A pandemia de novo coronavírus
tira a Guiné-Bissau da agenda da comunidade internacional, numa altura de
grande incerteza política. Há quem peça que a ONU assuma a governação com os
apartidários.
Tendo em conta a profunda divisão
do país, o ativista Toni Góia, líder do Movimento a Voz do Cidadão do Mundo,
relançou um debate que começou há 20 anos. Na altura apresentou como solução
para as instabilidades políticas cíclicas a gerência transitória do país pelas
Nações Unidas por um período de cinco ou mais anos. Uma solução que nunca
foi comentada pela ONU e ignorada pela classe política guineense, mas que agora
ganha mais apoiantes.
Goiá, que diz não ser a sua
intenção passar um "atestado de incompetência" aos políticos
nacionais, entende que nem as eleições, nem os tribunais, nem a mediação
internacional, que fará o diálogo político, vão acabar com a instabilidade
governativa na Guiné-Bissau:
"O nível de pobreza no país
não vai permitir que a nossa democracia marche. A pobreza e alta taxa de
analfabetismo são incompatíveis com a democracia. Estamos a viver ao
Deus dará". O jornalista do único canal televisivo do país, que pertence
ai Estado, disse que até ele, que tem um salário, sofre de
carências: "Imagine quem não trabalha?”
É a hora da ONU agir
O movimento, que fez circular uma
petição contra as sucessivas instabilidades políticas e governativas que adiam
o sonho guineense, acredita que chegou o momento da ONU assumir a governação
imediata da Guiné-Bissau, recorrendo a um grupo de quadros guineenses a
partidários.
"Tenho a certeza que a
Guiné-Bissau sozinha não vai conseguir. Mesmo resolvendo este problema
pós-eleitoral, isto vai continuar na mesma. Desde 2000, há 20 anos, que estamos
no mesmo sítio. Há um grupo que quer ir a todo custo para o poder. Imagine, num
país sem sector privado forte e um Governo pobre que é o maior empregador”, diz
Goiá.
Desde o conflito político-militar
de 1998/99 que a comunidade internacional tem vindo a intervir na
Guiné-Bissau para garantir a estabilidade governativa, até agora sem sucesso. O
país vive golpes militares e constitucionais em série. A realização das
eleições legislativas em março do ano passado, e as presidenciais de dezembro,
eram vistas como a luz verde para o início do processide estabilização e
retorno à normalidade constitucional. Um ano depois, persiste a crise com mais
uma indefinição pós-eleitoral.
"Democracia de comida”
Por isso seria mais barato para
os parceiros internacionais reformar a estrutura do Estado, diz Toni
Góia.
"Estamos perante uma
democracia de comida, isso não é democracia ideológica onde os partidos
políticos discutem ideias para construir um país. Não é. Isto é a luta pela
sobrevivência de quem quer ir para o ministério das Finanças, ir para as
alfândegas ou o ministério das Pescas", disse Góia à DW África. " Somos
campeões em fazer eleições que não dão em nada, só confusão. Só gastar
dinheiro, que podia servir para a educação e saúde”, remata.
Para o editor do jornal
"Última Hora", de Bissau, Sabino Santos, o país precisa criar uma
nova elite política de referência.
"O país está numa situação
de banalização total, de descrédito e de falta de orientação. Devem surgir
novas valências ou ser revitalizadas aquelas valências do passado que
serviram de referência para muita gente”.
Oxigénio para a Guiné-Bissau
Santos, que é também moderador de
um debate político numa rádio privada da capital guineense, acredita que apesar
da deceção com a classe política, os guineenses são capazes de resolver os
problemas do país.
"O país está a precisar de
algum oxigénio, que podia vir da elite, o que sempre defendi. Mas estamos
num país onde já não temos líderes de opinião. Onde as entidades religiosas não
são levadas em consideração por ninguém, onde a sociedade civil tem medo de
intervir”.
Na Guiéné-Bissau continua a
aguardar-se pela decisão do Supremo Tribunal de Justiça sobre o desfecho do
contencioso eleitoral. mas o tribunal diz que não pode trabalhar devido a
interferência dos militares que chegaram a fecharam o Palácio da Justiça.
Braima Darame | Deutsche Welle
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