Três anos de recuo nas
exportações armamentistas da Alemanha anulados em 2019, quando as vendas chegam
a quase 8 biliões de euros. Alguns dos compradores estão envolvidos em
conflitos como a guerra do Iémene.
As exportações armamentistas da
Alemanha cresceram 65%, de janeiro a meados de dezembro de 2019, em comparação
com 2018, alcançando um valor recorde de 7,95 biliões de euros. As cifras
foram fornecidas pelo Ministério da Economia, a pedido do partido A Esquerda, e
disponibilizadas à DW.
Elas mostram que dois dos
principais "fregueses" – o Egito, em 2º lugar, e os Emirados Árabes
Unidos, em 9º – foram participantes ativos da guerra do Iémene, apesar de o
governo alemão ter assegurado que não mais forneceria para esses países.
Os documentos indicam que as
exportações de armas, veículos e navios de guerra aprovadas por Berlim batem o
recorde anterior, de 2015, que foi seguido por três anos consecutivos de quedas
dos valores exportados. Já em meados de 2019, as licenças para exportações
armamentistas excediam o total do ano anterior, que fora de 5,3 biliões de
euros.
"O mais importante é
perguntar para onde vão os armamentos bélicos, e para que países", adverte
Katja Keul, porta-voz do Partido Verde para política armamentista. "E o
número das exportações de armas de guerra duplicou, desde o ano passado."
As exportações mais controversas
são as para os assim chamados "terceiros países", ou seja, que não
são membros nem da União Europeia, nem da Otan (ou "equivalentes à
Otan", como a Austrália). A parcela desse tipo de exportação caiu em relação
a 2018, de 52,9% para 44,2%, mas em parte por o total vendido ter crescido. Em
termos absolutos, essas vendas aumentaram em 1 bilião de euros, e cinco
dos dez principais importadores são "terceiros países".
"Isso é, sem dúvida,
surpreendente, pois o governo afirmou que está sendo mais restritivo",
comenta Keul. "Se você exporta armas de guerra para países de regiões de
crise, que não estão vinculados a nós por nenhum tipo de aliança, é óbvio que
está desestabilizando a região." O ministro da Economia Peter Altmaier
colocou a culpa do fato num enorme acúmulo de transações, devido aos meses de
disputas para formar uma coligação de governo, após as eleições gerais de 2017.
Em sua resposta ao pedido de
informações do Partido Verde, o secretário de Estado Ulrich Nussbaum repetiu
uma frase conhecida dos relatórios governamentais regulares sobre exportações
armamentistas: que o valor total das vendas não seria um "parâmetro
adequado" para julgar a política sobre o assunto: "Mais importante é
o tipo de bens e seu propósito. O governo persegue uma política de controle de
exportações de armas restritivo e responsável", argumentou.
É fato que grandes contratos, com
tempo de preparação longo – por exemplo, para submarinos ou tanques – muitas
vezes distorcem os dados sobre exportações. Contudo as respostas do governo a
uma moção semelhante, em novembro, mostraram que ele raramente bloqueia um
negócio de armas. No período janeiro-outubro, tanto de 2018 quanto de 2019, foi
negado menos de 1% dos pedidos de licenças de companhias armamentistas alemãs:
88 (de um total de 11 mil) em 2018, e 56 (de 9.900) em 2019.
Proibidos – mas não tanto
Keul também não perde muito tempo
com a argumentação de que outros grandes exportadores de armas ocidentais, como
Estados Unidos, França e Reino Unido, teriam menos discussão pública sobre
vendas armamentistas e, portanto, controles de exportação mais fracos do que a
Alemanha.
"Há debates nesses países
também", rebate, citando a decisão de um alto tribunal britânico, em
junho, tornando ilegais as vendas para a Arábia Saudita. No mês seguinte, o
Congresso americano igualmente votou pelo bloqueio das exportações de armas
para as nações do Golfo Pérsico – decisão posteriormente vetada pelo presidente
Donald Trump.
A porta-voz verde lembrou, ainda,
que a Alemanha tem normas menos rigorosas do que os EUA em relação aos
controles de uso final, além de ser menos restritiva do que a França ao
permitir que fabricantes de armas formem joint ventures.
O maior número de entregas de
armas alemãs, alcançando 1,77 bilhão de euros, ou quase um quarto do total
das licenças aprovadas, destinou-se à Hungria, seguida pelo Egito
(802 milhões de euros) e os EUA (483 milhões de euros). Em Budapeste,
o governo nacionalista de direita do primeiro-ministro Viktor Orbán realiza atualmente
um reforço em grande escala de seus arsenais militares.
Berlim concordou em suspender as
exportações armamentistas para países envolvidos no conflito do Iémene, como
parte de um acordo de coligação fechado em 2018. Mais tarde, em seguida ao
assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, prometeu proibir todas as vendas
para a Arábia Saudita. Relatórios subsequentes revelaram, porém, que em 2019 o
governo federal ainda aprovou algumas transações com Riad.
"Essas cifras consideráveis
mostram que o sistema de controle de exportações, como um todo, não está
funcionando", declarou em comunicado Sevim Dagdelen, deputado federal pelo
A Esquerda, autor de um dos pedidos de informações ao Ministério da Economia.
"Precisamos de interdições claras para as exportações armamentistas."
Nik Martin, Ben Knight (av) |
Deutsche Welle
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