Ex-líder descarta voltar à
presidência e será vice na chapa de Alberto Fernández, seu ex-chefe de
gabinete. Anúncio encerra meses de especulações sobre futuro político da
senadora, vista como ameaça à reeleição de Macri.
A senadora e ex-presidente da
Argentina Cristina Fernández de Kirchner anunciou neste sábado (18/05) que será
candidata a vice-presidente nas eleições deste ano, e não líder da chapa, como
era cotada. Seu ex-chefe de gabinete, Alberto Fernández, concorrerá à
presidência.
"Pedi a Alberto Fernández
que chefie a chapa que vamos integrar: ele como candidato a presidente e eu
como candidata a vice nas próximas eleições primárias abertas, simultâneas e
obrigatórias", disse ela em vídeo de 12 minutos publicado no Twitter.
"Estou convencida de que
esta chapa que propomos é a que melhor expressa o que neste momento a
Argentina necessita para convocar os mais amplos setores sociais e políticos e económicos também, não só para ganhar uma eleição, mas para governar."
Kirchner anunciou sua decisão,
que vem como um passo surpreendente, dizendo estar convencida de que "a
expectativa e a ambição pessoal têm de estar subordinadas ao interesse
geral".
O anúncio encerra meses de
especulações no âmbito político e na imprensa sobre o futuro político de
Kirchner e direciona o foco sobre Alberto Fernández – que também foi chefe de
gabinete de seu marido, o falecido ex-presidente Néstor Kirchner, entre 2003 e
2008.
Fernández e Cristina Kirchner
participarão juntos das chamadas primárias abertas, simultâneas e obrigatórias
(Paso), que acontecerão em 11 de agosto. Nesse momento, os cidadãos definirão
qual de todos os aspirantes a um mesmo cargo apresentados por cada partido será
o candidato a participar dos pleitos gerais de outubro.
O pré-candidato a presidente, que
passou anos distanciado de Cristina Kirchner, foi seu chefe de gabinete por
apenas poucos meses. Em julho de 2008, apresentou sua renúncia após a polémica rejeição no Senado de um projeto governista que buscava aplicar um novo sistema
tributário ao comércio da soja.
Nas últimas semanas, os dois
foram vistos novamente em harmonia. A senadora chegou a declarar que foi
Alberto Fernández quem a encorajou a escrever sua bem-sucedida
autobiografia, Sinceramente.
"Alberto, a quem conheço já
há mais de 20 anos e com quem tive também diferenças, foi chefe de gabinete de
Néstor durante toda sua presidência e o vi, junto a ele, decidir, organizar,
concordar e buscar a maior amplitude possível do governo", afirma Kirchner
no vídeo divulgado neste sábado, editado com imagens históricas.
A ex-presidente lembra ainda o
momento da posse de seu marido, em 2003, como "tempos muito difíceis"
na Argentina, com os efeitos da grave crise de 2001 ainda latentes.
"Mas estes [tempos] que
estamos vivendo, os argentinos e as argentinas, são realmente dramáticos. Nunca
tivemos tantos e tantas dormindo na rua, nunca tantos e tantas com problemas de
comida, de trabalho, nunca tantos e tantas desesperados chorando diante de uma
conta impagável."
"É fundamental, então,
evitar somar à frustração atual, produto da fraude eleitoral que facilitou a
chegada de Mauricio Macri ao poder, uma nova frustração que submergiria a
Argentina no pior dos infernos", completou Kirchner.
A ex-presidente era vista como
principal ameaça à reeleição do presidente Macri, cuja popularidade vem
despencando há meses nas pesquisas devido à crise económica. Sondagens recentes
chegaram a mostrar Kirchner à frente do atual líder nas projeções para as
eleições deste ano.
Na terça-feira passada, a
ex-presidente participou de uma reunião da comissão executiva do Partido
Justicialista, histórica legenda peronista. O evento gerou forte expectativa já
que ela, líder do setor kirchnerista do peronismo, não participava há anos de
um conclave do partido, fundado pelo ex-presidente Juan Domingo Perón em meados
da década de 1940.
A imagem de Cristina Kirchner, no
entanto, gera rejeição em parte do peronismo que ela integra, como, por
exemplo, entre o chefe do Bloco Justicialista no Senado, Miguel Ángel Pichetto;
o governador de Salta, Juan Manuel Urtubey; e o ex-chefe de gabinete Sergio
Massa – eles já anunciaram sua intenção de concorrer nas primárias pela
corrente Alternativa Federal.
O retorno de Kirchner,
esquerdista investigada em
uma série de casos de corrupção, à presidência da Argentina, cargo que
ocupou entre 2007 e 2015, era visto com receio também por parte dos argentinos,
bem como por líderes estrangeiros direitistas, como o presidente Jair
Bolsonaro.
Em discurso nos Estados Unidos
nesta semana, o
brasileiro mencionou a possível volta da ex-presidente ao poder
como uma ameaça, criticando-a como "amiga do PT do Brasil [...] e de
outros que tinham mais que o sonho de roubar nosso país".
Crise na Argentina
Mauricio Macri é um dos
principais críticos da política económica adotada por Cristina Kirchner,
especialmente pelo afastamento da diplomacia kirchnerista dos Estados Unidos,
pelas proibições de compra de moedas estrangeiras e pelo aumento do histórico
déficit fiscal.
Mas o presidente enfrenta há um
ano uma grave crise que reduziu praticamente a zero uma sequência de cinco
trimestres consecutivos de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) do país.
Toda essa incerteza tem impacto
direto na inflação, que em abril subiu 3,4% em relação a março e, na comparação
com abril de 2018, chegou a 55,8%. Nos quatro primeiros meses de 2019, a alta da inflação
chegou a 15,6%.
A desvalorização da moeda – com
ciclos abruptos de quedas, que o Executivo combate com altas taxas de juros e leilões
de dólares –, somada à forte seca que afetou o campo, levou o governo a
solicitar em maio do ano passado ao Fundo Monetário Internacional (FMI) um
empréstimo por três anos de cerca de 57 biliões de dólares.
EK/afp/ap/efe/rtr | Deutsche Welle
Sem comentários:
Enviar um comentário