicia a tentativa de a partir daí e do seu empenho na
Etiópia, estabelecer por terra a conexão ao Senegal, ao longo dum paralelo que
ligará o Índico ao Atlântico por toda a transversal (paralelo) do Sahel; nesse
sentido a tradicional visita ao continente do seu Ministro dos Negócios
Estrangeiros, nos primeiros dias deste ano premiou a Etiópia, o Burkina Faso, a
Gâmbia e o Senegal.
A China responde desse modo à
proliferação de bases militares estado-unidenses e da “FrançAfrique” espalhadas
por todo o Sahel, com uma proposta de intervenção infraestrutural estratégica,
do Senegal ao Djibouti (Somália).
Não é pois de estranhar o convite
chinês feito aos Estados Unidos para uma parceria estratégica dirigida ao
continente africano!
4- A leitura dominante adstrita à
inteligência das potências da “civilização judaico-cristã ocidental” em
relação a África, foi-se duma forma ou de outra apercebendo do conjunto dos
fenómenos e não lhes foi difícil, (até por que tinham à sua disposição
instrumentos e “know how” nunca negligenciados por si), desencadear
as acções a partir do momento da queda do “apartheid”.
Na própria África do Sul, tudo
foi feito para que o pensamento e a acção elitista permanecesse intocável na
sua essência e natureza, ainda que se passassem a aproveitar outras direcções
do empenho, por exemplo ocupando o vazio das questões ambientais geoestratégicas
e às múltiplas derivadas daí advenientes (por exemplo os Parques Nacionais
Transfronteiriços de Paz, o turismo ambiental para os ricos extracontinentais,
as “lodges”… tudo tanto quanto o possível associado à exploração dos
diamantes, conforme ao modelo do Botswana)!
Angola está atraída pelos
conceitos elitistas “de nova geração” desencadeados pelo cartel dos
diamantes e “lobby” dos minerais e, ao invés de começar a controlar e
a delinear geoestratégias em função da região central das grandes nascentes
prioritariamente protegendo e conhecendo cientificamente as fontes dos seus
rios, está preocupada com os projectos do Kawango and Zambezi Trans Frontier
Conservation Area e as iniciativas de turismo que lhes estão adstritas, sabendo
que o próximo passo da exploração quimberlítica de diamantes por parte do
cartel, será no Cuando Cubango!
Na África do Sul, no ambiente
sociopolítico e económico foi aberto espaço ao “black empowerment”, que
desde logo com Nelson Mandela (recorde-se a “Mandela Rhodes Foundation”)
não punha em causa o elitismo, antes o estimulava noutros moldes em consonância
com o mesmo “lobby” dos minerais que sustentou Cecil John Rhodes e
sustenta agora as iniciativas-mestras na África Austral e África adentro a
partir do sul.
Por outro lado e com base na
cidade do Cabo (onde Cecil John Rhodes assentou arraiais), distende-se o
processo investigativo sul-africanos sobre o Índico Sul, o Atlântico Sul e a
Antárctida, onde a África do Sul possui uma estação há mais de 50 anos e é o
único país africano ali presente!
Os vínculos têm sido de tal modo
poderosos que no âmbito das emergências multilaterais a África do Sul foi
integrada nos BRICS e o velho plano de Cecil John Rhodes, “do Cabo ao
Cairo”, na trilha da British South Africa Comany, afigura-se na melhor das vias
para um “belt and road” contemporâneo em África, algo que esta China
não está também a negligenciar.
Essa terá sido uma das razões
estratégicas do seu empenho na construção do TanZam, a ferrovia que liga
o “copperbelt”transfronteiriço da RDC e Zâmbia, ao porto de Dar es Salam,
capital da Tanzânia, no Índico, por contraposição ao Caminho de Ferro de
Benguela que escoa o cobre na direcção do Atlântico.
Nesse sentido foi já feito um
ensaio de “belt and road” ferroviário no paralelo que liga o Lobito a
Dar es Salam, na parte norte do espaço da SADC…
5- Continente adentro e depois do
grosso da descolonização (o Sahara subsiste como colónia de Marrocos), o choque
neoliberal estimulado pelos Estados Unidos e transnacionais de origem
estado-unidense (anglo-saxónicas), foi sangrento e traumático desde logo nos
Grandes Lagos e bacia do Congo, no nó principal da água e bem no miolo do
continente, alastrando no que foi considerada a Iª Guerra Mundial Africana,
reflectindo os interesses do “lobby” dos minerais e seus
homens-de-mão.
