Artistas da CPLP criticam os
entraves para a obtenção de vistos nos países membros, mas louvam o esforço da
presidência cabo-verdiana em criar mecanismos para facilitar a mobilidade.
Mayamona Garcia e Bob Bisweswe
vieram a Lisboa montar peças originárias de Angola e do Congo para uma coletiva
de arte e cultura dos países lusófonos que decorre até 25 de maio, na Fábrica
do Braço de Prata. Mas, por dificuldades na obtenção de vistos, o conceituado
artista plástico Jospin Lohanga, que eles representam, não viajou para Lisboa a
tempo de participar na inauguração, na passada sexta-feira (10.05.)
"Houve atrasos em termos de
vistos. Porque neste momento, como a Embaixada de Portugal alocou a obtenção
dos vistos à Embaixada da Bélgica houve esse atraso. Esperamos nós que ele
estará cá na parte final desta exposição", conta Mayamona Garcia.
O angolano é o gestor executivo
do Centro de Pesquisa Arte Kimbango, com sede na República Democrática do
Congo, que corrobora com as críticas segundo as quais a política de vistos da
União Europeia, bem como dos Estados Unidos da América, está a bloquear a
carreira de artistas africanos.
Argumenta que "havendo,
muitas vezes, um timing para poder estar presente numa atividade,
quando os serviços protocolares [das embaixadas] não nos atendem no tempo
devido, isso faz com que, muitas vezes, o artista não possa participar numa
determinada atividade".
Mayamona Garcia reconhece que
esta questão de índole mais política que burocrática ultrapassa a vontade dos
artistas.
"Não só dificuldades como
impossibilidades em vir porque não obtinham a tempo vistos que permitissem
trazer obras e trazer os artistas mesmo à exposição. Trabalhámos com o plano B
também como consequência dessa política de atrofia dos canais de circulação dos
artistas e das obras de arte. É verdade", confirma Nuno Nabais, curador
das exposições da Fábrica do Braço de Prata.
Não fazem sentido os entraves
O assunto também toca a artista
plástica portuguesa Mafalda D' Eça, casada com um angolano. Os quadros da
pintora mostram as cores quentes e a natureza exuberante do continente,
nomeadamente Angola, onde gostaria também de expor.
Mas lamenta as dificuldades que
ainda existem na obtenção de vistos, afirmando que "essa mobilidade não é
fácil e às vezes as entidades com que nós nos relacionamos aqui em Portugal não
facilitam isso. É uma pena não haver esse intercâmbio com mais facilidade. Infelizmente, é visível. Uns colegas meus têm essa dificuldade e eu vejo que
teríamos que resolver isso com bastante rapidez. Agora, para isso, teríamos que
lutar todos em conjunto de forma a tentar resolver esse problema."
A artista plástica considera que
deveria haver mais circulação entre os artistas e as respetivas obras, como uma
das condições para reforçar o intercâmbio: "Os africanos também podem
aprender connosco cá em Portugal e nós em África. E, portanto, acho que é um
ponto fundamental e que deve ser rapidamente resolvido. Não tem cabimento
nenhum na época em que vivemos haver esses problemas de estes entraves todos a
quem cria cultura. Acho que se fosse ministra da Cultura facilitaria isso da
melhor forma possível."
Nuno Nabais, fundador e
coordenador geral da Fábrica do Braço de Prata, defende uma mais reflexão mais
profunda sobre a política de vistos entre os países lusófonos, afirmando que
"até porque esta exposição, nas suas falhas, reflete os inconvenientes
dessa política".
Pede-se maior flexibilidade e
mobilidade
Nabais diz que há várias galerias
de arte e municipais de Lisboa "ansiosas por receber artistas de
África", porque as suas obras "são impressionantes, revelam uma força
e uma originalidade que já não é muito comum na arte feita na Europa".
"Ficam também os artistas
africanos empobrecidos por não poderem trazer as suas obras e dar a conhecer ao
público português", acrescenta o curador. Na sua opinião, também há outra
dimensão, relativamente às dificuldades que os artistas de Portugal têm em
fazer circular os seus trabalhos fora das fronteiras portuguesas.
João Pedro Marques, outro artista
com obras nesta coletiva, pede mais diálogo e compreensão face aos obstáculos
ainda existentes, que só afetam o sentido da partilha de conhecimentos e de
cultura. "Devia haver uma maior flexibilidade e mobilidade. Havendo um
maior intercâmbio o ganho cultural é maior", diz este jovem autodidata à
DW África.
Na opinião do angolano Mayamona
Garcia, "se os nossos governos, particularmente africanos, se unirem no
sentido de dar [criar] uma normativa para que o artista seja valorizado isso
iria valorizar a nossa cultura e, consequentemente, iria ligar mais os
povos".
João Carlos (Lisboa) | Deutsche
Welle
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