domingo, 30 de agosto de 2020

CEDEAO, declínio ou ventos de mudança imperativa?


O Democrata (gb) | editorial

A Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO) está a enfrentar a maior “turbulência” desde a sua criação em 1975. 

A fama de ter sido descrita como um modelo de organização regional pela eficácia da sua liderança está hoje muito ameaçada pelos ventos de contestações multiformes provenientes de diferentes países membros. 

A crise política no Mali e críticas internas contra a mediação hesitante dos Chefes de Estado é sinal evidente da fragilidade do bloco regional na formulação de uma proposta coerente e transparente para uma solução durável no Mali. Um olhar atento ao desenrolar da complexa situação política, social e securitária na vasta República de Mali deixa transparecer a incapacidade da CEDEAO em propor uma solução.

A plataforma da oposição que exige a demissão do Presidente Ibrahim Boubacar Keita já denunciou a parcialidade da mediação regional que publicamente defendeu a continuidade de Keita na Presidência e a demissão de parte dos deputados, todos eleitos pelo povo maliano. Mais um impasse, mais um fracasso em vista, depois de vários outros, nomeadamente na Guiné Conacri, Guiné-Bissau e no Togo. Nesses países, a CEDEAO vacila entre o real político e o diplomaticamente correto. Dependendo de peso de cada regime e relações de protagonistas em crise, a organização regional tenta aplicar um de dois princípios.

No meio de tudo, a CEDEAO perde terreno e adiciona fracassos na sua conhecida e respeitada trajetória de defesa da legalidade democratica e resolução de conflitos nos Estados membros. 


Na crise política da Guiné Conacri, a Comissão da CEDEAO tem adotado uma atitude de demissão total, limitando-se ao serviço mínimo por via de comunicados vazios. 

Na crise pôs eleitoral na Guiné-Bissau, a CEDEAO ganhou o prémio de incoerências por somar posicionamentos contraditórios raros numa mediação política na qual se envolveu desde 2012. O seu longo silêncio revela uma promiscuidade latente. 

No Togo, as relações de força a favor do regime de Faure Gnassingbé minimizaram o fracasso da intervenção regional naquele país. Mas as sementes da crise togolesa permanecem vivas. 

Outro desafio de ferro no caminho da CEDEAO é, sem dúvida, a Côté d’Ivoire (Guiné Equatorial).

Os rastos do sangrento conflito político militar que durou quase uma década (2002-2011) estão ainda presentes na memória de cada cidadão ivoarense. O “volte-face” de Alassane Adramane Ouattara en disputar um terceiro mandato numa prova contra o seu aliado octogenário de ontem, Henry Konam Bédié, augura um futuro sombrio naquele país ainda em estado de convalescença. Com o afastamento de Laurent Bagbo e Guillaume Soro da corrida presidencial, a tensão politica está em alta e o pleito de outubro próximo será de alto risco. O futuro deste gigante da UEMOA dependerá, em larga escala, dacapacidade da Comissão Eleitoral de assegurar a transparência. Um desafio quase impossível, quando se olha para a natureza politiquente do governo liderado por Ahmed Bakayoko, inimigo jurado de Soro, atualmente em exílio forçado.

Em diferentes cantos da região, os desafios da estabilização política, o terrorismo e as rivalidades de carácter comunitarista são palpáveis e colocam a CEDEAO na prova de uma equação complexa. A persistência de crises multidimensionais insolúveispode precipitar o declínio da organização com estruturas pedintes de reforma profunda. 

Ou se reforma, ou a mudança virá de povos da comunidade cada vez mais exigentes e ríspidos.

Finalmente, paira uma incógnita: governança transparente na CEDEAO alicerçada em respeito dos seus princípios cardinais para impulsionar a democratização nos Estados membros ou o inverso, os ventos de democratização africanizada que permitiria a reedificação da CEDEAO com tentáculos mais robustos?

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