Malabo, 04 jun 2019 (Lusa) - O
advogado e ativista dos direitos humanos equato-guineense Ponciano Mbomio Nvó
clasificou hoje "arbitrária" a decisão da justiça da Guiné Equatorial
que condenou mais de 130 pessoas acusadas de envolvimento numa tentativa de golpe
de Estado no país.
"Em princípio, para aplicar
uma pena, há que saber se a pessoa visada é responsável ou não. As penas foram
aplicadas de uma maneira arbitrária", disse o advogado à Lusa, por
telefone.
"O número de pessoas que
conheciam o tema do golpe de Estado não era o número de pessoas que se acusou e
penalizou. Havia um número reduzido de pessoas que conheciam o caso e se
consideravam como culpadas", explicou Ponciano Mbomio Nvó.
Na passada sexta-feira, mais de
130 pessoas acusadas de envolvimento numa tentativa de golpe de Estado na Guiné
Equatorial, em dezembro de 2017, foram condenadas a penas entre os três e os 96
anos de prisão.
O advogado referiu ainda que há
situações em que "duas ou três pessoas que nunca se viram na vida"
foram condenadas pelo mesmo delito.
"Para que tu e eu cometamos
um delito, primeiro temos de nos sentar e falar, e chegar a um acordo para
cometer o delito. Estamos a assistir a um caso em que pessoas que nunca se
viram antes foram acusadas do mesmo delito", afirmou.
Ponciano Mbomio Nvó considerou
que a justiça da Guiné Equatorial não atuou "conforme a lei".
"Primeiro, há pessoas que
são inocentes, que não participaram nos delitos, e, segundo, foram condenadas
pessoas que não vivem no país, pessoas ausentes, que não prestaram
declarações", disse, acrescentando que a lei equato-guineense "não
autoriza que se condene uma pessoa ausente no processo ou que não tenha sido
ouvida".
O advogado e ativista dos
direitos humanos assinalou também a chegada de uma missão da Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa (CPLP) à capital do país, Malabo, na quarta-feira.
"Convinha que esta missão
verifique (...) se a imagem da Guiné pode ser lavada depois da aplicação de
penas a condenados inocentes", apontou.
Sobre o impacto que esta decisão
pode ter no futuro, Ponciano Mbomio Nvó admitiu que "as famílias estão
destruídas e destroçadas".
"É uma decisão que não cria
um ambiente favorável para o país. É melhor que quando se culpa uma pessoa,
esta seja culpada do delito de que foi acusada. Mas quando te detêm e te
colocam na prisão e depois te condenam (...) por um delito que não cometeste,
cria um ambiente desconfortável para o país e para as famílias", concluiu.
A decisão anunciada na
sexta-feira representa o final de um processo que decorria desde 22 de março.
Em janeiro de 2018, as
autoridades de Malabo afirmaram que tinham conseguido evitar um golpe de Estado
organizado por um grupo de mercenários estrangeiros que quis atacar o
Presidente, Teodoro Obiang Nguema, na véspera de Natal do ano anterior, quando
o chefe de Estado estava no seu palácio em Koete Mongomo, a cerca de 50 quilómetros da
fronteira com o Gabão.
Três dias depois, a 27 de
dezembro, cerca de 30 homens armados foram detidos pela polícia camaronesa na
fronteira entre os Camarões e a Guiné Equatorial, tendo as autoridades
equato-guineenses procedido a várias detenções no país e emitido mandados de
captura contra cidadãos que vivem no estrangeiro e contra outros cidadãos
estrangeiros.
A sentença mais pesada, de 96
anos, foi imposta a três equato-guineenses acusados de serem os cérebros do
falhado golpe de estado: Bienvenido Ndong Ondo (também conhecido como Ricky), e
os antigos magistrados Martin Obiang Ondo e Ruben Clemente Nguema Engonga.
A Guiné Equatorial tem tido uma
história turbulenta de golpes e tentativas de golpes desde a sua independência
da Espanha, em 1968.
O Governo de Teodoro Obiang
Nguema, de 76 anos, 39 dos quais no poder, é regularmente acusado de violações
dos direitos humanos pelos seus opositores e organizações internacionais.
A Guiné Equatorial é, desde julho
de 2014, membro da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, que integra ainda
Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e
Príncipe e Timor-Leste.
JYO // JH
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