Os interesses extracontinentais
tinham necessidade premente dos minerais preciosos do Congo, particularmente os
metais raros que são essenciais para as novas tecnologias de última geração e
essa riqueza situava-se precisamente nos Kivus, entre a bacia do Congo e os
Grandes Lagos…
Tudo começou em moldes de choque
neoliberal indexado aos democratas estado-unidenses no início de 1990, mas
entre Abril e Julho de 1994, no Ruanda, um genocídio sem precedentes
desencadeou-se e foi repercutindo além-fronteiras sob o meio cúmplice olhar de
Bill Clinton, ele próprio antigo governador do único estado onde há diamantes,
o Arkansas, ele próprio um “emérito rhodes schollarship”, ele próprio um
expoente do capitalismo neoliberal assíduo do Ruanda, da África do Sul e do Botswana
(afim às correntes ideológicas elitistas desse tipo de contextos), ele próprio
amigo pessoal do Presidente do Rwanda Patriotic Front, Paul Kagame, formado nas
academias militares dos Estados Unidos!
Não é de admirar que neste
momento Paul Kagame esteja à frente da União Africana!...
Na substituição do poder em
Kigali, aqueles que eram apoiados pela inteligência e “expedicionários” franceses
e belgas num processo de extrema radicalização e fundamentalismo étnico e
religiosos, foram derrotados, indiciados por muitos dos seus crimes e
perseguidos, bacia do Congo adentro (espalharam-se sobretudo pelos Kivus onde o
grosso se instalou precariamente e constituiu crónicos grupos rebeldes).
Nem a “Opération Turquoise” decidida
pela “FrançAfrique” valeu ao derrubado “poder hutu” (até o
minúsculo Ruanda, país das mil colinas, foi dividido pelo colonialismo entre
tutsis e hútus… para assim melhor reinar e ainda melhor traumatizar).
Desde então, derrubando-se Mobutu
já com um regime antidemocrático, obsoleto e em estertor, multiplicaram-se as
tensões, os conflitos e as guerras, incluindo em Angola, onde Savimbi,
aproveitando-se dos êxitos alcançados no campo político-diplomático de Bicesse
em 31 de Maio de 1991, protagonizou no terreno a iniciativa do choque
neoliberal entre 1992 e 2002.
Os seus suportes portugueses, em especial Mário Soares
e franjas do PSD e CDS, têm tudo a ver com isso, no âmbito dum “arco de
governação” inspirado num 25 de Novembro (de 1975), que repescou muitas
das capacidades ideológicas e de inteligência inerentes ao spinolismo e ao
Exercício ALCORA (o acordo secreto entre o colonialismo português e o“apartheid”,
estabelecido “em defesa da civilização ocidental e contra a progressão do
comunismo” de acordo com os cânones de influência cristã-democrata
do “Le Cercle” animado pelas “redes stay behind” da CIA e
da NATO).
6- Como se tudo não bastasse para
África, na sequência do 11 de Setembro de 2001 e após o derrube das Torres
Gémeas de Nova-York, os Estados Unidos desencadearam acções de ingerência e
manipulação, tirando partido de seus aliados arábicos, que alastraram as acções
que com os europeus protagonizaram nos Balcãs acabando com a Jugoslávia!
Chegara a vez dos republicanos
ficarem ao serviço do capitalismo financeiro transnacional, sustentados
pelos “lobbies”do petróleo e do armamento, algo que aumentou a onda de
choque e de trauma imediatamente antes da tentativa de instalação dos processos
de terapia neoliberal de seu inteiro interesse e conveniência!
Em África, no princípio (enquanto
o Iraque e o Afeganistão eram atacados e alvos de todo o tipo de destruições) o
petróleo era promovido pelas ideologias “ocidentais” como uma tão
esperada quão bonançosa ilusão (foi assim por exemplo no Golfo da Guiné sob os
auspícios do Institute for Advanced Strategic and Political Studies no âmbito
do Africa Oil Policy Initiative Group), mas quando em 2011 o AFRICOM (que havia
sido criado em 2007) e a NATO atacaram e destruíram a Líbia de Kadhafi para
implantar o caos e o terrorismo do Senegal à Somália e do Mediterrâneo ao Lago
Chade e bacia do Congo (República Centro Africana), o petróleo passou também a
ser um pesadelo ao nível dum “excremento do diabo”, similar ao criado
pelo “lobby” dos minerais que lhe precedeu!
