terça-feira, 23 de abril de 2019

Portugal | Valeu a pena o inquérito às rendas elétricas?


Mariana Mortágua* | Jornal de Notícias | opinião

A Comissão de Inquérito às rendas excessivas pagas às empresas de eletricidade ouviu dezenas de pessoas, antigos responsáveis de governos, representantes de empresas e figuras como Luís Amado, que incarnam ambas as condições. Foi trabalho precioso porque pela primeira vez o Parlamento aprofundou uma matéria sempre considerada demasiado técnica para um escrutínio político rigoroso. Resultado: ficámos com uma das faturas mais elevadas da Europa, um país recordista de pobreza energética, que muita gente pobre tem pago com a vida no pino do verão e no pico do inverno.

O deputado Jorge Costa, do Bloco de Esquerda, foi eleito para preparar o relatório final da Comissão e o documento que entregou prova bem o acerto da criação desta Comissão de Inquérito, aprovada por unanimidade.

O relatório explica a origem destas rendas: ao garantir lucros por decreto e pagos pelos consumidores na fatura ao longo de anos, o Estado preparou a privatização da EDP. Os consumidores acabaram a pagar os lucros da companhia, bem maiores do que a receita do Estado no negócio.



Mas o relatório aponta ainda diversas decisões milionárias adicionais, que conferiram às elétricas novos privilégios económicos. Dos benefícios com a dívida tarifária às vantagens introduzidas na lei dos CMEC, da oferta a preço zero da central de Sines (inteiramente paga pelos consumidores) ao prolongamento do período de tarifas elevadas aos produtores eólicos.

Dentro de duas semanas, todos os partidos serão chamados a responder a uma pergunta simples: os favores feitos às elétricas e os abusos apurados pela Comissão de Inquérito devem ou não ser corrigidos em nome do interesse geral, em particular os das famílias e das pequenas e médias empresas?

A Comissão de Inquérito tem uma missão: em face de abusos detetados, recomendar aos legisladores - Governo e Parlamento - medidas a tomar. O fecho mais indigno para este longo trabalho seria, depois de chegar a conclusões sobre os problemas, não indicar soluções.

Depois de todo este trabalho, o Parlamento tem o conhecimento suficiente para agir. Será imperdoável se a sua única recomendação for, no final da Comissão, que os donos da EDP devem abrir de novo as garrafas de champanhe.

* Deputada do BE

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