quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Portugal | E quando a vacina chegar?

Ivo Carvalho | Jornal de Notícias | opinião

Mesmo sem estar em tronco nu, o presidente da República abriu o peito para amparar as balas do desnorte político. Na entrevista à RTP, assumiu as culpas pelos erros na gestão inicial da pandemia e exortou os portugueses a porem-se na sua pele e na dos demais decisores.

Ninguém, e essa foi a linha de raciocínio de Marcelo Rebelo de Sousa, podia estar preparado para uma tormenta assim. E, portanto, era previsível, em Portugal e no resto do Mundo, que os líderes políticos claudicassem.

É impossível não concordar com isto, não demonstrar tolerância republicana com isto, mas o assomo de franqueza presidencial serve de muito pouco se, de facto, não aprendermos com os erros e, sobretudo, se insistirmos em falhar na capacidade de antecipar respostas para problemas que já sabemos hoje nos vão ser colocados amanhã. Foi assim com a chegada do frio e a asfixiante pressão exercida junto dos serviços hospitalares, poderá ser assim no momento em que as primeiras vacinas começarem a ser distribuídas aos estados-membros da União Europeia.

Portugal, ao contrário de outros parceiros, ainda não tornou pública a sua estratégia de vacinação para a covid-19. Está por perceber, para além das complexas questões logísticas associadas à distribuição (vão as farmácias ser envolvidas?), se haverá grupos prioritários e quais os timings ideais para as tomas. Este será um momento definidor. Aquele em que os cidadãos mais vão esperar das suas lideranças. Desde logo porque, no que à ação humana e à ciência diz respeito, a vacina é, até ver, a única réstia de esperança a que podemos agarrar-nos. Quando a profilaxia chegar a Portugal, haverá naturais comparações com o que está a ser feito nos outros países e a ansiedade que temos visto com os atrasos na toma da vacina da gripe será muitíssimo mais expressiva e difícil de conter.

Por tudo isto, e também porque a natureza humana tenderá a resvalar para lugares sombrios, alimentada pelo ímpeto de sobrevivência, era desejável que fôssemos lestos a definir um plano, lestos a informar a população da existência desse plano e lestos a aplicar esse plano. A tolerância é patriótica, o amadorismo não.

*Diretor-adjunto

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