Democratas e republicanos
convergiram com Bill Clinton, com George Bush e com Barack Hussein Obama (de
pai queniano) nos seus “bons ofícios” a favor do capitalismo
financeiro transnacional dirigido também a África, em função do neoliberalismo
que havia passado a nortear os interesses da aristocracia financeira mundial
desde a administração de Ronald Reagan, que findou no início de Janeiro de
1989, imediatamente antes das conjunturas da Guerra Fria terem o seu fim, dando
abertura aos relacionamentos internacionais neoliberais e de portas
escancaradas que animaram desde então o império da hegemonia unipolar!
O capitalismo financeiro
transnacional assumiu o controlo das tendências ao dispor da aristocracia
financeira mundial e ondas de caos, de terrorismo e desagregação foram
desencadeadas no Médio Oriente Alargado, com imediatas repercussões em África,
onde já não era novidade o choque neoliberal da Iª Guerra Mundial Africana.
A NATO, alargando a sua área de
intervenção das Caraíbas ao Afeganistão e intervindo em África a partir de suas
bases em países mediterrânicos (sobretudo a partir da Itália), foi um dos
instrumentos dessas tendências de hegemonia unipolar em função dos interesses
da aristocracia financeira mundial e suas transnacionais.
Os fundamentalistas
sunitas-wahabitas islâmicos produziram via Irmãos Muçulmanos um conjunto muito
alargado de processos “transversais” de subversão e desestabilização,
a que não ficaram indiferentes os Estados Unidos e os seus tradicionais aliados
europeus da NATO em jeito de vassalos, sobretudo ao nível das antigas potências
coloniais Grã-Bretanha, França e Itália.
Enquanto eram accionadas as “redes
stay behind” na Europa num processo que se estendeu por todos os países
que antes foram componentes do Pacto de Varsóvia que entretanto se extinguiu em
31 de Março de 1991, processos similares foram desencadeados na Europa, América
Latina, África e Médio Oriente Alargado, recorrendo ao petrodólar, assim como
aos financiamentos e mobilizações humanas das monarquias arábicas, fruto da
aliança conhecida como Tratado de Quincy, firmado a 14 de Fevereiro de 1945 no
Suez.
Acabar com Kadafi e implantar de
forma expansiva o islão radical em África, foi um dos objectivos das monarquias
arábicas ultraconservadoras, íntimas aliadas dos Estados Unidos e dos seus
aliados-vassalos da NATO.
Sucessivas “Revoluções
Coloridas” e “Primaveras Árabes” foram então desencadeadas,
afectando também o norte de África (Tunísia, Líbia e Egipto, menos na Argélia
onde o terrorismo foi severamente combatido e reprimido logo à nascença).
Na Líbia o caos, o terrorismo e a
desagregação foram instalados até hoje, içada a bandeira do fantoche rei Ídris
e a mancha alastrou à velocidade dum rastilho pelo Sahara e pelo Sahel,
atravessando os desertos quentes do norte de África e chegando ao Sudão e às
ricas regiões tropicais onde é tão duramente disputado o espaço vital!
7- Os poderosos da hegemonia
unipolar sabiam que em África haveria uma expansão em jeito de “efeito
dominó”quando Kadafi desaparecesse (dadas as características de sua acção
contra as monarquias arábicas, as linhas dos seus programas vocacionados para
os africanos e os interesses que aglutinava que com o seu fim deixariam um
vazio em aberto, pronto a ser ocupado por outros e por outras correntes).
Os aliados “ocidentais” das
monarquias arábicas sunitas-wahabitas, tacitamente moveram NATO, AFRICOM e suas
forças armadas e de inteligência para arremedarem o reforço dos líderes dos
países africanos afectados (muitos deles irremediáveis agentes seus à
semelhança das produções “stay behind”), do Mali à Somália e do
Mediterrâneo ao Lago Chade e República Centro Africana.
O neocolonialismo nessas imensas
regiões de África, do Mediterrâneo ao Equador, tornou-se impetuoso e vibrante,
explorando seus contraditórios ingredientes e canais de acção operativa, com
a “FrançAfrique” (a França também presente no Médio Oriente Alargado
e no ataque à Líbia) a ganhar novo fulgor, num também alargado “pré carré”!
