sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Portugal | O PS vestiu a camisola da Vinci


Joana Mortágua* | Jornal i | opinião

É em nome de Portugal que continuaremos a dizer que há alternativas melhores para o país, para o ambiente e para as populações do que o aeroporto do Montijo.

Para o Governo, o projeto aeroportuário Portela + Montijo transformou-se num dogma que não pode ser questionado nem criticado apesar de todas as evidências.

O que é que nos dizem as evidências? Que não há nada nesta localização que a torne preferível às alternativas possíveis. Claro que a única forma de o comprovar seria uma avaliação ambiental estratégica, um estudo que comparasse o Montijo com outras localizações, mas isso não aconteceu, o Governo não quis estragar a festa da Vinci. O Montijo é a primeira localização em décadas a ser ponderada isoladamente, sem sujeição a avaliações comparativas.

É desta forma que, em plena emergência climática, Portugal ganha um novo aeroporto no estuário do Tejo, uma das zona protegidas mais importantes do país, perto de núcleos urbanos consolidados, sem acesso ferroviário, sem possibilidade de expansão e com um impacto ambiental e para as populações impossível de contornar. É assim que a margem sul recebe um novo aeroporto, sem contrapartidas, sem reforço dos transportes públicos, sem garantias que não seja a do o ruído e a poluição vão aumentar.


Irresponsável seria não perguntar: porquê o Montijo? Portugal precisa de um novo aeroporto, é verdade. Mas havia opções melhores, já estudadas, como Alcochete, não necessariamente mais lentas nem mais caras. Se tivessem sido equacionadas desde início, o argumento da pressa não valeria o custo futuro de uma má decisão.

E voltamos à única resposta possível: Montijo porque a Vinci quer, porque foi a Vinci que escolheu, porque o anterior Governo PSD/CDS aceitou e o atual governo continuou. Não por ser a melhor opção para o país mas porque é aquela que permite à concessionária da ANA aumentar a capacidade da Portela (já agora, sem estudo de impacto ambiental) e rapidamente aumentar os lucros sem investir numa solução que dure além do prazo da concessão das infraestruturas aeroportuárias.

Ao Governo caberia, no mínimo, garantir que esta opção protege o interesse estratégico do país. Mas para o Partido Socialista a defesa do aeroporto do Montijo nunca respondeu argumentos e não se detém perante nada, nem sequer perante o regulador.

A ANAC já deixou claro que não autorizará o projeto sem que se cumpra a lei. A lei prevê que os municípios possam proteger-se de projetos que prejudicam as suas populações e exige parecer positivo de todas as autarquias afetadas. Mas como o Seixal e a Moita não estão de acordo, logo a Vinci voltou a mostrar quem manda e veio a público anunciar que o Governo iria mudar a lei para dispensar a opinião dos municípios.

Se avançar com esta alteração, o Governo deixa claro que há municípios de primeira e municípios de segunda. Aqueles que estão de acordo, são ouvidos. O que estão contra, muda-se a lei para sejam ignorados. Ou seja, há os municípios do PS e os outros, os que seguem o interesse partidário e os que não importa o que seguem porque não contam.

É por isso que a defesa do aeroporto do Montijo ganhou contornos clubísticos. Sem argumentos, sobram as polémicas sobre a estupidez ou a inteligência dos pássaros, ignora-se a consulta pública e acusa-se o município da Moita de estar contra o desenvolvimento do país. É clubismo e veste a camisola da Vinci.

O Bloco de Esquerda não alinha por esse clube nem aceita demagogias sobre um suposto interesse nacional que é posto em causa de cada vez que alguém ousa dizer o evidente, que o Montijo é má opção.

Não fomos nós que vendemos o interesse nacional à Vinci por tuta e meia. Não fomos nós que permitimos que fosse uma empresa estrangeira a decidir a localização do novo aeroporto. Também não contam connosco para mudar a lei e desproteger as populações e por isso o Bloco já anunciou que levará a votação no Parlamento qualquer alteração à lei que pretenda excluir a opinião dos municípios para fazer a vontade à Vinci.

Não é do interesse nacional submeter o país à decisão de uma empresa privada estrangeira. É em nome de Portugal que continuaremos a dizer que há alternativas melhores para o país, para o ambiente e para as populações do que o aeroporto do Montijo.

*Deputada do Bloco de Esquerda

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