quarta-feira, 5 de junho de 2019

Exilado equato-guineense condenado a 60 anos de prisão diz que não há justiça no seu país


Paris, 05 jun 2019 (Lusa) - O opositor equato-guineense Salomon Abeso, condenado a 60 anos e quatro meses de prisão por uma tentativa de golpe de Estado contra o Presidente da Guiné Equatorial, afirmou que "não existe justiça" no seu país e rejeitou as acusações.

"Na Guiné Equatorial não existe justiça. A justiça é o ditador Teodoro Obiang Nguema. Desde que tomou o poder em 03 de agosto de 1979, nunca houve justiça nesse país", disse o opositor, membro da Coligação Restauradora de um Estado Democrático (CORED), à agência Lusa, numa conversa telefónica a partir de Paris, onde se sedia o partido.

O opositor, exilado em Londres há 18 anos, recebeu as notícias da sentença de "um julgamento falso" com "muita dor".

Salomon Abeso defende que o julgamento não decorreu de forma conforme com a justiça da Guiné Equatorial, uma vez que muitos dos condenados não foram presentes a tribunal.

"Só fomos informados de termos sido acusados de um dos delitos no início de 2018 (...). Até sexta-feira não voltei a ouvir o meu nome. Em todo o julgamento, em mais de dois meses e meio, não mencionaram o meu nome em qualquer dia. Não só o meu, a maioria dos opositores exilados que foram condenados não tiveram o seu nome mencionado [anteriormente]", referiu Salomon Abeso a partir de Paris, onde se encontra.


"Não nos terem apresentado a julgamento, foi o primeiro erro, porque não nos podem julgar na nossa ausência", explicou, garantindo que está "à procura de uma forma para denunciar a situação" junto de países e organizações "a nível ocidental".

De acordo com o membro da oposição, esta situação faz parte de uma manobra do Governo para "eliminar toda a oposição da Guiné Equatorial".

Salomon Abeso diz ser acusado de "financiar a oposição e de financiar mercenários" e, portanto, de "tentar assassinar o Presidente".

O julgamento que terminou na passada sexta-feira, dia 31 de maio, sentenciou mais de 130 pessoas acusadas de envolvimento numa tentativa de golpe de Estado na Guiné Equatorial a penas entre os três e os 96 anos de prisão.

Os processos recuavam a janeiro de 2018, quando as autoridades equato-guineenses afirmaram ter conseguido impedir um golpe de Estado organizado por um grupo de mercenários estrangeiros que pretendia atacar o Presidente, Teodoro Obiang Nguema, na véspera de natal do ano anterior.

Três dias depois, a 27 de dezembro, cerca de 30 homens armados foram detidos pela polícia camaronesa na fronteira entre os Camarões e a Guiné Equatorial, tendo as autoridades equato-guineenses procedido a várias detenções no país e emitido mandados de captura contra cidadãos que vivem no estrangeiro e contra outros cidadãos estrangeiros.

Salomon Abeso negou "categoricamente" as acusações de que foi alvo, referindo que são "falsas e infundadas" e que apenas pretende que o Governo do país aceite negociar um governo de transição nacional transversal a todos os líderes políticos do país.

"Nego-as categoricamente. Todas essas acusações são falsas e infundadas. A única coisa que queremos é que o Governo aceite a convocatória que lhe enviámos em Genebra para negociar um roteiro para organizar um Governo de transição nacional em que participem todos os líderes políticos da Guiné Equatorial", afirmou, sublinhando que pretende a assistência das Nações Unidas, União Europeia, União Africana e nações com influência naquele país, "como França, Portugal, Inglaterra, Espanha e Estados Unidos" nestas negociações.

"Tanto eu como o bloco [a CORED], em nome de toda a oposição, rejeitamos categoricamente as condenações de que fomos alvo na Guiné Equatorial", concluiu.

Salomon Abeso diz ter sido já condenado à morte pela justiça equato-guineense em 2002, por um alegado envolvimento no planeamento de golpe de Estado encabeçado por opositores como o seu tio, Felipe Ondo Obiang. Nessa ocasião, Abeso, que era diretor financeiro de uma petrolífera, fora também acusado de financiar o movimento.

A Guiné Equatorial tem tido uma história turbulenta de golpes e tentativas de golpes desde a sua independência da Espanha, em 1968.

O Governo de Teodoro Obiang Nguema, que hoje celebra 77 anos, 39 dos quais no poder, é regularmente acusado de violações dos direitos humanos pelos seus opositores e organizações internacionais.

A Guiné Equatorial é, desde julho de 2014, membro da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, que integra ainda Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

JYO // JH

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