Atual crise entre conservadores
alemães abala também sistema partidário e política do país. Claro até agora é o
fim do poder de Angela Merkel sobre sua legenda, opina Christoph Strack.
O anúncio da
presidente da União Democrata Cristã (CDU), Annegret Kramp-Karrenbauer, de que
renunciará ao cargo e que abdicará de uma candidatura ao posto de chanceler
federal da Alemanha atinge o partido num momento de insegurança e, em certos
aspectos, desorientado. Mas o abalo tem alcance mais amplo.
A CDU se encontra aos tropeços. A
outra legenda que até agora gozava a definição de Volkspartei (partido
do povo), o Partido Social-Democrata (SPD), cambaleia há mais tempo e procura
ficar de pé, além de sua direção e sua essência. Assim como a antiga líder dos
social-democratas Andrea Nahles deixou a liderança da agremiação em meados
de 2019 após pouco mais de 13 meses à frente do mais antigo partido alemão,
Kramp-Karrenbauer agora anuncia sua retirada – após apenas 14 meses no
cargo.
E agora? Nomes, nomes, nomes,
especulação e boatos. Porém, na questão sobre a futura liderança e da
candidatura ao cargo executivo mais alto do país, trata-se de mais. A legenda
precisa esclarecer sua concepção de si mesmo e sua unidade. Faz tempo que a CDU
não aparenta mais ser um partido unido, como mostrou na Turíngia e a nível
federal, na internet e no trabalho quotidiano, sua cooperação e cada vez maior
concorrência. Faz 11 semanas que, durante o congresso do partido em Leipzig, os
presentes aplaudiram Kramp-Karrenbauer depois que ela desafiou a plateia após
críticas reiteradas.
A Alemanha está diante de um ano
de decisão. Não será decidida apenas a questão se a CDU continuará – ou quer
continuar sendo – um "partido do povo" e legenda governista a médio
prazo. Não, o que está em jogo é o parlamentarismo tradicional na Alemanha, o
significado dos partidos, da disciplina partidária e da liberdade de
consciência dos parlamentares. E está em debate, sobretudo, a questão de se e
como os partidos menores querem enfrentar as forças populistas e as ondas
extremistas.
Kramp-Karrenbauer justificou sua
decisão com a presença de "forças centrífugas fortes" na sociedade,
para as quais é necessária uma CDU forte sob liderança unificada. Em última
instância, trata-se do futuro da democracia na Alemanha. Quase 71 anos após sua
fundação, a República Federal da Alemanha está diante de uma prova de fogo,
talvez até diante do fim de seu sistema partidário atual. Os outros campos,
incluindo os fortes Verdes, não assumem – ou ainda não assumiram – esse papel
dos partidos populares.
No final de janeiro, o presidente
alemão Frank-Walter
Steinmeier falou durante cerimonia em memória às vítimas do nazismo no
Bundestag (Câmara Baixa do Parlamento alemão). Na ocasião, expressou palavras
sombrias sobre a nova direita, os "antigos demónios", os "maus
espíritos do passado" que, atualmente, se mostram "em nova
roupagem". "Temo que não estávamos suficientemente preparados para isso
– mas é exatamente aí que o nosso tempo nos põe à prova. E temos que passar
nesse teste", disse o presidente. Ele não falou num único partido.
Steinmeier alertou a política e a sociedade como um todo.
A crescente instabilidade causada
pelo anúncio de retirada de Kramp-Karrenbauer e pela luta por um curso do
partido atinge a Alemanha toda – e isso em tempos nos quais, paralelamente, a
evolução económica está mais insegura e brotam as rupturas político-sociais.
São tempos em que a política
mundial, por meio do presidente americano Donald Trump e outros líderes
populistas, parece instável como nunca, pelo menos após a queda do Muro. Tempos
em que o pós-Brexit avança para a Europa e a Alemanha assumirá a presidência
rotativa da União Europeia. A Alemanha está sendo desafiada internacionalmente
como nunca, e internamente insegura como há muito não se via.
Já se falou frequentemente sobre
o fim próximo da era da chanceler federal Angela Merkel. Os rumores
começaram ainda antes de sua saída da chefia da CDU no final de outubro de 2018
e da eleição, seis semanas depois, de Kramp-Karrenbauer como sua sucessora.
Eles não pararam desde então.
Agora, em meio ao furacão
político desta segunda-feira literalmente tempestuosa, esses burburinhos se
tornaram realmente audíveis: Merkel continua sendo chanceler federal e
politicamente soberana, mas só é uma chanceler às ordens. Seu poder dentro do
partido e, assim, seu mandato estão chegando
ao fim. E ela não tem mais o poder sobre uma transição controlada. Uma
chanceler às ordens e uma chefe da CDU às ordens – ambos não são garantia para
estabilidade política neste ano.
Após quase todos os terremotos,
seguem-se tremores secundários. Muito além da questão sobre a liderança da CDU,
a política alemã será marcada por inquietações. Inquietações e tensão. E a
Alemanha ainda precisa passar nessa prova.
Christoph Strack (rk) | Deutsche
Welle | opinião
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