Nesse neocolonialismo que se
abate agora sobre África com todos os arsenais de guerra psicológica,
ingerência e manipulação, conhecedores das contradições antropológicas que
grassam no continente e de toda a história de África, as potências da hegemonia
unipolar com os Estados Unidos na vanguarda, dividem entre si áreas de acção e
influência:
Na África Austral as linhas
elitistas anglo-saxónicas, ainda que a África do Sul se tisne de “arco
íris” e de BRICS;
Na costa oriental de África e
África Central, expedientes de indexação anglo-saxónica para fazer face aos
problemas fundamentalistas na Somália, no Quénia, na Etiópia, nos Grandes Lagos
e na Bacia do Congo;
Nas regiões mais ricas em água da
África Central, a predominância de líderes como Yoweri Museveni ou Paul Kagame,
com perfis que indiciam ser seus dedicados “homens-de-mão” cuja acção
se estende para dentro da República Democrática do Congo impondo suas regras e
conexões.
Na África do Oeste (desde o Congo
até ao Senegal) e na imensidão do Sahara e Sahel até ao Sudão e por fim
estendendo-se à Somália e Djibouti), a “FrançAfrique” domina num
alargado e tácito “pré carré”, ressuscitando e rejuvenescendo as redes
do “professor” Jacques Foccard, com uma amplidão de iniciativas de
toda a ordem sob a cobertura duma moeda que foi criada no tempo do Franco
Francês, o Franco CFA…
Os legionários da “FrançAfrique”,
as Forças Militares da França, ou suas Forças Especiais, vão desencadeando
missões atrás de missões, reforçando os agenciados estados propagandeados
como “irmãos africanos”, por si impotentes para fazer face ao caos, ao
terrorismo e à desagregação.
Forças do AFRICOM reforçam esses
dispositivos, como por exemplo na base de drones no Níger e as múltiplas acções
de treino e acompanhamento militar nas respostas às rebeliões islâmicas em
progressão em direcção ao sul.
Todo esse expediente tácito
invade o Sahel e o Sahara de forma coordenada e sincronizada, multiplicando as
operações militares, numa região onde a China quer chegar com sua estratégia
de “belt and road”!
Ao cabo dos últimos dez anos
tentei vislumbrar capacidades próprias de renascimento africano a partir das
culturas autóctones, mas o crescimento que houve, estabelecido em função de
processos de assimilação sujeitos ao choque e à terapia neoliberal, nem a
dialética antropológica milenar reconhece como seu, a fim de a partir dessa
base melhor equacionar e estabelecer pontos de partida para fazer face aos
prementes desafios que se apresentam.
Mesmo os projectos
infraestruturais estratégicos da China resultam de iniciativas
extracontinentais.
As fontes dos poderosos rios
africanos estão em risco, estão em risco os cursos desses rios, muitos deles
esventrados e delapidados por exploradores e aventureiros ávidos de suas
riquezas, assim como estão em risco os aquíferos subterrâneos, tudo isso enquanto
os desertos quentes se expandem, diminui a biodiversidade, desaparecem cada vez
mais espécies, impactam alterações climáticas e aumenta a população disputando
em convulsão o espaço vital!
África continua a ser um dilecto
alvo neocolonial e nestes últimos dez anos, não só não acordou em relação à
derrapagem em que se encontra, como está cada vez mais alienada em relação aos
fundamentos da vida, da existência do homem e do respeito devido à Mãe Terra!
O neocolonialismo é, em função
dos processos de domínio, contra a civilização da lógica com sentido de vida em
África e esse domínio persuasivo ou drástico das potências e suas
transnacionais impõe quase sempre, ainda que com dispersas excepções, a
barbárie própria dos caminhos da divisão sem consenso, do colapso, da perdição,
do abismo e da morte!
A cólera, segundo um caso recente
com notícia a correr mundo, até já chegou à esterilizada Suécia!
Martinho Júnior - Luanda, 4 de Janeiro de 2019,
(aniversário da revolta da Baixa do Cassanje em Angola)
Imagens:
Operações do AFRICOM ao longo do
Sahel;
Operações da “FrançAfrique” no seu “pré carré”;
Acção psicológica em Agadez, com
a entrega de carteiras a uma escola primária do Níger, junto à base de drones
dos Estados Unidos;
O “pioneiro” Jacques
Foccard e um dos seus agenciados, Mobutu, no início da construção do “pré
carré”;
O major Paul Kagame num dos
cursos que frequentou em
Fort Leavenworth que estimulou seus “bons ofícios” em
função dos interesses dos Estados Unidos em África.
Nota:
Não foram colocados links a fim
de possibilitar a publicação no Facebook, que tem sido avesso a intervenções
que integrem referências aos seus fundamentos.
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