Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite* | Porto Alegre
"Quero mostrar ao mundo que
a Igreja Católica nao é inimiga da Ciência e do progresso humano" -- Landell de Moura
No
último dia 30 de junho de 2019, completaram-se 91 anos da morte, ocorrida em
1928, de uma das grandes personalidades gaúchas: o monsenhor Roberto Landell de
Moura. Nascido, em Porto Alegre, em 21 de janeiro de 1861, ficou conhecido como
o padre cientista, graças à sua dedicação no campo da pesquisa, especialmente
da radiotelegrafia e da radiotelefonia.
Após
estudar Direito Canônico, na Itália, retornou ao Brasil, em 1886, e no Rio de
Janeiro rezou a sua primeira missa com a presença de dom Pedro II e a Corte. No
ano seguinte, o Pe, Landell retornou ao Rio Grande do Sul.
Pioneiro na
transmissão da voz humana sem fio, ele antecedeu, em suas experiências
científicas, ao canadense Reginald Fessenden (1866-1932) e ao italiano Marconi
(1874-1937). O padre "bruxo", como era chamado pelas beatas da época,
foi perseguido pelo fato de atribuírem poderes mágicos a seus inventos. Na
opinião do doutor em Comunicação Marques de Mello (1943-2018), caso houvesse
nascido na Idade Média, nosso cientista, com certeza, sofreria, por ordem do
Santo Ofício, o suplício da fogueira.
Surpreendendo aos que
duvidavam do êxito de seus experimentos, ele foi o primeiro a transmitir, por
meio de ondas eletromagnéticas, a voz humana: nascia, no Brasil, o rádio.
Segundo o gaúcho Ernani Fornari - um dos seus biógrafos - que teve o privilégio
de conhecê-lo em vida, o início das suas experiências ocorreram entre 1893 e
1894. Três anos antes dos europeus, em
1899, em São Paulo, por meio de seu Telephoro, ele atingiu, após algumas
palavras, o recorde de transmissão radiofônica, totalizando 7 km .
Devido à
sua visão futurista, o nosso cientista pagou um ônus caro. Não lhe deram o
devido crédito às suas invenções e nem obteve algum patrocínio. Acusado de ter
feito pacto com o demônio, destruíram os seus inventos além de ser “forçado”,
de acordo com as suas próprias palavras, a afastar-se da carreira científica.
Os estudos sobre hipnose e espiritismo, aos quais ele também dedicou-se,
catalisaram, ainda mais, as críticas de seus adversários.
Seu
esforço, para mostrar que a Ciência não rivalizava com a fé, não modificou, na
época, a mentalidade conservadora do clero, embora o estado laico tenha se
estabelecido com a Proclamação da República (1889). A falta de apoio do governo
às suas pesquisas resultou, mais tarde, na necessidade do Brasil em importar
tecnologia, quando, na realidade, teve a oportunidade histórica de liderar e de
ser autossuficiente quanto à produção de novas tecnologias na área da
comunicação.
Três de seus inventos
chegaram a ser patenteados nos EUA: o Wireless Telephone, o Wireless Telegraph
e o Wave Transmitter, sendo requeridas, respectivamente, em 1901, 1902 e 1903 e
concedidas no ano de 1904.
Nosso padre
cientista é patrono dos radioamadores do Brasil e de outras instituições
importantes como a Fundação Educacional Padre Landell de Moura fundada ,em
1967, em Porto Alegre, assim como do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Pe.
Roberto Landell de Moura instalado pela Telebrás, em 1976, na cidade de
Campinas (SP).
No dia 1º de maio de 1932, a revista ilustrada O
Eco publicou, na p.121, o artigo "Iluminação a distância", cujo autor
assinou com as iniciais J. J. O conteúdo trata da 1ª Feira de Amostras do RS,
ocorrida, na Capital gaúcha, em 26 de março, daquele ano. No certame,
participaram industrialistas e agricultores, expondo seus produtos. A
iluminação, conforme a revista registrou, foi coordenada pelo Sr. Spinelli,
desde o Rio de Janeiro, na época Capital Federal, a uma distância de 980 km . A redação da revista
O Eco era coordenada pelos jesuítas do Colégio Anchieta de Porto Alegre,
situado, na época na Rua Duque de Caxias. O Museu da Comunicação Hipólito José
da Costa (MuseCom) tem sob a sua guarda edições desta revista, que era
impressa na Typografia do Centro, localizada a Rua Dr, Flores, nº
108.
O público
presente na Feira considerou o fato um prodígio. No processo foi utilizado um
Telefunken 32 que, na época, era um aparelho de inegável superioridade,
tratando-se de recepções a grande distância. É evidente que a iluminação da
nossa 1ª Feira de Amostras só foi possível graças ao pioneirismo, neste campo
da Ciência, do Pe Landell.
Em abril de, faleceu
Ivan Dorneles Rodrigues (1946-2019). Natural de Alegrete, ele foi um dos mais
dedicados biógrafos de Landell de Moura. Sua pesquisa, ao longo dos anos,
elucidou, por meio de sua obra, fatos relevantes sobre a vida do nosso cientista..
Criador do Memorial Landell de Moura, Ivan frequentou, em nosso Estado, os
espaços de memória e pesquisa, a exemplo do MuseCom ,onde se encontra uma
das maiores hemerotecas da Ámérica Latina, e do Instituto Histórico
e Geográfico do RS.
O professor Luiz
Artur Ferraretto - especialista na história do Rádio gaúcho – escreveu no
obituário, do site do jornalista Felipe Vieira, o seguinte: “Fico pensando qual
será o futuro do memorial em um país pobre de dedicação e de esperanças. É o
desafio que fica para as instituições de ensino superior. Temo que sigam sem
compreender a importância do Ivan e da sua obra. (...).
Em 2002, os restos
mortais do Pe. Landell de Moura foram transladados para a Igreja Nossa Senhora
do Rosário, no centro da Capital gaúcha, na qual, em 1863, ele foi batizado.
Publicado no jornal Zero Hora de 11 de julho de 2019.
*Pesquisador e coordenador do
setor de imprensa do MuseCom
Bibliografia
FORNARI, Ernani. O incrível
Pe. Landell de Moura. Porto Alegre: Editora Globo,1960
HAMILTON, Almeida. Padre
Landell de Moura – um Herói sem glória. Rio de Janeiro: editora Record,
2006.
RODRIGUES, Ivan Dorneles. Pe.
Roberto Landell de Moura / a história documentada.
. Porto Alegre: Editora
Corag,2015.
Imagens
1- Landell de Moura
(1961-1928) Capa do livro Landell de Moura / Um herói sem Glória
2-Transmissor de ondas: réplica
feita por Marco Aurélio Cardoso Moura / foto de Fernando Zago.
3- Última Hora de Porto Alegre
/13-11-1924 extraída do livro Pe. Landell de Moura / A história
documentada de Ivan Dorneles Rodrigues
4 Revista ilustrada O Eco /
POA, 1º de maio de 1932 / Acervo MuseCom
5- Assinatura do Pe. Landell de
Moura
4- Texto : Landell de Moura
: o padre cientista
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