A cerimónia fúnebre da UNITA ao
seu fundador e líder histórico, morto há 17 anos em combate, foi realizada este
sábado, num ambiente de “grande comoção”, diz o porta-voz do partido.
Ao fim de 17 anos, o líder
histórico da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), Jonas
Savimbi, teve finalmente uma cerimónia fúnebre na aldeia de Lopitanga, onde
também estão enterrados os seus pais. A informação foi confirmada ao PÚBLICO
pelo porta-voz do partido, Alcides Sakala, que falou num momento “histórico”.
As cerimónias começaram por volta
das 11h00 e duraram quatro horas, disse Sakala. A Lopitanga, aldeia perto do
Andulo, na província do Bié, acorreram milhares de pessoas, mais do que era
esperado, segundo o dirigente da UNITA. “Tudo correu como previsto, num
ambiente de muita solenidade e muita comoção”, descreveu Sakala ao PÚBLICO, por
telefone, acrescentando que não houve qualquer problema de segurança. A
cerimónia “esteve à altura da dimensão histórica” de Savimbi.
O líder histórico do movimento
anticolonial angolano foi
morto em 2002, durante uma operação militar, mas o seu cadáver nunca
foi entregue à família ou ao partido do “galo negro”. Na altura, Savimbi acabou
por ser enterrado no cemitério municipal de Luena, no leste de Angola, sem
direito a exéquias. Na véspera do enterro, um dos filhos de Savimbi,
Durão Sakaíta, disse à agência Lusa que a família “ficará finalmente em
paz”.
A trasladação dos restos mortais
de Savimbi era uma reivindicação antiga da UNITA, mas que sempre
foi recusada pelo anterior Presidente, José Eduardo dos Santos. A subida ao
poder de João Lourenço permitiu que a iniciativa progredisse, apesar da
contestação de alguns sectores do MPLA (Movimento Popular de Libertação de
Angola), que mostraram reservas em relação ao mediatismo das cerimónias
fúnebres do líder do grupo contra quem combateram durante a guerra civil.
As cerimónias deste sábado não
contaram com a participação de nenhum membro do Governo angolano, disse Sakala.
Depois da independência angolana, Savimbi liderou a UNITA, com apoio
sul-africano e norte-americano, na guerra civil contra o MPLA, apoiado pela
União Soviética. Recusou reconhecer a derrota nas primeiras eleições, em 1992,
e voltou a pegar nas armas. Em 2002, numa altura em que a guerrilha estava já enfraquecida,
enquanto o MPLA estava consolidado no poder, Savimbi foi morto e o conflito
terminou.
Passo para a reconciliação
O processo de transferência dos
restos mortais de Savimbi do cemitério municipal do Luena, no leste de Angola,
para a aldeia do Lopitanga, ficou
marcado por alguma polémica. A liderança da UNITA esperava receber as
ossadas do seu líder histórico no Cuíto, mas o Governo decidiu entregá-las
directamente à família, depois de alguns dias de impasse. Foi a
intervenção de João Lourenço, na semana passada, que permitiu a conclusão
dos procedimentos, evitando transformar a exumação do corpo de Savimbi numa
luta política.
Nas cerimónias estiveram
presentes vários representantes estrangeiros, o ex-ministro português João
Soares, que era amigo pessoal de Savimbi e um apoiante da UNITA. Na véspera,
Soares destacou o “lugar incontornável na história de Angola e de África”
ocupado por Savimbi. “Se alguém tinha dúvidas sobre a dimensão de Savimbi, 17
anos depois de morto, seria possível com qualquer outro haver estas reacções?”,
questionou, em declarações ao Novo Jornal.
O enterro de Savimbi “representa
a necessidade de se reflectir o processo de reconstrução nacional”, diz Sakala.
Para o dirigente da UNITA, o ex-líder guerrilheiro “tem um valor histórico
acrescido pela luta pela democracia, numa altura em que Angola estava sob o cunho
dos países de Leste para impor o marxismo e o sistema de partido único”.
O analista da Chatham House,
Alex Vines, encara a trasladação do corpo de Savimbi como “mais um passo rumo à
reconciliação”. “Apesar de todos os seus defeitos, Jonas Savimbi era apoiado
por uma parte significativa da população angolana e o seu partido continua a
ser uma força política importante hoje em Angola”, afirmou, citado pela AFP.
João Ruela Ribeiro | Público |
Foto: Ampe Rogério / Lusa
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